terça-feira, 29 de maio de 2012
miséria e fome no semi-árido
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No semi-árido, fome e miséria convivem com açude cheio que não pode ser usado para irrigar terras
26/11/2004
Pau dos Ferros (RN) - Não há água suficiente para o desenvolvimento de atividades econômicas mesmo nos municípios do semi-árido que possuem açudes cheios. Um exemplo disso, entre centenas de outros, é o Perímetro Irrigado de Pau dos Ferros, na região Alto Oeste Potiguar (Rio Grande do Norte), em que apenas 10% dos 6.500 hectares recebem água para irrigação. O açude, no entanto, está cheio desde as fortes chuvas deste ano, mas a água está toda comprometida com o consumo humano em 37 municípios, nos quais vivem mais de 240 mil habitantes.
"É normal ver gente passando fome aqui em Pau dos Ferros porque não há água suficiente para produzir alimentos. No nosso perímetro irrigado, apenas 650 hectares estão produzindo, porque a água está reservada para o consumo humano nas cidades da região, que dependem do açude de Pau dos Ferros", explicou o secretário municipal de Agricultura, Sebastião Guimarães. A cidade fica a cerca de 400 km da capital, Natal.
O Perímetro Irrigado de Pau dos Ferros, implantado pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), produz principalmente caju, banana, manga, coco e goiaba, mas a produção caiu a partir de 1997, quando foi preciso garantir água para abastecer as cidades vizinhas. O açude de Pau dos Ferros tem capacidade de 54 milhões de metros cúbicos, mas é a única reserva de água de um quarto de milhão de potiguares. Quando vem um ano seco, até os 10% do perímetro hoje irrigados perdem o direito à água e todas as plantações são perdidas, com enormes prejuízos econômicos.
Esperanças no projeto
O coordenador técnico do Projeto São Francisco, João Urbano Cagnin, participou hoje em Pau dos Ferros do Seminário do Pólo de Fruticultura do Alto Oeste Potiguar e deu informações aos produtores locais a respeito da integração do Rio São Francisco aos rios intermitentes do semi-árido. Urbano Cagnin informou que, após a conclusão das obras, o açude de Pau dos Ferros receberá 1,6 m3/s do Velho Chico, o que garantirá o abastecimento de água para consumo humano dos 37 municípios vizinhos. Com isso, será liberado o uso da água do açude para todo o perímetro irrigado.
"A água do São Francisco viabilizará a construção de várias adutoras para levar para as pequenas cidades, distritos e vilas da região do Alto Oeste Potiguar", anunciou o representante da governadora Vilma de Farias, Cícero Alves Fernandes, diretor administrativo e financeiro da Emater-RN. O caso de Pau dos Ferros ilustra bem como funcionará a integração de bacias, porque mesmo com o açude cheio a água não pode ser usada para os fins produtivos.
"Para que a economia da região seja desenvolvida é preciso contar com mais água", atesta o mestre em economia regional e rural da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), José Elesbão. "A única alternativa da mesorregião de Pau dos Ferros é a agroindústria, cujo principal insumo é a água. Criticar a integração de bacias porque seus benefícios podem ser estendidos aos grandes produtores é no mínimo uma ingenuidade. Ora, dessa forma haverá também o aumento da oferta de empregos e o desenvolvimento econômico", acrescenta.
Insegurança e atraso
"A maior garantia de água pode vir a fortalecer a possibilidade de instalação de indústrias. A sistemática escassez de água gera insegurança nos investidores em relação a quem não tem como garantir o mínimo, que é a água", disse o coordenador de projetos do Instituto Internacional de Cooperação para a Agricultura, Fidel Maria Braceras, presente ao seminário de fruticultura.
O produtor do Perímetro Irrigado de Pau dos Ferros, Leonde Henrique da Silva, com apenas meio hectare, produz feijão, milho e sorgo. Ele tinha as terras irrigadas, mas perdeu o acesso à água desde que o açude foi destinado quase todo ao abastecimento das cidades. "Minha vida era muito melhor, porque agora minha renda caiu 70%. Eu e minha família passamos muitas dificuldades, mas temos muitas esperanças com a vinda da água do São Francisco", disse.
Teófilo Freitas, da Pastoral da Criança na região, onde atua há 15 anos, faz um resumo das conseqüências da escassez de água. "Os maiores problemas aqui são a desnutrição infantil e o desemprego, agravados pela dificuldade de criar pequenas hortas e animais. Tudo por falta de água", diz ele, inconformado.
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