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História da Imprensa: Testemunho pseudo-real de um tipógrafo da Inglaterra do séc. XVII

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Escrito por Vera Ferreira
16-Oct-2006
Corre o ano de 1644. A Inglaterra deste período caracteriza-se por uma grande instabilidade política e económica, pela falta de liberdade de expressão e de livre iniciativa, pela censura e repressão. É nesta realidade opressiva que vive o tipógrafo londrino, de 50 anos, puritano presbiteriano, Thomerson Kritz, cujo testemunho por nós encontrado numa das suas cartas ao amigo português Dinis Botelho aqui deixamos por julgarmos ser uma mais valia para todos os que se dediquem ao estudo da história da imprensa:





londres, 8 de Novembro do ano de 1644
Caro amigo Botelho,

Bem sei o quanto deveis estar aborrecido comigo, mas sede paciente e tentai compreender as minhas explicações, se é assim que lhes poderei chamar.

São passados seis anos desde a última carta que vos enviei. Até esta data, muita coisa se passou na minha vida, principalmente acontecimentos bastante negativos. Mas, não vos preocupeis ... as minhas forças ainda estão acesas e, apesar dos obstáculos cada vez mais rígidos, o velho Kritz continuará a lutar contra as injustiças e a favor da liberdade!

Eu não sei muito bem qual tem sido a situação em Portugal ao longo destes seis anos, porque a Nossa Alteza Real, que age em nome do Senhor, com medo que os seus súbditos abrissem os olhos e tomassem consciência dos seus abusos de poder, decidiu proibir a importação de jornais. É evidente que durante estes anos tentei obter e divulgar informações do exterior, mas foi algo muito difícil para um simples tipógrafo como eu, ilegal aos olhos da coroa, da igreja e, principalmente, da Stationers' Company.

Com certeza já ouvistes falar da Stationers' Company, a elite dos poderosos da imprensa e do comércio livreiro em Inglaterra. Não passam de um grupo de parasitas que nem liberdade própria possui; vegetam em torno do rei e da igreja só para obterem mais algumas regalias ou algum título para juntarem aos vários que já possuem! Eles são o eco dos abusos do rei!

Meu bom amigo, nem imaginais os momentos difíceis que tenho passado! A ter que pagar pesados tributos a El Rei e sem hipóteses de obter rendimentos legais do meu trabalho, vi-me obrigado a recorrer à pirataria de certas obras e, com a ajuda de alguns colegas, consegui colocá-las no mercado, mas correndo grandes riscos porque o mercado londrino está minado pelos "polícias" da Company. Coitados dos meus companheiros das outras regiões de Inglaterra que nem mercado têm para vender as suas obras! (Será que isto também acontece em Portugal?!).

Sua Alteza El Rei D. Carlos I colocou nas mãos de um grupo de "inquisidores" (não lhes posso atribuir outro nome!) - membros da coroa, da Company e da igreja anglicana (aquela que se diz defensora da justiça, da liberdade e da harmonia do seu rebanho) - a fiscalização das nossas acções. A minha tipografia já foi invadida e revistada três vezes. Tive de pagar multas pesadíssimas; o que me valeu foram alguns amigos influentes.

Vós sabeis que eu não gosto de me lamentar, mas vivo numa pressão constante ... o que é que eu posso fazer?! Tenho a minha esposa e os meus filhos para alimentar, ... não posso deixar de trabalhar!

Estais recordado do meu irmão? Nem podeis imaginar o que lhe aconteceu! Um tal arcebispo de Canterbury, um dos "inquisidores" de que há pouco vos falei, mandou cortar-lhe as orelhas só porque compôs uma paródia onde estavam inscritas estas palavras: "De pragas, peste, fome, bispos, clérigos e diáconos, libera nos, Domine." Chama-se a isto uma igreja que defende a justiça, a paz?! Trata-se de um exemplo vivo de incompreensão, de violência, de falta de liberdade de expressão, que devora e consome a minha tão querida pátria!

Meu fiel companheiro, é doloroso admitir, mas a Inglaterra que tenho diante dos meus olhos mantém-se presa aos desígnios dos grandes senhores do poder, que tudo podem e tudo determinam. Parte-me o coração ver os meus compatriotas adormecidos na ignorância. Razão tem o Milton (ainda vos recordais dos serões que com ele passámos?) ao defender a liberdade de imprensa. (Tenho que vos mandar uma cópia do trabalho que publicou este ano - Areopagitica - trata-se de uma autêntica obra de arte para os verdadeiros defensores da imprensa.) Já chega de licenciamento atrás de licenciamento! A liberdade de opinião e discussão de ideias é um bem essencial ao desenvolvimento do ser humano, e sem ela ... que seremos nós, senão os presas de um predador gigante! É necessário despertar as consciências! (Desculpai-me o meu entusiasmo!) Por essa razão decidi, apesar de todos os perigos que possa correr, dedicar-me à publicação de vários panfletos onde exponho a situação que se vive diariamente.

Ainda lembro com saudade o ano de 1642 quando, pela primeira vez, escrevi num jornal inglês sobre a situação conflituosa que se vivia, e se vive, na Inglaterra. Finalmente o Parlamento conseguiu fazer frente a El Rei; com este passo lançou a esperança num futuro melhor! Foi neste período que nós, homens da palavra impressa, pudemos divulgar mais livremente as nossas opiniões. Tantas noites que passei acordado fazendo e desfazendo, alterando e corrigindo, as notícias que tinha de entregar no Mercurius Britanicus. A partir deste momento a minha tipografia passou a ser procurada por pessoas de grande estima, tanto a nível político como comercial. Foi a primeira vez na vida que me senti um verdadeiro tipógrafo, "sem" medos e pressões! Quem dera que tivésseis podido viver comigo esta experiência tão produtiva!

Lembrais-vos das nossas discussões acerca da instabilidade do ser humano? Mais uma vez se comprova que o ser humano é feito de contradições, senão, como é que se explica que após ter sido conseguida a liberdade de imprensa, se vá restaurar o licenciamento prévio?! Voltamos ao ponto de partida. Mas agora estou mais confiante porque a nossa intervenção no "mundo" político e social é cada vez maior; o que não podemos é cair de novo no sono profundo! O que pensais de toda esta situação? Também estais optimista em relação a uma futura liberdade total da imprensa?

Como os "novos" licenciadores têm andado, despercebidamente, a perseguir-me e para evitar problemas, mandarei esta carta por um amigo que parte amanhã à tarde para Lisboa. Gostaria também de vos pedir para não me escreverdes enquanto eu não anunciar o contrário.

Desculpai-me por vos ter maçado com as minhas preocupações mas sentia necessidade de desabafar. Quem melhor que o meu companheiro português de tantas "batalhas" para ouvir a voz atormentada de um velho tipógrafo!

Nunca esquecendo a nossa amizade ...



Com os melhores cumprimentos

THOMERSON KRITZ



Esta carta, inteiramente fictícia e com fins essencialmente histórico-informativos, além de retratar as características socio-psicológicas da personagem Thomerson Kritz sem nunca perder de vista o contexto político-económico e socio-cultural do século XVII, no qual ela se insere, é um exemplo vivo de como se pode dar à história uma perspectiva mais real aliando-a à capacidade imaginativa e artística.

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