quinta-feira, 3 de junho de 2010

162 - CIVILIZAÇÃO INDIANA

Programa de Estudos sobre a
Civilização Indiana
2004-2005
Secretariado: Céu Diogo
Coordenação Executiva: Teresa Lacerda e Zoltán Biedermann
Projecto Científico e Coordenação - Ana Salema
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Avenida de Berna, 26 C
1069-061 LIsboa
Tel: (351) 217972151/ Fax: (351) 217977759
E-mail: cham@fcsh.unl.pt
Sítio: http://www.cham.fcsh.unl.pt
Da Índia conhecemos os elefantes, os faquires, o exotismo dos incensos, vagamente o
Yoga, Goa e as raves, cinema que nunca vimos, Tagore que nunca lemos e pouco mais. Das
Universidades portuguesas, os estudos da civilização indiana estão arredados. Todo o
trabalho de estudo de línguas, elaboração de dicionários, conhecimento dessa cultura que
foi desenvolvido séculos atrás está morto e arquivado. Orgulhamo-nos (?) da descoberta do
caminho marítimo para a Índia; somos todos Vascos da Gama e Afonsos de Albuquerque
de mares calmos mas nada sabemos do outro, daquele que supostamente descobrimos. A
Índia e a Ásia em geral são grandes blocos culturais e económicos de população jovem e
dentro de alguns anos vão absorver e potenciar enormes interesses do planeta. A Europa,
desde 1994 tem definida uma estratégia para a Ásia que contempla os vários aspectos da
actividade humana e alguns países europeus estão fortemente empenhados nesse futuro. A
Universidade tem um papel chave a desempenhar neste contexto e este Programa de
Estudos visa, primeiro que tudo, abrir uma porta para este Oriente multicultural e
multilinguístico.
Através de práticas e saberes queremos estudar para interagir com a civilização
indiana, conhecê-la para nos darmos a conhecer. Aqui, a Índia é o guru. Seremos
aprendizes dedicados e actuantes.
Fernando Cardoso 2004-10-07
Programa de Estudos sobre a Civilização Indiana
O presente programa propõe manifestações de natureza diversa reunindo especialistas
nacionais e estrangeiros - indianistas, antropólogos, historiadores, filósofos, linguistas,
médicos, musicólogos, artistas:
1. Um conjunto de palestras integrando os três módulos de um Curso Livre: Índia – as
práticas e os saberes que abrange várias áreas da cultura indiana – tanto antigas como
contemporâneas.
O primeiro módulo oferece uma introdução geral à história, pensamento e línguas desta
civilização.
O segundo módulo contemplará as práticas pelas quais invariância e mudança se cruzam
e dinamizam. Será questão tanto de práticas médicas e rituais como daquelas que
emergem de diferentes motilidades politicas do império, da diáspora, da globalização.
O terceiro módulo compreenderá sabedorias e sapiências que, da filosofia à estética, se
desdobram numa ampla paleta inteligível da natureza plural e plástica dos saberes e
experiências pelos quais ainda hoje é determinada uma postura pan-indiana.
2. As Jornadas de Filosofia Indiana, contando com a participação de algumas das
figuras que na Europa mais se têm destacado neste domínio, oferecerão um espaço
privilegiado de reflexão sobre questões e controvérsias que animam presentemente a
filosofia indiana e comparada, tais como a doutrina do karman e a reencarnação, a
proposta indiana de uma ecologia profunda, a grande controvérsia entre brâmanes e
budistas, a representação grega da “filosofia dos bárbaros”, ou ainda a filosofia do
ritual e do signo como novíssimas reflexões sobre as semiologias indianas.
3. Concerto de Miguel Coira e Goyo Irigoyen. De la aerofonía al sincretismo musical. 17
de Dezembro de 2004 – Lisboa, Mãe d'Água das Amoreiras
4. Três exposições
Celebração da vida, exposição etnográfica sobre os warli
Recolha de material e apresentação Dorothée Geffray
1 a 20 de Abril de 2005 – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
Exposição de fotografia: Cadernos de Viagem 2
- Fernando Cardoso
22 de Abril a 11 de Maio de 2005 – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
Exposição de Pintura: Índia: objectos, lugares, pessoas
- Ana Mouga
13 a 31 de Maio – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
Curso Livre
Índia – as Práticas e os Saberes
Setembro de 2004-Maio de 2005
Introdução
23 de Setembro de 2004
Conferências de Abertura: Old and new StoryTelling in Índia
- Anand Chabukswar
Once upon a time .... thus begins the journey of a word who found boons to weave
myriad patterns called stories. In the colourful land of India, the tradition of stories old and
stories told, spreads across vast tracks of Time. These stories are ancient and eternal,
historical and universal, huge but light, dark and bright - they are so multidimentional that
there is no guage to measure and hold them all. Yet, each single story holds the essence of
all storytelling. Attention and imagination shape and alter through such stories. Some
stories rule, some dies, and some get created. NOW, is the time of new stories. It also
encapsules the story "losing stories" - stories of cultures and traditions that lived in
orality; of consciousness that can be obliterated with stories gone amiss. Story-cicles are the
spaces of storytelling in the now, in the new world, as it goes by. These are the spaces
invested with the intention of "using stories" towards awareness and understanding of
living. They explore existence and meaning through the oral word, listening and creativity
in the context of the present.
18 de Outubro de 2004
Grandes Linhas da Civilizaçao Indiana
Luis Filipe Thomaz (Universidade Católica Portuguesa)
19 de Outubro de 2004
Principais orientações do Pensamento Indiano
Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa)
Da existência de uma ‘memória pensante’ (smriti) nesta tradição indo-ária e sua
demarcação a partir do fundo védico. A inspiração brahmânica das Upanixadas e sua
declinação ulterior na formação dos ditos “sistemas” da filosofia (darsana). Os graus de
consciência e as diversas “escolas” (desde a “lógica” do Nyaya e da ‘cosmologia’ Vaisesika,
até à moral de Mimamsa e ao “monismo” Vedanta, passando pelo “dualismo” Samkhya e
pela “psicologia” do Yoga…). Mais do que a “visão oceânica”, ao modo da interpretação
“hegeliana”, importa as clivagens do a fazer, do sentido até prático, pautadas pelo rito
inteligente da Vida: ‘exóticos’ instrumentos do pensamento hindú, como sejam, o corpo, a
respiração…, as emoções e os cheiros… a acção guerreira (tal no Bhagavad Gîta), e
sobretudo sexo e amor (no dito “quinto Veda”, do Tantra), onde o esquecido hinduísmo prevédico,
em festa xivaíta se celebra ( e ainda nas formas
20 de Outubro de 2004
As línguas de uma civilização : o sãoscrito e os pracritos
Margarida Lacerda (Instituto de Ciências Sociais e Políticas Ultramarinas)
As Práticas
9 de Novembro de 2004
Globalization and Difference: Cosmopolitanism Before the Nation-State
- Akhil Gupta (Stanford University)
Is it possible to ask what a cosmopolitan history of cosmopolitanism might look
like? More importantly, since the cosmopolite emerges as a category within Europe in the
context of discovery (it is no surprise that Hakluyt is the first to use the term), is it in fact
possible not to write a Eurocentric history of cosmopolitanism? As we seek to
conceptualize discrepant cosmopolitanisms in the world today, we might well look to
discrepant globalizations in and through which those cosmopolitanisms emerged. As the
center of the world economy, the Indian Ocean trade routes connected places from the
coast of East Africa and the southern Mediterranean on one edge to the Spice Islands, the
coast of China, and the southwestern ports of Japan on the other end. These connections
had a long history before the rise of Islam in the seventh century, but particularly thrived
through the medium of Muslim seafarers from the seventh to the fifteenth centuries, ending
when the Portuguese came and severely disrupted existing trade networks. Not only did
these networks lead to an incredible exchange of ideas, technologies, and goods, they also
brought people from different lands into contact with each other, often for extended periods
of time. This created centers of cosmopolitanism that in their extensiveness and reach, were
comparable, and perhaps even more intensive, than anything we can observe in the world
today - at a very different moment of globalization. In this paper, I will draw upon some
examples from the writings of some famous visitors to India in the fourteenth and fifteenth
centuries, before the arrival of Vasco da Gama in 1498.
10 de Novembro de 2004
“A alteridade é uma mera ilusão”: algumas refexões sobre o poder criativo das
tradições expressivas femininas na Diáspora Hindu
- Susana Bastos (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas)
11 de Novembro de 2004
Praticas que o Império tece: colonialismo e género na Índia
- Rosa Perez (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa)
13 de Dezembro de 2004
Pluralités rituelles et modalités d’action
- Daniela Berti (Centre national de la Recherche Scientifique)
L'intervention présentera trois modèles rituels coexistant dans la même région pour
déterminer les raisons qui font que les villageois recourent à l'un plutôt qu'à l'autre en cas
d'affliction. La comparaison portera sur des séances de possession effectuées par le
médium de la divinité de village ainsi que sur les expertises savantes du brahmane et sur
les combats occultes du "magicien" tantrique. Le but de la comparaison est de montrer que
le choix ne se fonde pas tellement sur l'efficacité attribuée à ces modèles or sur la nature
des symptômes, mais plutôt sur la représentation que le consultant se fait de son propre
rôle rituel dans les cadres thérapeutiques disponibles.
14 de Dezembro de 2004
L’astrologie et la transformation des rituels
- Gilles Tarabout (École des Hautes Études en Sciences Sociales)
Dans une partie de l'Inde du Sud, au Kérala, les astrologues ne sont pas seulement
sollicités pour établir les horoscopes et donner des conseils personnels à ceux qui viennent
les consulter: ils sont aussi appelés par les comités de gestion des temples hindous pour tout
projet d'agrandissement, ou pour remédier à certains problèmes. Dans ce cas, les
astrologues ne font pas que répondre aux questions du comité, ils procèdent à une
évaluation d'ensemble de la situation. Après avoir déterminé (astralement) le passé du
temple, ses "défauts" actuels, ils indiquent les "corrections" qu'il convient d'apporter aux
édifices et aux rituels. Par ce moyen, les temples et les rites se transforment
15 de Dezembro de 2004
Antyesti, o último sacríficio: morrer e ser cremado em Banaras
- Mariana Caixeiro (Universidad Complutense de Madrid)
Esta conferência é a partilha de vivências e de procura de sentido sobre o
significado da cremação e da atitude perante a morte no Hinduísmo. Procura dar um olhar
panorâmico sobre os seus aspectos religiosos, filosóficos, sócio-culturais e económicos.
Banaras, Varanasi ou Kaxi três topónimos para a cidade santa do hinduísmo onde os
hindus vão morrer e ser cremados é o “cenário de fundo” a partir do qual tentaremos
compreender o aparente paradoxo de uma morte tomada como parte integrante da vida e
não um final- mas sim uma paragem de actividade física, um meio de reciclar jiva (a parte
do ser que encarna), um recurso e uma oportunidade para este rever os seus “programas e
politicas” - e a concretização da cremação no nada das cinzas finais enquanto prática
social, momento de mobilidade e de afirmação social.
16 de Dezembro de 2004
Usos y contextualización de instrumentos musicales indo-asiáticos.
- Miguel Coira (Universidad Complutense de Madrid)
El desarrollo de la conferencia pretende iniciar con una primera parte de
introducción sobre la musica comparada y su relación con la utilización del aire como
principio común en la mayor parte de la instrumentación musical. La aerofonía tiene para
mi un especial interés para llegar a mostrar dos cosas: el proceso que subyace en el
fenómeno del sincretismo en la música y como se están construyendo nuevas tradiciones y
usos musicales en Europa a través de la importación de rasgos musicales procedentes de
otras tradiciones culturales, como la asíatica, la oriental, pero también la aborigen
australiana, etc. Una segunda parte, o bien combinada con la primera, consistiría en
mostrar al público in situ como operan algunos de estos instrumentos, como por ejemplo,
el shruti petti, la tampura, las arpas de boca, el canto difónico, los cuencos tibetanos y
también el didgeridoo, que es el ejemplo por excelencia de los instrumentos aerófonos.
13 de Janeiro de 2005
The medical practices in the classical ayurvedic texts
- Dominik Wujastyk (Wellcome Centre for the History of Medicine at UCL)
Ayurveda has been the dominant system of formal medicine in South Asia for most
of the last two millennia. Greek medicine, transmitted through Islamic culture, became
available in India during the reigns of the Sultans and Mughals, and also through the early
Portuguese, Dutch, French and English colonial powers. The innovations in European
medicine since the eighteenth century, have also been available in South Asia, and are now
its main medical orthodoxy, although ayurveda continues to be funded and regulated at the
government level and to be practised amongst many of the billion inhabitants of the subcontinent.
This lecture will explore the theory of the earliest history of ayurveda, its chief
beliefs concerning the structure and function of the human body, and its doctrines of
pathology and therapy.
14 de Janeiro de 2005
An introduction to contemporary practices of Ayurveda in India
- Dagmar Benner (Cambridge University)
In India today, the ancient medical tradition of Ayurveda is part of the Government
of India’s national health system. Ayurvedic education and practice are centrally
controlled by the Central Council of Indian Medicine (CCIM) which belongs to the
“AYUSH” Department of the Ministry of Health and Family Welfare. Government colleges
teach an integrated system of Ayurveda, which combines ayurvedic with biomedical
elements. The results of this approach have been widely criticised and discussions on how
to reshape ayurvedic education are ongoing. In any case, government-regulated Ayurveda
does not represent the full picture, as there exist at the same time traditional practices of
Ayurveda that are not based on government-approved education. One of the most
important and most respected of these traditions is the Keralan Ashtavaidya tradition.
Their medical practice is based upon the teachings of the classical ayurvedic treatises but
also incorporates therapies specific to the Keralan tradition that are not mentioned in the
ancient texts. Further to the Ashtavaidya tradition, there are a variety of specialised folk
medical traditions that are associated with Ayurveda. In this lecture, the different
approaches to Ayurveda will be introduced with a brief sketch of their respective histories.
A selection of documentaries that highlight the differences between the various approaches
as well as their common ground will be shown and discussed.
15 de Janeiro de 2005
As praticas médicas do império: o caso de Goa
- Cristiana Bastos (Instituto de Ciências Sociais)
Em 1842 o governo da Índia portuguesa aprovou os estatutos de uma Escola
Médico-cirúrgica com um programa de estudos semelhante aos das Escolas do Reino. Cinco
anos mais tarde o governo português reconhece oficialmente a instituição, que virá a ter um
destino diferente das demais tentativas para organizar o ensino médico nas colónias
portuguesas, as quais ou falharam ao fim de poucos anos (Luanda) ou nunca sairam do
papel (Cabo Verde, Moçambique, de novo Luanda). Pelo contrário, a Escola de Goa virá a
formar ininterruptamente gerações de médicos, cirurgiões e farmacêuticos que mais tarde
virão a impôr-se nos serviços médicos coloniais portugueses. A sua continuidade
institucional e posterior sucesso (já no século XX) não devem porém ocultar as reais
fragilidades com que começou. É olhando para essas fragilidades que tentaremos obter um
quadro sobre a diversidade e sobreposição de práticas médicas na Índia de administração
portuguesa do século XIX
Os Saberes
21 de Fevereiro de 2005
A Sabedoria da India Antiga
- Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa)
Ver (veda e “sadedoria”…). Do inventar de olhos e de cósmico eco em corpo
imenso e por demais… à visão audível e só em sonho entrevista (ainda em sruti). Também
um saber de saborear pelo seu contorno de palavra (sabda). Das muitas gramáticas
imagéticas ao aforístico indicativo da sapiência da upanisad. A descoberta da mente
(manas) na “mentira” (depois maya) do especular sem o si desse olhar luminoso (buddhi),
desse sopro animante, a não confundir com o animado. Da miragem da reflexão (dos
pramanas…) à evidência iluminativa de Atman – Brahman. Saber como auto-consciência
(a questão da semântica de cit, citta…), ou união incônscia ?… As purificações desse
“sabor” de ideal ser nos ‘amargos de boca’: dualização, pulverização ‘niilista’… Nirvana
e anatta. Apesar de todo este “nada” ainda persiste o tat tvam asi de uma realização
possível, no caminho yoguico que faz escala aquém e além do humano (então como
prajña). Sabedoria cósmica, pois, nesse extremo cepticismo em relação à verdade, qual
“gaia ciência” de via abrupta e ‘síntese’ só em lila.
22 de Fevereiro de 2005
As sapiências da India Moderna
- Pedro Teixeira da Mota
É na Índia que sem dúvida se tem melhor preservado tradições espirituais
milenárias, quer por via oral e escrita, quer por vivências possíveis com seres e locais
ininterruptamente ligados com a experiência espiritual e a filosofia perene.
Os mestres e os ashrams, as sadhanas e os yogas são os pontos principais onde
aflora esse imenso conhecimento e poder e que tem nos Himalaias e no Ganges as suas
contrapartes físicas mais impressionantes.
Ao contrário das tradições espirituais de muitas das religiões mundiais (como o
cristianismo e o islamismo, mais selectivos e obrigando a uma certa confessionalidade), ou
ao contrário dos países modernos, dos quais o mais paradigmático é o Estados Unidos da
América (que alberga como num supermercado do hamburger ao guru, desde que pouco se
discrimine e se pague), a Índia moderna conserva os seus lídimos representantes das
tradições mais puras, mais gratuitas e espontâneas, desde os parahamsas aos milhões de
sannyasins e sadhus, seres que renunciaram ao mundo e vagueiam errantes em busca da
iluminação, ou já na fruição da indescritível ananda, beatitude.
Descobrir os mestres, os ensinamentos e locais apropriados ao estado de
consciência e de ser de cada um, iniciar as práticas conducentes à harmonização, ao
silêncio, à iluminação, à libertação ou união torna-se então o principal desiderato
daqueles que na busca das fontes do auto-conhecimento e da sabedoria peregrinam à
Índia.
A presente comunicação visa transmitir alguns dados experienciais de várias
penetrações nos domínios luxuriantes da Índia e testemunhar alguns ensinamentos e
mestres que permanecem como faróis no Caminho que nos conduz da «ignorância ao
conhecimento, das trevas à luz, do irreal ao real, do não ser ao ser».
29 de Março de 2005
Beautifying beauty: traditional paths
- Ghanashyam Marda (Ayurvedya)
30 de Março de 2005
Atelier pratico sobre rangoli e mendi
- Suraj Tapadiya (Deenanath Mangeshkar Hospital)
A India e a fabricaçao da natureza humana
- Ana Salema (Centro de História de Além-Mar)
4 de Abril de 2005 – O Ayurveda
5 de Abril de 2005 – O Yoga
6 de Abril de 2005 – O ritual
A exploração das prescriçÿes, dos dispositivos e dos feitos da experiência psicagógica
na fabricação de uma outra natureza humana tornará evidente a sua transgressividade.
Partir-se-á de uma breve reflexão sobre o que é, em contexto indiano, a natureza humana
(transnatureza) e do modo como são ultrapassados os supostos limites da experiência, para
se observar o modo como pelas práticas psicagógicas se abrem as passagens que nos levam
do "corpo próprio" ao "corpo impróprio" ou da pessoa à não-pessoa, e do modo como elas
requerem uma experiência integral do corpo.
O ayurveda, o yoga e o ritual serão os domínios de estudo privilegiados para esta
reflexão, cada um oferecendo diferente "manual de instruçoes" para a fabricação de um
insólito humano, mas todos referindo ao mesmo instrumento : o corpo. Dele partindo e a ele
chegando toda a acção (karman).
É justamente no domínio da experiência do corpo - com o corpo e pelo corpo - que a
India nos mostra de modo singular o que falta aos nossos saberes, fundamentalmente
representativos, para dissipar os obstáculos que, impedindo a sua integração no conjunto da
experiência, impedem o acesso ao bem-estar que é, aqui, um bem-ser, um espaço feliz
(sukha).
1. A confluência de orto e heteropraxias no ayurveda
A análise de algumas passagens da Carakasa¾hit¢ (Compêndio de Caraka, texto
simultaneamente fundador e memorial do ayurveda) tentará mostrar a natureza da
iconicidade da experiência do corpo, os modos como ela é trabalhada pelo vaidya -tanto para
o diagnóstico como para o tratamento - e de que forma ela é a primeira e principal via de
acesso ao processo de cura. Principal mas não única pois cruza-se, toca e atravessa outras
uma vez que o corpo humano se expande aos não humanos, aos deuses, à natureza, aos
astros, a entidades várias com as quais as trocas - actuais ou virtuais - são constantes.
Assim se reconhecerá que o ayurveda não é uma medicina stricto sensu. Ele é, literal e
praticamente, um saber sobre a vida (que se quer sukha) nas suas múltiplas dimensÿes e
fluires, não podendo excluir o ritual, o yoga, a astrologia, a ecologia ou a moral, do mesmo
modo que não pode excluir a anatomia, a farmacologia, a botânica ou a fisiologia. Ele é
ainda, e sem contradição, um saber sobre os modos de entrar na morte em vida niv²tti,
mok¼a.
2. O corpo entre representação e experiência no yoga
Os gimnosofistas, sábios nus e despojados, como lhes chamavam os gregos, não são
meros monumentos históricos de uma gloriosa audácia passada de solidarizar os três
instrumentos pelos quais o acto (karman) se faz potência (¡akti) - corpo, mente, palavra.
Eles são também, e ainda hoje, entidades vivas, talvez as únicas a par dos mestres do ritual,
que vão assegurando a irredutibilidade ao movimento de integração e modernização de
conhecimentos, práticas e experiências invariáveis e invariavelmente transmitidas. Hoje já
não lhes chamamos gimnosofistas nem faquires. Chamamos-lhes yogis, sannyasis e s¢dhus.
Através de um estudo introdutório de algumas passagens dos Yogas¦tra de Patañjali, texto
igualmente fundador e memorial, procurar-se-á por um lado compreender o yoga na sua
tripla dimensão de ponto de vista (dar¡ana), de prática (s¢dhana) e de experiência
(sam¢dhi); e por outro lado mostrar o papel da imagem como operadora das transformaçÿes
visadas.
3. A iconicidade da experiência do mundo no ritual
O ritual é indiscutivelmente o domínio mais presente e actuante na vida indiana, o
melhor preservado e o mais preservável pela natureza própria do conjunto de saberes de
onde emerge, das práticas que o realizam e das experiências que o ratificam, uma particular
espécie de "sem-sentido" de que se procurará discernir o sentido.
Ritual é uma palavra que nós utilizamos para indicar realidades relativamente
diferenciadas no tempo e nos grupos sociais : yajña, p¦j¢, medha, kratu, etc.
Explorar-se-á a incontornável oposição entre, por um lado, o sacrifício védico (ainda
bramânico), e por outro lado a p¦j¢. Aquele sangrento, sem templo nem imagens, de
submissa dominação no forçar a divindade a satisfazer necessidades interessadas, bem e
largamente atestado nos textos (desde o Atharvaveda às Sa¾hit¢s e Brahma½¢s), em que o
acto sacrificial (yajña) é mais importante que a própria divindade. A p¦j¢, rito de
homenagem, de profunda aceitação e veneração, de hospitalidade (no duplo sentido de
hospes), cuja devoção multiplica imagens e templos (privados ou públicos), espaços do
espaço singularmente afectados à comunicação e trocas com as entidades divinas.
16 de Maio de 2005
Le temple et l’image: architecture et iconographie dans le monde indien
- Bruno Dagens (Université de Paris III)
L’architecture des temples dans le monde indien est une architecture de sculpteurs.
Vu de l’extérieur ces temples apparaissent le plus souvent comme de gigantesques masses
sculptées qui leur font supposer une structure interne bien différente de ce qu’elle est en
réalité: les uns en Inde du sud ou en Asie du sud-est feignent d’être des édifice aux étages
multiples, alors qu’ ils ne comportent qu’un rez-de-chaussée surmonté par une sorte de
longue cheminée sur l’habillage extérieur duquel sont sculptés des étages qui ne sont donc
que de «faux-étages»; d’autres en Inde Nord – à Khajuraho par exemple – ont une
superstructure qui donne l’illusion de la présence d’innombrables chapelles, alors qu’il ne
s’agit que d’un simple décor sculpté. Dans un cas comme dans l’autre le procédé n’a pour
but que de magnifier le temple et par là même son dieu titulaire. La sculpture ne se limite
pas naturellement pas à ces fictions architecturales, et les images qui jouent une grand rôle
dans la pratique religieuse occupent une grande place sur les murs du temple. Banalement,
pourrait-on dire, elles viennent peupler les façades de façons très variées – statues dans
des niches, frises de bas reliefs, personnages dans des motifs décoratifs etc. – qui
témoignent de programmes religieux très clairement définis et imbriqués étroitement à
l’architecture. Cependant les choses peuvent aller plus loin: ne se contentant plus
d’habiller des façades avec des images, on fait parfois du temple lui même une image. Les
procédés sont divers – ici le temple est un Linga, représentation symbolique de Siva, là il
est le corps d’un dieu, tandis qu’ailleurs encore l’architecture laisse transparaître l’image
à travers une claire-voie – mais il s’agit toujours de célébrer le dieu à travers la traduction
de concepts théologiques très abstraits et parfois absconds, qui par la simple vertu de leur
traduction architecturale gagnent une lumineuse clarté.
17 de Maio de 2005
Ícones na rua, templos de papel
- Fernando Cardoso
Vestem-se e despem-se os deuses; abundam lingams à sombra das árvores; o
grafismo provoca o nosso olho distante; a composição é regrada e antiga; puranas do olhar
leêm a mitologia; fugas de perspectiva inquietam a geometria; darshana – exercícios de ver.
18 de Maio de 2005
Adopção e esquizofonias: o fascínio da “musica indiana” no discurso da poscolonialidade
- Susana Sardo (Universidade de Aveiro)
A música constitui hoje um dos testemunhos mais evidentes da poscolonialidade do
planeta. Seja através de processos de invasão musical seja por meio de trocas culturais, as
diferentes músicas têm agora pertenças limitadas e transformaram-se numa espécie de sons
esquizofónicos um conceito que Steven Feld define como o acto de afastar a fonte musical da
sua origem. A “música indiana”, porventura um dos territórios musicais estruturalmente
menos permeáveis ao diálogo com outras músicas, é hoje um ávido receptáculo de alguns
paradigmas ocidentais (géneros musicais, contextos de desempenho, modelos de
interpretação), e, sobretudo, transformou-se num importante inspirador dos músicos e
compositores ocidentais em quase todos os domínios da música, desde o Jazz, ao Rock, ao
Trance e à música erudita contemporânea. Mas este novo estado da música, em muitos
casos designado por world music, não é mais do que uma relação quase neocolonial. Aqueles
que se interessam pela música dos “outros” não o fazem pelo interesse que os outros lhe
merecem enquanto músicos mas sim porque potencialmente detêm ingredientes musicais
que podem reabilitar a sua própria música favorecendo-a perante as oportunidades do
mercado. A minha contribuição procura reflectir sobre este problema e analisar o modo
como a imagem musical da Índia, no passado quase sacralizada pelo ocidente, se redefine
hoje no mundo pós-colonial constituindo um dos mais eficazes processos de diálogo intercultural.
Mulher da casta Dom em Varanasi
Estela a Nagexuar (Gokarna)
Sadhu
Sadhu tocando cancões devocionais
(Gokarna)
Kapila Vrshabhadhvajeshvara, um aspecto de Vixnu (Banaras)
Jornadas de Filosofia Indiana
26 a 27 de Abril de 2005
Introdução
Pela primeira vez que se abre na paisagem universitária portuguesa um
espaço de encontro e reflexão sobre a filosofia indiana e as possíveis abordagens
comparatistas, antropológica e etnográfica. A sua ausência do ensino e da
investigação tem favorecido, entre nós, a persistência daqueles preconceitos que no
século XIX se erigiram em jeito de barricada face ao desconcertante exotismo da
tradição filosófica indiana. A realização destas jornadas visa muito
particularmente:
1. Melhorar o conhecimento o conhecimento e a compreensão de uma das
tradições filosóficas mais variada e complexa, tornando acessível ao meio
filosófico e orientalista português alguns dos temas e questões que animam os
trabalhos e investigações neste domínio.
2. Retomar, em termos simples, não só o esforço inaugural de Masson-Oursel de
há seis ou sete anos decénios, datado mas não ultrapassado, de reconsuzir a
estranheza da Filosofia Indiana à origem euro-asiática da Filosofia Grega, como
ainda, o esforço mais recente de Michel Hulin, de no seu ensino da Filosofia
Indiana e Comparada em Paris IV, criar numerosas pontes de inteligibilidade
para a abordagem filosófica da filosofia indiana.
3. Discutir sobre o interesse e oportunidade da abordagem comparatista em
Filosofia hoje – em que quadro, a partir de que fontes, com recursos a que
métodos e instrumentos, por exemplo?
Interrogar a própria tradição filosófica europeia por intermédio da filosofia
indiana. Não a montante, nem a jusante, não a de ontem, nem a do amanhã, mas a
de hoje e aqui, em Portugal, em França, na Europa, na Universidade, na
Investigação, nas escolas.
Gilles Tarabout e Roger-Pol Droit aceitaram a estimulante tarefa de
interpelar e discutir as filosofias e a Filosofia tentando multiplicar os pontos de
vista, os ecos de tantas vozes, as imagens compósitas que cada um de nós retraçará
seguramente.
Espera-se que a viva participação dos filósofos, orientalistas e antropólogos
portugueses neste debate contribua para alargar e aprofundar as múltiplas
aberturas.
Programa
La philosophie des barbares : la représentation grecque des philosophes indiens
- Roger-Pol Droit (Centre National de la Recherche Scientific)
O signo e os problemas da significação
- Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa)
Doctrine of karman and rebirth: origin and development in the Indian speculations
- Paola Rossi (Università di Padua)
La controverse sur l'âtman : 25 siècles de malentendu entre bouddhistes et
brahmanes
- Michel Hulin (Paris IV)
La « Vie du Bouddha » : récit historique ou mise en scène de la doctrine à travers
un modèle idéal ?
- Victoria Lyssenko (Russian Academy of Sciences)
Y-a-t-il une philosophie du rituel ?
- Charles Malamoud (École Pratique des Hautes Études)
Les philosophies de la nature et du vivant : l’écologie indienne ancienne
- F. Zimmermann (École des Hautes Études en Ciences Sociales)
Les perspectives ouvertes par une approche comparatiste en Philosophie
Mesa redonda com a participação de:
- Michel Hulin,
- Jorge Croce Rivera,
- Gilles Tarabout,
- Roger-Pol-Droit
-Celebração da vida-
Exposição etnográfica sobre os warli
Recolha de material e apresentação Dorothée Geffray
1 a 20 de Abril de 2005
Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
Os Warli habitam nas colinas do distrito de Thane (que se estende do norte
de Bombaim até ao sul do Gujarat). Com vidas simples, inspiradas pelo ritmo da
natureza, eles celebram as épocas das sementeiras e das colheitas com pinturas
simbólicas nas paredes das suas cabanas. Estas representam tais ocupações e
festividades com a intenção de propiciar fertilidade e abundância da terra. Além
deste trabalho de subsistência, a floresta é a principal fonte de rendimento dos
Warli que se auto-denominam “povo da floresta”.
Porém, nestes últimos trinta anos, a desflorestação maciça e sistemática tem
vindo a degradar drasticamente a sua relação especial com a floresta, obrigandoos
assim a diversificar as actividades de subsistência e a ajustar as suas
necessidades às novas condições.
A habilidade pictórica desenvolvida para as celebrações festivas, associada
ao incentivo da politica governamental no sentido da preservação da cultura tribal,
levam hoje os Warli a desviar as tradições figurativas do seu prévio contexto sociocultural
para um novo contexto económico, produzindo pinturas narrativas que
retratam a natureza como enquadramento da gesta quotidiana, das quais se
destacam principalmente as ocupações agrícolas.Esta exposição de pinturas,
máscaras e fotografias, pretende mostrar os modos de vida e de expressão desta
população tribal.
-Cadernos de Viagem 2-
Exposição de fotografia de Fernando Cardoso
22 de Abril a 11 de Maio de 2005
Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
O bronze e o bordão, ritmam o espaço próximo do açafrão suado na descida para a água.
É a hora da madrugada.
Pequenos sóis despontam em archotes de manteiga.
Camas de fogo onde repousam flores, cinzas, as almas dos peregrinos.
Danças de mãos em concha restabelecem laços mitológicos.
Por sobre a água, rituais de panos e corpos molhados ligam o Cosmos às bocas.
Preces silenciosas saturam as paisagens ribeirinhas e os corvos riscam desenhos de dor.
O sândalo, incendeia-se em libertação para não voltar a renascer.
É ainda a hora da madrugada.
Da varanda sobre o Ganges irrompe o disco solar imenso, incansável, poderoso.
É a hora barroca.
Começa mais um dia na cidade da luz.
Índia: objectos, lugares, pessoas
Exposição de Pintura de Ana Mouga
13 a 31 de Maio de 2005
Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água
A viagem inicia-se levantado voo. O tempo
recomeça para o olhar que larga o porto de
Lisboa rumo à Índia.
Ao chegar é-se abraçado por essa terramãe
mítica, viva e receptiva, fervilhante de
formas e de seres e todos os conteúdos
humanos.
Pessoas, lugares, objectos.
Hábitos diferentes daqueles do porto que
se deixou. Padrões tecidos de movimento,
cor, cheiros e som que nos trespassam e
reconduzem a um lugar interno
misteriosamente familiar. Lógicas e
geometrias próprias, ritmos de vivência
marcados pela presença dos deuses.
Os quadros recortados do filme que passa
fixam-se apenas em linhas no papel. Fios
desenrolados de memória que fazem a
ponte para cá. Pecinhas caídas do
caleidoscópio agora reanimadas...
Reencontram-se pessoas...
Revisitam-se lugares...
Objectos trazidos lembram o quotidiano
ritO.


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