quarta-feira, 30 de junho de 2010

1344 - HISTÓRIA DO LIVRO

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Imagem e narrativa no livro infantil contemporâneo
V Simpósio LaRS 2006
Illicite Errore – Transgressão ou Impertinência?
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Departamento de Artes & Design
Orientador: Alberto Cipiniuk
Aluna: Barbara Jane Necyk
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Imagem e narrativa no livro infantil contemporâneo
O projeto editorial de um livro abrange diversas características, sendo que, um requisito
básico é que tenha texto, que os diálogos possam ser lidos, que a narrativa tenha um
sentido do início para o fim, entre outros. A partir de algumas premissas básicas como
estas, o livro infantil contemporâneo pode ser considerado um espaço de ousadia
transgressora. Muitos são os aspectos pelos quais essa produção voltada para o público
infantil pode sair do padrão editorial de gêneros literários mais tradicionais, como por
exemplo, a literatura técnica e científica. Seja no projeto gráfico ou na condução da
narrativa, o livro infantil contemporâneo estabelece um modelo peculiar unindo duas
grandes área da produção artística, a ilustração e o texto.
Este artigo se propõe a examinar algumas formas nas quais o livro infantil
contemporâneo impõe uma relação diferenciada e pouco tradicional na condução de um
conteúdo ficcional. O argumento principal é que, se algumas vezes essas
experimentações são impertinentes, em outras, ajudam a criar várias camadas de leitura
e a ampliar a percepção estética da criança que é introduzida por meios dos livros
infantis nos códigos culturais da sociedade. A criatividade neste caso não é apenas do
autor ou ilustrador, mas do próprio leitor. As instâncias produtoras do livro infantil
ousam quando trabalham no intuito de incentivar a criatividade do leitor através da
ampliação da percepção das narrativas. Os modos diferenciados de condução de
narrativas infantis, no suporte impresso, proporcionam à criança uma reflexão sobre os
modos de apreensão de linguagens - exercício este estimulador de uma atitude ativa
como consumidor de produtos culturais.
Segundo Iser, o texto literário é por essência um texto com “vazios” ou “intervalos” a
serem preenchidas pelo leitor, segundo o que ele é, ou seja, segundo seu repertório
constituído da vida social, cultural e comunitária. Não existem verdades estabelecidas
pelo autor e a produção de sentidos é uma construção efetuada entre o texto e o leitor.
Ou seja, a leitura não é uma internalização do texto porque não é um processo de mãoúnica
e sim um processo dinâmico de interação entre texto e leitor. Neste sentido, Iser
valoriza a imaginação criativa do leitor que deverá colocar toda sua experiência de vida,
sejam estas de leitura ou não, em detrimento da atribuição de sentido ao texto.
Se entendermos a leitura, no caso do livro infantil, como um processo de contato e troca
entre a criança e a narrativa do livro, temos um espectro ainda mais ampliado de
participação deste “leitor criança”. Em outras palavras, a leitura do livro infantil já é por
si só um exercício de criatividade, pois a criança deve não apenas completar, mas
montar sua própria história conforme seu momento de vida. O texto e a imagem
fornecem informações diferentes da mesma narrativa e esta interação gera múltiplas
camadas de leitura.
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O livro de imagem
Apesar do livro infantil contemporâneo se constituir em uma narrativa composta pela
interação de texto e imagem, poucos estudos abordam esta relação. As centenas de
livros sobre a literatura infantil nacional versam basicamente sobre as implicações
textuais. Os poucos estudos sobre a imagem no livro infantil partem de pesquisadores
como Camargo e Ferraro, que desenvolveram vasta pesquisa sobre o assunto.
Os estudos realizados por Camargo (apud Ferraro) revelam a data de publicação do
primeiro livro de imagem brasileiro. Juarez Machado publicou em 1975 o livro Ida e
Volta, primeiro em uma coedição Holanda/Alemanha; em seguida na França, Holanda e
Itália e, finalmente no Brasil em, 1976, pela Primor. O livro Ida e Volta constitui-se de
ilustrações de cenas que levam o leitor para dentro da obra ao tentar seguir as marcas
das ações de um protagonista invisível.
Este tipo de livro é um produto relativamente recente na nossa cultura e, em 1995,
Camargo aponta em seu livro A Ilustração do Livro Infantil, a existência de 113 livros
de imagens editados no Brasil. Em 2001, Ferraro adiciona através de pesquisas em
livrarias e bibliotecas, mais 40 novos títulos a este montante.
Desde 1981, a Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil inclui a categoria de
Melhor Livro de Imagem, o que não deixa de ser um reconhecimento do potencial
artístico destes materiais. O livro ilustrado e, mais especificamente, o livro infantil
contemporâneo oferecem uma experiência estética incomum às mídias massivas como a
televisão, o cinema e o computador. O contato com esses materiais impressos é uma rica
experiência estética para crianças, acostumadas com a imagem fugaz e fragmentada das
mídias eletrônicas.
Para iniciarmos uma análise de como a imagem gera a narrativa do livro de imagem
passemos por uma definição simples do venha ser este tipo de livro. O livro de imagem
é aquele que possui uma narrativa construída unicamente por ilustrações. O suplemento
verbal é utilizado nas partes pré-textuais e pós-textuais da estrutura tradicional de um
livro. Algumas vezes, o autor opta por fazer uma pequena abertura ou conclusão na
forma de texto. A história propriamente é contada por imagens. Sem texto.
Uma primeira faceta transgressora do livro de imagem reside no fato de ser um produto
da literatura gerado sem o uso da escrita. Seria um livro sem texto um produto de
literatura? Afinal de contas, o que é literatura? Tradicionalmente, espera-se que um livro
tenha texto, se não muito, pelo menos um pouco. Uma história contada por imagens
deve ser verbalizada, lida ou escrita, para que se torne uma história?
Debray afirma que não se deve confundir pensamento com linguagem pois a imagem
faz pensar por meios diferentes de uma combinatória de signos e o inconsciente que
funciona por imagens, em associações livres, transmite bem melhor do que a
consciência que escolhe suas palavras. “A pintura não transmite um sentido, mas faz
sentido por si mesma, para aquele que olha, segundo o que ele é”, diz Rosset. O
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espectador é quem abre ou fecha as portas. Em outras palavras, a atribuição de sentido
de uma imagem é tarefa exclusiva do espectador e falar sobre o que se vê pode torna-se
uma tarefa muito difícil, pois cada linguagem utiliza operações diferentes. O autor
afirma não haver equivalente verbal para uma sensação colorida para citar um exemplo.
Entretanto, a ilustração no livro infantil faz parte de uma história e as histórias fazem
parte de uma tradição oral. A leitura do livro de imagem, assim como grande parte da
literatura infantil, acontece através da mediação adulta. Geralmente, pais ou professores
apresentam inicialmente o livro à criança. As atitudes de mediação adulta em relação ao
livro de imagem podem variar desde deixar que a criança sozinha olhar as imagens,
como até traduzir em palavras a seqüência de imagens para ela.
Se algumas publicações trazem suplementos educativos que solicitam tarefas clássicas
do currículo escolar, inclusive, a transcrição da narrativa para crianças alfabetizadas,
outras tentam sugerir a exploração de aspectos, como por exemplo, a questão da
alfabetização visual e a leitura do livro de imagem como um momento de troca entre
adultos e crianças.
Outro aspecto transgressor desse tipo de livro é o fato de ser uma história aberta. Uma
característica do livro de imagem é o fato de deixar uma margem de interpretação muito
aberta para seus leitores destinatários, as crianças, ou para qualquer um que queira vêlos.
O livro de imagem fornece uma apreensão mais aberta, como a própria imagem, em
oposição ao discurso articulado do texto que, apesar de polissêmico, parece ser mais
fechado e controlável.
Almeida Junior (apud Ferraro) observa que as imagens sempre acabam oferecendo ao
leitor uma “corrente flutuante de significados” muito mais ampla do que a
proporcionada pelo texto verbal, que dirige de uma forma mais intensa o processo de
leitura devido a sua maior exatidão e submissão às convenções históricas.
Ao comentar sobre a coleção de livros infantis do século XIX de Karl Hobrecker,
Benjamin observa como a ilustração salva o interesse das obras mais antiquadas e
tendenciosas, pois essa teria se furtado ao controle das teorias filantrópicas e artistas e
crianças teriam se entendido rapidamente, ultrapassando a cabeça dos pedagogos. Desta
forma, a ilustração está além do que se pode prever através das intenções pedagógicas e
do controle do sistema educacional. Se, através do texto, a atribuição de sentido é tarefa
do leitor, com a imagem tudo, inclusive a própria história, passa a ser responsabilidade
de um espectador criativo. Através das ilustrações infantis, ilustradores e crianças
estabelecem uma troca geradora do que Benjamin classifica de “imaginação criadora”.
De certa maneira, o livro de imagem é um sub-produto do livro infantil contemporâneo,
que assumiu a imagem como elemento estrutural da narrativa. É importante ressaltar
que as narrativas construídas apenas através de imagens necessitam de uma produção
assim pensada. As cenas ilustradas devem ser planejadas para que a ilustração dê conta
de uma série de informações geralmente fornecidas pelo texto.
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Análise da narrativa do livro de imagem
Em A Bela e a Fera (1994), Rui de Oliveira utiliza um enredo clássico dos contos de
fada do mesmo nome. O autor relata ter lido o original em francês para entrar no
“clima” da história. Através da seqüência de cenas, o autor e ilustrador conta uma
história ambientada em espaços abertos e fechados com características que configuram
um determinado tempo e lugar. A ilustração colorida é rica em detalhes e a
ornamentação é presente na capa, na folha de guarda e miolo do livro, o que contribui
para a representação semântica da história. Este livro de imagem incorpora a
interpretação do autor/ilustrador1 sobre a história, em outras palavras, é um livro de
imagem que se remete a um livro escrito.
Para sua produção Oliveira teve que escolher as cenas que melhor representam a
história. Assim como em um storyboard estão representadas as cenas que melhor
descrevem um filme ou um comercial, o livro de imagem possui cenas que expressam
momentos-síntese. Cada ilustração é responsável pelos momentos-chave da trama
(figura 1).
figura 1
A narrativa é dada por uma seqüência de imagens que possuem vínculos entre as
imagens da página anterior e da página seguinte e um vínculo global com toda a
1 Ferraro cita que eventualmente autor e ilustrador são pessoas diferentes no livro de imagem. O mais
comum é que uma única pessoa seja autor e ilustrador.
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narrativa. A visualização do livro se dá por pares de páginas - em composição de duas
páginas simples ou em uma página dupla.
Em palestra, Rui de Oliveira , relatou como, no seu livro de imagem A Bela e a Fera, os
personagens passam por uma transmutação através do enredo. Esta transmutação,
expressa pela ilustração, envolve o estado emocional e a aparência física. Por exemplo:
a “Bela” que inicia como adolescente, ganha traços de mulher, sendo que seu cabelo
preto azulado se transforma em loiro (ver figura 1). A “Fera” com feições animalescas
passa a ganhar traços e gestos de homem da corte, e sua cabeça diminui visivelmente de
tamanho. Ou seja, para Oliveira , a ilustração, aplicada aos livros infantis, assim como a
narrativa, está livre de determinações encontradas em outras publicações.
Através da observação das cenas não é difícil perceber que o livro de imagem A Bela e
a Fera não procura se igualar à narrativa do livro original. Muito dificilmente alguém
que não tenha lido ou ouvido esta história conseguirá relatar tal e qual a versão escrita e
fica evidente que esta não é a intenção do livro. Veja abaixo quais são os objetivos
norteadores desta publicação, escrita no encarte que acompanha o livro:
A finalidade do projeto é a alfabetização visual da criança, pois raramente a palavra e
a imagem são interpretadas como um processo único, harmonioso [...] O professor ao
ter nas mãos um livro ilustrado, pode dissertar com seus alunos sobre questões
objetivas, que fazem parte de qualquer experiência visual: a composição, o ritmo, a
linha, a textura, a cor, etc. As possibilidades de representação gráfica não se esgotam
na adequação dela ao texto. E no mundo moderno, onde 70% das informações são
obtidas através da visão (cinema, televisão, propaganda), é necessário educar a
criança para que ela não sucumba à massificação das imagens.
Ao mesmo tempo em que o texto acima explica o objetivo do livro, critica a submissão
da ilustração ao texto e a produção massiva de imagens pela mídia eletrônica. Ressalta
também a importância do livro de imagem como objeto de uso pedagógico e como
instrumento de debate entre adultos e crianças. O texto não procura explicar a narrativa,
nem ao menos se referir a ela. A sugestão de debate se concentra na representação
gráfica e não na história.
Esses parágrafos escritos antes ou depois da história do livro de imagem tendem a
afirmar o objetivo e uma importância do próprio material, o que revela a hipótese de que
esse tipo de livro ainda não seja tão reconhecido ou que seus propósitos não são tão
óbvios para o público em geral.
Outros livros de imagem como Noite de Cão (1996), de Graça Lima e A Flor do Lado
de Lá (1999), de Roger Mello, constituem-se de narrativas originais, característica da
grande maioria dos livros de imagem.
Ambos possuem formato quadrado e, em função disso, a visualização da página dupla
torna-se um plano horizontal com proporções próximas a tela do cinema. Como parte de
narrativas construídas através da seqüência de imagens, estes livros, utilizam-se da
linguagem do cinema e da história em quadrinhos, como veremos a seguir.
Em A Flor do Lado de Lá se observa uma composição com características de plano
médio e vista lateral. O ilustrador alterna páginas duplas a uma cor (preto e branco) para
os momentos de tédio e tristeza do personagem principal, com páginas duplas em
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policromia (coloridas) para os momentos felizes ou de surpresa da trama (figura 2 e 3).
A utilização de páginas preto e branco e coloridas em publicações geralmente se dão em
função da questão de custo com aproveitamento do processo de produção gráfica. Por
exemplo, pode-se ter um livro com miolo a uma cor e com o caderno central impresso
em policromia para exibição de fotos. No caso de A Flor do Lado de Lá, o preto e
branco possui significação semântica, pois expressa um estado de alma.
figura 2
figura 3
As revelações da trama são dadas através “movimentos de câmera” na cena. Uma
primeira revelação é feita por “zoom out” ou afastamento do ponto de vista de quem
olha e outra por deslocamento lateral desvelando, em ambos os casos, parte da cena até
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então não mostrada (figura 4). A metáfora do cinema, especialmente o cinema mudo, é
uma constante neste livro. As expressões do personagem principal são acentuadas assim
como no cinema mudo onde não se conta com diálogos.
figura 4
Na contra-capa encontra-se o seguinte texto:
É humano chorar
Pelo que não se tem,
desejar a beleza distante.
Só que, às vezes,
há tanta beleza pertinho
e a gente não vê.
Com a imagens deste
livro sem texto
Roger Mello conta a
história humaníssima
de uma anta.
O primeiro parágrafo deste texto refere-se ao enredo, mas sem explicá-lo. O texto
acrescenta um jogo às imagens. Texto e imagem trabalham a dualidade da visão no
sentido propriamente dito e no sentido da sensibilidade humana. O segundo parágrafo
versa sobre o livro ao qual se refere como “livro sem texto” que é outra forma de
classificá-los. O adjetivo humano é usado duas vezes (humano, humaníssimo) quando,
ironicamente, o personagem é um animal, uma anta.
Em Noite de Cão encontra-se o mesmo formato quadrado. A autora utiliza retângulos
chapados (azul e preto) para representar a área da cena e a circunscrição do personagem
principal (cão) na noite. Os retângulos alternam entre posições verticais e horizontais e
o personagem e os elementos das cenas são dispostos dentro e ao redor dele. As páginas
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duplas possuem variadas quantidades de cenas - de uma a cinco cenas. Algumas
formam um conjunto de cenas que indicam uma ação progressiva (figura 5).
figura 5
Na página central, existe o uso da onomatopéia ao modelo das histórias em quadrinhos
(figura 6). No total, são três onomatopéias utilizadas nesta história que ganham
representação gráfica condizente com o som que representam.
figura 6
Na continuidade da história encontra-se uma cena onde se observa uma técnica muito
empregada nos livros de imagem – a metalinguagem. Nesta cena vê-se o cão virar o
canto da página inferior com a intenção de procurar o objeto perdido – a lua (figura 7).
A ação gera a consciência do objeto livro e do processo de leitura.
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figura 7
A figura 7 representa através da repetição do personagem uma cena composta de
momentos que consolidam uma ação comum. Este é um recurso usado para indicar uma
intenção contínua.
Ao final da história encontra-se um texto relativamente extenso para este tipo de livro.
O texto inicia em tom pessoal do qual se supõe ser escrito pela autora - não é assinado.
Neste texto segue uma explicação das motivações para produção do livro e escolha do
tema. O trecho abaixo transcrito apresenta uma visão da relação narrativa, imagem e
texto:
Geralmente, quando lemos um livro ou quando alguém conta uma história,
podemos imaginar a cena escrita ou ouvida. Ela sempre será diferente de
pessoa para pessoa. Cada um tem o seu arquivo de imagens e cria, de acordo
com sua sensibilidade, o visual imaginário.
Na coleção Que história é essa? Nós resolvemos inverter a situação contando
através de desenhos para que se possa criar individualmente o texto, utilizando
todos os vôos que a imaginação da criança quiser.
Conclusão
Desde a invenção da prensa tipográfica percebe-se como, em todos os sentidos, a
produção editorial passou a vivenciar padrões e normas. Por uma questão tecnológica e
comercial, o livro impresso traçou nos últimos séculos um processo de industrialização
e, conseqüentemente, de normatização.
Desde que a leitura se tornou mais um ato do olho do que do ouvido, as formas de
representação do texto e da imagem, no suporte impresso, vêm sofrendo diversas
transformações. O próprio alfabeto que, a princípio, é uma notação gráfica, captado pelo
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olho e não pelo ouvido, representa a fronteira entre um sistema fonético e um sistema
visual. A leitura acústica sempre foi um ato social envolvendo a participação de muitos.
Uns dos poucos redutos de leitura acústica na sociedade contemporânea é a literatura
infantil. Neste sentido, o livro infantil representa uma estrutura tradicional de leitura
(leitura acústica) num suporte moderno, isto é, o livro pós prensa tipográfica.
O preconceito de uma “literatura menor” aplicado a este gênero infantil ainda existe e,
por vezes, a produção literária infanto-juvenil é denominada de forma pejorativa como
“livrinhos”. Se por um lado existe uma grande quantidade de livros que adotam
fórmulas de enredos simplificados e ilustrações coloridas de forma gratuita, em
contrapartida, a literatura infantil brasileira possui um corpo de artistas - escritores,
ilustradores e designers - e editores que ousam ultrapassar os limites dessas fórmulas
repetitivas.
Nota-se um salto qualitativo, a partir da década de 1970, em relação ao jogo interativo
entre os dois códigos operantes – o texto e as ilustrações – na construção do livro
infantil, com a criação de novos tipos de combinação que provocam uma maior
liberdade formal entre os dois recursos, diz Bahia apud Ferraro. Além disso, vai ocorrer
uma independência cada vez maior do recurso ilustrativo, numa espécie de invasão da
palavra pela imagem. Isto vai levar não apenas a uma extensão quantitativa, a uma
ampliação do espaço ilustrativo, mas a uma extensão qualitativa, preocupada com uma
informação viva que busca soluções estéticas. Com esta ampliação, o texto se reduz, e
até mesmo desaparece, como acontece com o livro de imagem.
O livro de imagem é uma proposta narrativa que estabelece uma auto-crítica da
literatura infantil. A sua existência questiona as clássicas funções de texto, ilustração e
narrativa. A linguagem de outras mídias e os conhecimentos adquirido pelos leitores
mirins em outras formas narrativas são trazidos para o espaço do livro de imagem. O
livro de imagem estabelece outra forma de leitura e fornece uma história aberta.
A noção de que uma história não tem uma única interpretação é essencial para que cada
um aprenda a descobrir, por esforço próprio, uma visão de mundo mais adequada ao seu
universo emocional e cognitivo. O livro infantil contemporâneo é um convite aberto ao
inesgotável trabalho de atribuição de sentido e de interpretação do mundo e da vida.
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Bibliografia
BENJAMIN, Walter. Reflexões a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo. Summus,
1984.
DEBRAY, Régis. Vida e Morte da Imagem: uma história do olhar no ocidente. Petrópolis:
Vozes, 1993.
FERRARO, Mara Rosângela. O livro de imagens e as múltiplas leituras que a criança faz do
seu texto visual. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP.
2001.
ISER, Wolfgang. The Act of Reading. The Johns Hopkins University Press. Baltimore e
London, 1978.
LIMA, Graça. Noite de Cão. São Paulo. Paulinas, 1996.
MELLO, Roger. A Flor do lado de lá. São Paulo. Global Editora., 1999.
OLIVEIRA, Rui de. A Bela e a Fera. São Paulo. FTD, 1998.
Palestra
A Arte de Ilustrar, com Rui de Oliveira, em 27 de outubro de 2005, Sala José de Alencar,
programação da Academia Brasileira de Letras.


COPYRIGHT DEVIDO A RUI DE OLIVEIRA.

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