sexta-feira, 11 de junho de 2010

918 - FEUDALISMO

FD5 (2001) ESPECIAL
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ALEMANHA NA BAIXA IDADE MÉDIA -
FEUDALISMO E CAVALARIA
Klaus Militzer (Ruhr-Universität Bochum)
Este é o texto da palestra proferida pelo Prof. Klaus Militzer na Faculdade de Letras
da UFRJ no dia 4 de setembro de 2000. A produção intelectual de Klaus Militzer é
extensa: mais de 60 artigos e livros, dentre os quais o último Von Akkon zur
Marienburg – Verfassung, Verwaltung und Sozialstruktur des Deutschen Ordens
1190-1309. Titular de História Medieval da Ruhr-Universität Bochum, membro de
diversos institutos e associações de pesquisa em História, Militzer traça no artigo um
quadro das transformações sócio-político-culturais no Império Alemão dos séculos X
ao XIV, detendo-se mais especificamente, nos séculos XII e XIII, cerne daquilo que
foi considerado como o “Renascimento da Idade Média”.
A Baixa Idade Média, a época dos Otões, Sálios e Staufer, do
século X até o início do XIII, conta entre os pontos culminantes da
história do Império Alemão na Idade Média. Este período também
pertence, por conseguinte, a um dos temas preferidos da antiga
historiografia alemã. Falava-se sobre a grandeza do império,
admirava-se os feitos dos soberanos e desfrutava-se um pouco do
brilho dos imperadores medievais. Não posso deixar de ter a
impressão, após a leitura de alguns tratados e livros, de que os autores
julgavam também ter caído sobre eles algo do brilho, que eles tinham
atribuído aos soberanos há muito tempo falecidos. Somente de forma
gradativa impôs-se uma tímida reflexão, que despiu o pathos nacional.
Isto não significa, que os historiadores dos séculos dezenove e vinte não
tivessem apresentado resultados. Muito pelo contrário, diante de
muitas de suas publicações, mantenho o maior respeito. Contudo,
como cada época retrabalha sua história, da mesma forma minha
geração, após a Segunda Guerra Mundial, teve que fazê-lo. Fomos
obrigados a valorar de forma nova a História, procurar abarcá-la em
outros contextos, a fim de chegar, com a ajuda de outros
questionamentos, a novos resultados, e que venham mais depressa ao
encontro de nossos interesses1.
Através de novos questionamentos e métodos de investigação a
Medievística alemã, por exemplo, chegou a uma outra valoração do
papel do rei, em se comparando com o que pode ser lido até hoje nos
1 Cf. as representações in: Gebhardt, Handbuch der deutschen Geschichte, v. 1, org. por Herbert
Grundmann, Stuttgart 19709.
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manuais mais antigos2. Entretanto, isto já é um outro tema, pois
também ao se ocupar com a área que podemos reescrever como
„Feudalismo“ e „Cavalaria“, a Medievística chegou a novos resultados.
Enquanto, antigamente, a manifestação do feudalismo tornara-se uma
arena da história do Direito e ameaçava degenerar-se em um campo de
discussão de formalismos jurídicos3, a discussão modificou-se hoje e
voltou-se para as manifestações sociais, as repercussões políticas e
possibilidades de realização. A discussão gira cada vez mais em torno
da transformação das formas de manifestação feudal no decorrer do
tempo e, por conseguinte, tornou-se também novamente histórica,
assim por dizer, retornou aos quadros de referência da reflexão
histórica e com isso voltou a ser um campo específico dos historiadores,
sem que, ao mesmo tempo, os conhecimentos de história do Direito
tivessem sido totalmente colocados de lado4.
Nós deixamos à parte os primórdios e nos dedicamos ao sistema
feudal desenvolvido, como já tem sido concebido de forma sempre mais
vigorosa desde o século X. O que era o feudalismo? François Louis
Ganshof já fizera a pergunta em 1944 e sobre isso escreveu um livro
muito respeitado e ainda hoje digno de leitura5. Gostaria
expressamente de chamar a atenção do leitor, já que em meu artigo
não pretendo nem posso entrar em todos os detalhes. A partir de
muitas fontes, como também de representações pictóricas, sabemos
como a doação do feudo se processava. Especialmente nítido é o
Sachsenspiegel, um livro de direito do início do século XIII6. Quando
uma relação feudal deveria ser instituída, o vassalo – feudatório do
senhor, o doador do feudo - aproximava-se, ajoelhava-se e colocava
suas mãos nas do senhor feudal. Este envolvia com suas mãos as do
feudatário. Esta era a parte plena de simbologia do ato da
2 Cf. Heinz Thomas in: Lexikon des Mittelalters, v. 5, München und Zürich 1991, p. 1304-1309; Peter
Moraw, in: Deutsche Verwaltungsgeschichte, v. 1, org. por Kurt G. A. Jeserich, Hans Pohl, Georg-
Christoph von Unruh, Stuttgart 1983, p. 31e ss.
3 Cf. as obras de von Heinrich Mitteis, Lehnrecht und Staatsgewalt, Weimar 1933; reimpressão:
Darmstadt 1958; Der Staat des hohen Mittelalters, Weimar 19688.
4 Cf., por exemplo, Otto Brunner, Land und Herrschaft, Wien 19655.
5 François Louis Ganshof, Qu’est-ce que la féodalité, Brüssel 1944; em alemão: Was ist das
Lehnswesen?, Darmstadt 1961. Tradução em português: Que é o Feudalismo?, Lisboa 1959 (citado
conforme a tradução alemã). Sobre isso: Studien zum mittelalterlichren Lehnswesen, org. por Theodor
Mayer (Vorträge und Forschungen 5), Lindau und Konstanz 1960. Cf. também o artigo „Lehnrecht“ de
Karl-Heinz Spieß in: Handwörterbuch zur deutschen Rechtsgeschichte, v. 2, Berlin 1978, p. 1725 e ss.
Aqui encontram-se mais artigos sobre conceitos do direito feudal.
6 Der Sachsenspiegel. Die Heidelberger Handschrift Cod. Pal. Germ 164. Kommentar und Übersetzung
von Walter Koschorrek, neu eingeleitet von Wilfried Werner, Frankfurt am Main 1989. São sempre
abalizadas as edições de Karl August Eckhardt: Sachsenspiegel Landrecht (Germanenrechte Neue Folge:
Land- und Lehnrechtsbücher), Göttingen 1955; Sachsenspiegel Lehnrecht (Monumenta Germaniae
historica: Fontes iuris Germanici antiqui, nova series 1,2), Göttingen 19562.
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commendatio. Este gesto era problemático, pois pertencia
originariamente ao âmbito da servidão. Os servos colocavam-se sob a
proteção do senhor e submetiam-se a ele com este gesto. As antigas
estirpes de soberanos e senhores, que se sentiam iguais aos
imperadores e reis, deveriam ter reservas diante de tais gestos de
submissão. Na realidade, sabemos a respeito da linhagem dos guelfos,
que Eticho, no século IX, abandonara seu filho Henrique, pois aquele
recebera um feudo de Henrique e com isso diminuíra sua posição
social. Eticho recusou-se até o fim de sua vida a se encontrar mais uma
vez com seu filho7. Ele não o considerava mais como seu igual. A
posição de Eticho já não era mais sustentável em sua época. Nenhum
nobre poderia dar-se ao luxo, naqueles dias, de dispensar feudos e com
isso rejeitar o gesto de submissão.
O feudo possuía uma outra importância, pois o arrendamento
estava preso ao gesto. O feudatário recebia alguma coisa do senhor
feudal, na maioria das vezes terras e pessoas, as quais trabalhavam a
terra. Como feudos também podiam ser concedidos impostos
alfandegários ou outros rendimentos. As famílias principescas
representadas no império recebiam seus principados do imperador ou
rei como feudos de estandarte „Fahnenlehen“. Com a entrega de uma
divisa o principado era confiado ao feudatário, isto é, em um ato do
mesmo modo plenamente simbólico. Para efeito jurídico, este
acontecimento devia ocorrer em público, diante de uma platéia mais ou
menos numerosa8. Feudos de estandarte, por conseguinte, eram
frequentemente distribuídos em conselhos imperiais a céu aberto. Eles
possuíam importância para todo o império. Por muito tempo
acreditou-se que o imperador ou o rei eram forçados a conceder os
feudos, em especial os de estandarte. Todavia, as fontes não dão
pretexto para uma tal afirmação. Entretanto, o que é certo é o fato de
que os senhores não conservavam na maioria das vezes por muito
tempo tais feudos em suas mãos, caso os feudos tivessem caído em suas
mãos, já que a linhagem regente na terra fora extinta ou expulsa9.
Contudo, deve-se saber claramente, que os imperadores e reis não
podiam com frequência fazer muito com terras tão grandes. Eles não
dispunham de nenhum corpo administrativo abrangente que lhes
7 Geschichte der Welfen, org. por Alexander Heinz, Essen o. J.2, p. 36 e ss.
8 Bernhard Diestelkamp in: Lexikon des Mittelalters, v. 5, München und Zürich 1991, p. 1808-1811.
9 Hans-Georg Krause in: Lexikon des Mittelalters, v. 5, München und Zürich 1991, p. 1857. Sobre isso,
Karl-Friedrich Krieger, Die Lehnshoheit der deutschen Könige im Spätmittelalter (Untersuchungen zur
deutschen Staats- und Rechtsgeschichte NF 23), Aalen 1979, p. 34 e ss. Hartmut Leppin, Untersuchungen
zum Leihezwang, in: Zeitschrift der Savigny-Stiftung für Rechtsgeschichte, Germanistische Abteilung
105 (1988), p. 239-252. Leppin interpreta o Sachsenspiegel e constata, que existia uma obrigação de
empréstimo para feudos divisionários conforme o Sachsenspiegel.
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obedecesse. Por fim, reis e imperadores foram obrigados a
recompensar seu séquito, caso quisessem uni-los a eles. Desta forma,
nada mais lhes restava a não ser doar mais uma vez os feudos.
Quem recebia o feudo prestava, em seguida à commendatio com a
imposição de mãos, um juramento de fidelidade, pelo qual prometia
servir ao senhor feudal. O serviço consistia especialmente no serviço
militar. Devido ao feudo o vassalo deveria subir na classe social,
manter um cavalo e, como cavaleiro, lutar a cavalo. No caso de feudos
maiores, aquele deveria ser colocado em condições de servir com um
grupo de homens. O número de vassalos era algumas vezes fixado,
contudo podia sempre oscilar conforme a solicitação. Se um vassalo
viesse com muito poucos seguidores, ele sujaria sua própria honra.
Quanto mais extenso fosse o número de seguidores, mais prestigiado
ele seria aos olhos de seus companheiros de nobreza como aos olhos
dos reis e de todos. O rei ainda exigia além dos serviços de guerra a
participação nas viagens à Roma para as coroações imperiais em
Roma pelo papa10. Acrescia-se a isso o dever do vassalo de estar com
seu conselho ao lado do senhor em todas as questões. Além disso,
também poderia ser requerida uma contribuição para o enxoval da
filha do senhor por ocasião de um casamento ou para a libertação do
senhor de um cativeiro. O senhor, por seu lado, também estava
comprometido a acolher o conselho de seus vassalos e protegê-los,
auxiliá-los em juízo ou resgatá-los do cativeiro em caso de guerra. O
vínculo feudal era construído, portanto, sobre reciprocidade. Todavia,
ele somente podia funcionar, se o senhor feudal fosse mais poderoso
que seus vassalos, se, portanto, os vassalos – como anteriormente
temera Eticho – fossem obrigados a se submeter ao seu senhor feudal e
não pudessem negociar de igual para igual11.
Uma dificuldade adentrou o em si simples sistema feudal, no
momento em que também os príncipes eclesiásticos receberam feudos,
também feudos de estandarte e até mesmo lhes sendo transmitido
poder ducal. Especialmente os Otões e os primeiros Sálios, nos séculos
X e XI, contavam com arcebispos, bispos e abades, concediam-lhes
inúmeras propriedades e por isso deles exigiam uma considerável
prestação de serviços, também serviços de guerra. Os príncipes
temporais eram enfeudados com o bastão e o anel, antes de assumirem
suas funções e de receber as ordenações eclesiásticas correspondentes
ou poderem ser introduzidos em suas funções12. Esta prática
10 Sachsenspiegel Lehnrecht (cf. nota 6), p. 23, capítulo 4 § 2.
11 Ganshof (cf. nota 5), p. 25 e ss.
12 Cf. Rudolf Schieffer in: Lexikon des Mittelalters, v. 7, München und Zürich 1995, p. 626-628.
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encontrava uma crescente crítica no século XI. Os reformadores do
círculo do mosteiro de Cluny julgavam a prática como simonia, isto é,
como venalidade da função eclesiástica. Contra a concessão de funções
pelo rei ergueu-se o papa Gregório VII, proveniente do círculo
reformista. O conflito foi conhecido mais tarde pelo nome de questão
das investiduras, atingiu o Império Alemão de forma bastante dura,
mas também conduziu à reformas em outros estados. Um equilíbrio foi
finalmente obtido na assim chamada Concordata de Worms de 1122.
Segundo a mesma, o imperador Henrique V desistia da investidura de
bispos, mas podia ele próprio ou por meios de um representante estar
presente por ocasião da escolha e investia o príncipe eclesiástico antes
da investidura com o cetro. O imperador mantinha assim suas
possibilidades de influência sobre a escolha13.
Os príncipes temporais podiam administrar seus extensos feudos
imperiais exatamente tão pouco quanto os príncipes seculares. Eles
próprios também não podiam prestar serviços de guerra, mas
dependiam de guerreiros seculares. Eles eram, portanto, obrigados a
passar os feudos adiante. Especialmente preferidos pelos grandes do
mundo eram os feudos dos príncipes temporais. Nessa altura surgiu,
porém, uma dificuldade. Na assim chamada hierarquia nobilitária
„Heerschildordnung“, o rei ocupava a ponta, porque ele apenas
concedia feudos sem receber nenhum. Depois dele ocupavam lugar
primeiramente os grandes do mundo. Então vinham os príncipes
temporais, os condes menos importantes etc. até os assim chamados
simples cavaleiros „Einschildritter“, que somente recebiam feudos,
porém não podiam passá-los adiante, já que não estavam em condições
de fazer isso. Se os príncipes recebiam feudos de eclesiásticos, tal fato,
na verdade, conforme a hierarquia nobilitária, teria que rebaixar sua
classe. Isso já devia ter sido sentido por Eticho. Todavia, acordou-se
por fim, que os grandes do mundo podiam receber feudos dos
eclesiásticos sem que isso tivesse efeitos em sua classe. Na hierarquia
nobilitária os príncipes seculares moveram-se para a terceira posição,
atrás dos eclesiásticos, porém eram tidos pelo rei ou imperador como
de mesma posição que os príncipes temporais14. Observa-se, quão
13 Rudolf Schieffer, Die Entstehung des päpstlichen Investiturverbots für den deutschen König (Schriften
der Monumenta Germaniae historica 28), Stuttgart 1981; Investiturstreit und Reichsverfassung, org. von
Josef Fleckenstein (Vorträge und Forschungen 17), Sigmaringen 1973; neste caso, em especial: Peter
Clasen, Das Wormser Konkordat in der deutschen Verfassungsgeschichte, p. 141 e ss. Sobre isso,
também Tilmann Struve in: Lexikon des Mittelalters, v. 5, München und Zürich 1991, p. 479-483
14 Julius Ficker, Vom Heerschilde, Innsbruck 1862; Reimpressão Aalen 1964; cf. Krieger (cf. nota 9), p.
117 e ss. Sobre isso: Deutsches Rechtswörterbuch, v. 5, red. por Otto Gönnenwein e Wilhelm
Weizsäcker, Weimar 1953-1960, p. 530-532; Karl-Friedrich Krieger in: Lexikon des Mittelalters, v. 4,
München und Zürich 1989, Sp. 2007 e ss.
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difícil era também para os contemporâneos edificar um sistema, que
justificasse todas as manifestações da vida15.
Os feudos de eclesiásticos serviam com frequência aos grandes do
mundo para aumentar seus territórios e expandir seu domínio sobre
outras regiões. Por causa desta vantagem todos os senhores deixaram
para trás seus escrúpulos e contentaram-se com o terceiro lugar na
abstrata hierarquia nobilitária, atrás dos príncipes temporais. Seus
interesses em formar um grande território pesaram mais que os
escrúpulos de classe.
O fortemente alinhado sistema feudal, pelo fato dos grandes
também receberem feudos dos eclesiásticos, tomou uma direção, a qual
como eficaz elemento condutor deveria levar à sua dissolução, pois os
príncipes tiveram que prestar um juramento de fidelidade não apenas
ao rei, mas também ao príncipe temporal e estavam comprometidos
para todos os casos tanto com o rei quanto com o bispo. A quem ele
devia seguir, caso se chegasse a um conflito entre rei e arcebispo? Este
conflito poderia e pôde na maioria das vezes ser facilmente resolvido,
porque o rei podia se apoiar não apenas no sistema feudal, como
também em outros direitos, sobre os quais ainda discorreremos. Como
os príncipes tratavam os poucos e restantes vassalos distintos. Eles
tomavam, por fim, feudos de diversos senhores feudais. Todos estavam
presos a um juramento de fidelidade. Porém, como eles deveriam se
comportar em caso de conflito? Que garantias teria o senhor feudal, de
que os serviços a ele prometidos pelos feudos seriam cumpridos? A
constelação do enfeudamento múltiplo permitia aos vassalos poder
decidir como eles queriam se comportar. Ela lhes proporcionava uma
margem de ação, que poderiam utilizar. O senhor feudal, em
contrapartida, não estava mais tão seguro de seus vassalos, como ele
gostaria de esperar e como antigamente com eles lidava16.
No início, o senhor feudal podia proceder de forma rigorosa no
caso de violações contra os deveres de um vassalo e retirar o feudo.
Contudo, no decorrer do século X e especialmente no XI e nos séculos
seguintes entrou no lugar do senhor a justiça feudal, que deveria julgar
as infrações e então pronunciar as sentenças. Entretanto, este tribunal
que não eram tribunais públicos, mas sim instituições do senhor e
pertenciam ao seu campo intrínseco de realização, foram de forma
gradativa cada vez mais ocupados pelos próprios vassalos. O senhor
feudal apenas o presidia. Os vassalos julgavam seus companheiros e
15 A dificuldade também se reflete no direito feudal de Eike von Repgow: Sachsenspiegel Lehnrecht (cf.
nota 6), p. 19, capítulo 1.
16 Pensando totalmente em categorias jurídicas e de direito constitucional e delas se valendo: Mitteis,
Lehnrecht (cf. nota 3), p. 546 e ss.
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proferiam a sentença, a qual o senhor apenas podia mandar cumprir17.
A vontade do senhor feudal era também neste âmbito restringida pelos
vassalos. Da mesma forma, o tribunal feudal assegurava aos vassalos
possibilidades de organização de acordo com seus interesses. Os feudos
múltiplos e o tribunal feudal levaram finalmente a uma emancipação
dos vassalos do senhor feudal. O verdadeiro e sólido vínculo que devia
unir o vassalo ao seu senhor feudal fora, de forma reiterada, afrouxado
e criara para ambas as partes, especialmente, porém, para os vassalos,
um maior campo de ação18.
Os senhores feudais não quiseram aceitar sem luta a evolução.
Em primeiro lugar criava-se na França a „ligesse“. O rei francês exigia
de seus vassalos que lhe servissem desde o princípio e em primeiro
lugar. Caso um juramento não fosse contra o dever de serviço ao rei,
poderia ser prestado, caso contrário o serviço ao rei viria em primeiro
lugar. Esta idéia foi apropriada por outros senhores feudais, que
tentaram aplicá-la para com os seus vassalos. A concepção do vínculo
lígico também foi aproveitada no Império Alemão, porém não pôde ser
implementada. No império, o próprio imperador ou rei não estava em
condições para tanto. A realização de tais concepções era tanto
antigamente quanto hoje em dia uma questão das possibilidades
políticas de implementação, que não existiam no Império Alemão19.
O sistema feudal era seguramente uma pedra basilar, na verdade
uma importante pedra basilar para a implantação e manutenção da
pirâmide social de então. Do rei até ao último e mais simples cavaleiro,
cada nobre ocupava sua posição. Contudo, podia se tornar evidente,
que cada posição respectiva era passível de mobilidade, mas sim que
podia haver movimentos de ascensão e descenso. Algumas famílias
puderam com a ajuda dos feudos ampliar suas posições por
aproveitarem habilmente as possibilidades que se lhe ofereciam,
outras, com pouca sorte, ruíram.
17 Cf. um pouco em Klaus Flink, Territorialbildung und Residenzentwicklung in Kleve, in: Territorium
und Residenz am Niederrhein, org. por Klaus Flink e Wilhelm Janssen (Klever Archiv 14), Kleve 1993,
p. 73 e ss.; Manfred Groten, Zur Entwicklung des Kölner Lehnshofes und der kölnischen Ministerialität
im 13. Jahrhundert, in: Der Tag bei Worringen 5. Juni 1288 (Mitteilungen aus dem Stadtarchiv von Köln
72), Köln Wien 1988, p. 1 e ss..
18 Cf. Ganshof (cf. nota 5), p. 172 e ss. Em posição contrária B. Diestelkamp, Lehnrecht und
spätmittelalterliche Territorien, in: Der deutsche Territorialstaat im 14. Jahrhundert, v. 1, org. por Hans
Patze (Vorträge und Forschungen 13), Sigmaringen 1970, p. 74 e ss., que atenua as afirmações de
Ganshof, mas sem razão. Todavia, tratava-se de uma questão de poder de quem conseguia se impor. Por
fim os senhores territoriais eram em geral mais capazes de se impor, já que dispunham de maiores
instrumentos de poder que os vassalos deles dependentes.
19 Mitteis, Lehnrecht (cf. nota 3), p. 556 e ss.; Ganshof (cf. nota 5), p. 109 e ss. Sobre isso, Volker Henn,
Das ligische Lehnswesen im Westen und Nordwesten des mittelalterlichen Deutschen reiches, Diss. phil.
Bonn, München s. d.
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A posição do rei ou imperador no ápice da pirâmide feudal não
era definida apenas pelo feudalismo20. O rei ou imperador não era
somente o principal senhor feudal, mas muito mais. Na época otoniana
os soberanos eram tidos como investidos e coroados por Deus. Eles
recebiam sua legitimação do próprio Deus e reivindicavam para si um
status temporal. Já que estes eram investidos e coroados por Deus, os
príncipes e eclesiásticos colocavam-se bem abaixo daqueles21. Esta
sobrelevação da realeza, em comparação com a França, retrocedeu,
todavia, no Império Alemão. Pelo fatos dos príncipes e, por fim, de um
determinado número de príncipes eleitores escolherem o soberano,
prevaleceu entre os príncipes e em especial entre os príncipes eleitores
o ponto de vista de que os reis lhes deviam sua eleição e posição22. O rei
foi rebaixado de sua posição superior para o nível dos príncipes e, em
todo caso, era um „primus inter pares“. Alguns príncipes eleitores,
como alguns arcebispos de Mainz, julgavam-se superiores aos reis por
eles escolhidos23.
Não obstante, tanto no Império Alemão quanto em qualquer
lugar na Europa medieval, não era apenas o sistema feudal que
determinava a estrutura da sociedade, como também paralelamente
existia o assim chamado direito da terra, que concorria em parte com o
direito feudal24. Nem tudo estava sujeito ao direito feudal. O
imperador ou rei, por exemplo, concedia direitos judiciais em forma de
transferência de poder senhorial „Bannleihe“, que nada tinha a ver
com o direito feudal. Somente quem obtivesse este poder senhorial do
imperador ou de seu representante poderia decidir sobre vida ou
morte e pronunciar penas físicas25. Estes julgamentos públicos não
eram realizados conforme o direito feudal. Tais julgamentos serviam
frequentemente aos senhores feudais para conformar seu território,
pois estes julgamentos davam aos proprietários um direito legítimo
sobre a população sujeita à mesma justiça. Com o auxílio deste poder
coercivo, os senhores conformaram seus territórios e os mantiveram
20 Georg Droege, Landrecht und Lehnrecht im hohen Mittelalter, Bonn 1969, p. 51 e ss. Cf. também
Helmut Beumann, Zur Entstehung transpersonaler Staatsvorstellungen, in: Das Königtum, org. por
Theodor Mayer (Vorträge und Forschungen 3), Darmstadt 1969, p. 185 e ss..
21 Alain Erlande-Brandenburg, Das Herrscherbild im Mittelalter – Erbe oder Aneignung, in: Krönungen.
Könige in Aachen – Geschichte und Mythos, org. por Mario Kramp, v. 1, Aachen 2000, p. 77 e ss.;
Ursula Nilgen, Herrscherbild und Herrschergenealogie der Stauferzeit, in: idem, p. 357 e ss.
22 Heinrich Mitteis, Die deutsche Königswahl, Darmstadt 1963. Por fim com outra tônica: Armin Wolf,
Die Kurfürsten des Reiches, in: Krönungen, v. 1 (cf. nota 21), p. 87 e ss..
23 Ernst-Dieter Hehl, Die Erzbischöfe von Mainz bei Erhebung, Salbung und Krönung des Königs (10. bis
14. Jahrhundert), in: Krönungen, v. 1 (cf. nota 21), p. 97 e ss..
24 Cf. Droege (cf. nota 20), passim.
25 Hans Hirsch, Die hohe Gerichtsbarkeit im deutschen Mittelalter, 2. edição com um posfácio de
Theodor Mayer, Darmstadt 1958
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sob controle, em todo caso bem mais do que com a ajuda do direito
feudal26. Querelas sobre bens imóveis, que não eram feudos, mas sim
propriedades dos senhores chamadas alódios, subjaziam ao direito
feudal. O empenho dos príncipes e grandes senhores orientava-se por
não permitir em todos os casos possíveis alódios aos seus vassalos, mas
sim transformar seus alódios em propriedades feudais, para deste
modo obter uma maior influência sobre seus vassalos, pois alódios
conferiam ao possuidor um torrão de independência27.
Um outro critério proveio do direito feudal, qual seja, a
diferenciação entre livres e nobres, de um lado e servos do outro.
Todavia, a princípio, esta diferenciação estava pelo menos até aqui
ligada ao direito feudal, quando apenas livres ou nobres, mesmo
aristocratas podiam receber feudos, eram enfeudáveis. Com o decorrer
do tempo os burgueses somaram-se àqueles, aos quais eram
assegurados feudos, mas que não podiam passá-los, em todo caso não
ainda. Na Idade Média Tardia isto também se modificou. Por fim
também houve feudos de camponeses, os quais porém não eram
reputados como feudos de valor integral. Isso pode ser depreendido do
Sachsenspiegel, que alude à inaptidão de camponeses, comerciantes,
eclesiásticos e mulheres para receber feudos, contudo deixa investir aos
camponeses com um lote de terra28.
Não existiam apenas camponeses servos no Império Alemão, mas
também outros servos, que viviam como serviçais na casa do senhor e
realizavam as tarefas ao bel prazer deste último. Como servos, todos
eles estavam inaptos a receberem feudos. Contudo, os imperadores,
reis, outros príncipes e nobres rapidamente reconheceram as
vantagens que se lhes ofereciam, caso se incumbisse a esses servos de
serviços e funções. Nas fontes, tais serviçais são encontrados como
ministeriales. Estes serviçais ou ministeriais eram qualificados de
ministeriais do Império, quando estavam a serviço do Império. Todos
esses serviçais não possuíam nenhum direito a um feudo. Se agraciados
com propriedades, seus senhores poderiam novamente retirá-las deles.
Após a morte do serviçal aquelas voltavam para as mãos do senhor. O
serviçal não podia desposar nenhuma mulher sem a permissão de seu
senhor. Este, na maioria das vezes, apenas dava seu consentimento
para um casamento, se a mulher fosse proveniente de uma de suas
26 Cf., por exemplo, Ernst Klebel, Territorialstaat und Lehen, in: Studien zum mittelaltelrichen
Lehnswesen (cf. nota 5), p. 195-228.
27 Sobre o complexo processo de surgimento dos territórios: Der deutsche Territorialstaat im 14.
Jahrhundert, hrsg. von Hans Patze, 2 volumes (Vorträge und Forschungen 13-14), Sigmaringen 1970-
1971
28 Sachsenspiegel Lehnrecht (cf. nota 6), p. 19 e ss., capítulos 1, 2 § 1-7.
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famílias de ministeriais, pois então os descendentes lhe pertenceriam e
ele não precisaria dividi-los com um outro senhor. Em outros casos,
disposições de grande envergadura, que foram fixadas em documentos
ainda hoje guardados em arquivos, podiam ser frequentemente
tomadas. Já que os ministeriais não podiam legar suas propriedades e
eram dependentes de seus senhores em todos os aspectos, embora
pudessem ser totalmente competentes, os senhores os colocavam na
administração de propriedades, incumbiam-nos de tratar das
cavalariças reais e também deles exigiam serviços de guerra. Os
ministeriais acompanhavam seus senhores às expedições de guerra ou
às já mencionadas viagens dos reis à Roma29.
Apesar dos serviços dos ministeriais, os senhores não podiam
prescindir de seus vassalos livres. Em primeiro lugar, nem todo serviço
podia ser confiado a um ministerial – não ainda. Em segundo lugar,
um senhor não podia prescindir de seus vassalos, porque ele precisava
unir esses homens livres a si, caso não quisesse perdê-los todos e, com
isso, influência. Quando ele perdia vassalos, estes dirigiam-se a um
concorrente pela influência decisiva em uma certa região. Em
consequência disso, o arcebispo de Colônia não pôde, por exemplo,
recusar os feudos aos condes de Jülich, Kleve e outros, pois estes
teriam emigrado para os duques de Brabante. O arcebispo de Colônia
estava de certa maneira em um dilema. Se assegurasse feudos ao conde
de Jülich, fortalecia a posição deste. Deste modo, o conde conseguiu
tornar-se, com o auxílio do arcebispo e às suas custas, um poderoso
senhor de terras. Caso o arcebispo tivesse recusado os feudos, o conde
teria se dirigido célere ao duque de Brabante e retirar-se-ia da esfera
de influência do arcebispo. Os ministeriais, portanto, eram em
determinados casos administradores e encarregados ideais de seus
senhores, porém não podiam substituir totalmente os vassalos30.
Em consequência das importantes tarefas que os ministeriais
realizavam para os seus senhores e em consequência da proximidade à
corte senhorial como centro do poder, seu prestígio cresceu. Eles pouco
se diferenciavam em suas funções dos vassalos livres. Eles
administravam propriedades e receitas. Lutavam a pé ou a cavalo
como nobres ao lado de seus senhores. Sentavam-se na assembléia de
seus senhores e influenciavam as decisões na corte. Já que os
ministeriais encontravam-se mais frequentemente próximos aos seus
29 Cf. Karl Bosl, Die Reichsministerialität der Salier und Staufer, 2 volumes (Schriften der Monumenta
Germaniae historica 10), Stuttgart 1950-1951; em especial v. 1, p. 25 e ss.; v. 2, p. 602 e ss..
30 Cf. Rudolf Schieffer in: Rheinische Geschichte, v. I,3, Düsseldorf 1983, p. 157 e ss.; Wilhelm Janssen,
Die niederrheinischen Territorien im Spätmittelalter. Politische Geschichte und Verfassungsentwicklung
1300-1500, in: Rheinische Vierteljahrsblätter 64 (2000), p. 61 e ss.
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senhores do que os vassalos, sua influência era, com frequência, ainda
mais forte. A proximidade ao senhor, a igualdade de funções e o
crescente prestígio levaram a um movimento de emancipação de
graves consequências sócio-históricas. Os ministeriais, em sua origem
servos, ascenderam e conquistaram na sociedade uma posição igual a
da nobreza31. Eles, por fim, acabaram com todas as limitações no
decorrer do século XII e especialmente no XIII. Adquiriram feudos e
tornaram-se aptos a receberem-nos. Legaram seus feudos e
desposaram nobres mulheres livres. Sentavam-se nos tribunais feudais
ao lado dos nobres livres. Alguns ministeriais do Império conseguiram
até montar seus próprios grandes domínios senhoriais, como os
Bolandos no sudoeste, para citar apenas uma das linhagens mais
importantes32. Ainda mais destacado foi o papel que soube
desempenhar o ministerial do Império Marquard von Anweiler sob o
reinado do imperador Henrique VI e após a morte deste como regente
da Sicília33. Estes e outros ministeriais a eles comparáveis
aparentavam-se com a baixa nobreza livre, como tambem com alguns
senhores feudais, que então eram rebaixados socialmente. Todos estes
grupos formaram, por fim, na Idade Média a assim chamada baixa
nobreza em oposição aos senhores dinásticos de terras provenientes da
nobreza de classe social livre.
Esta ascensão da servidão à liberdade foi favorecida pela idéia da
cavalaria34, um conceito que surgira e se desenvolvera no Ocidente,
especialmente na França, mas foi aproveitada e prosseguida no
Império Alemão pelos nobres e ministeriais. A idéia da cavalaria
abrangia todos os homens que fossem capazes de portar armas, toda a
ordem dos guerreiros e excluía camponeses e eclesiásticos. Um bispo
podia, na verdade, adquirir do rei feudos e concedê-los, mas mesmo
assim não podia se tornar cavaleiro. Por sua parte, tanto o rei quanto o
último dos simples cavaleiros podia se sentir como cavaleiro e
considerar-se como pertencente à ordem da cavalaria. A idéia de
cavaleiros formou-se a partir de uma moral e sentimento de grupo
peculiares dos guerreiros a cavalo. O cavaleiro, „chevalier“,
„caballero“, „cavaleiro“ era o guerreiro a cavalo. Deste destacam-se
31 Bosl (cf. nota 29), v. 1, p. 74 e ss.; v. 2, p. 604 e ss.
32 Idem, v. 1, p. 200 e ss.
33 Idem, v. 2, p. 590 e ss.
34 Maurice Keen, Das Rittertum, München und Zürich 1987. Edição original em inglês: Chivalry, New
Haven und London 1984. Sobre isso, Josef Fleckenstein, Die Entstehung des niederen Adels und das
Rittertum, in: Herrschaft und Stand. Untersuchungen zur Sozialgeschichte im 13. Jahrhundert, org. por
Josef Fleckenstein (Veröffentlichungen des Max-Planck-Instituts für Geschichte 51), Göttingen 1977, p.
17-39. Além disso Das Rittertum im Mittelalter, org. por Arno Borst (Wege der Forschung 349),
Darmstadt 1976.
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primeiramente os senhores nobres de nascimento. Estes eram duques,
condes ou fidalgos. Somente no transcurso do século XI o conceito da
„militia“ abrangeu a todos os homens combatentes a cavalo, aos nobres
de nascimento livre e aos servos ministeriais. No decorrer do século
XII formularam-se determinados regulamentos que deveriam ser
cumpridos. Para ser cavaleiro, este deveria ser armado. Isto acontecia
consoante uma determinada cerimônia, que foi aperfeiçoada com o
decorrer dos tempos e enriquecida com elementos sempre novos35.
Cerimônias eclesiásticas foram especialmente integradas como o jejum
antes da sagração de cavaleiro, a demora em orações, a sagração da
espada, etc.. Isto, porém, foi uma etapa posterior, pois, em sua origem,
a Igreja tinha uma atitude antes cética diante da cavalaria.
Antes de alguém se tornar cavaleiro, era considerado escudeiro e
servia na corte ou em um burgo de um cavaleiro reconhecido36. Muitos
nobres nunca foram armados cavaleiros devido aos custos intrínsecos à
sagração, permanecendo por toda a vida como escudeiros. Este
fenômeno encontra-se especialmente desde o século XII. Com
frequência, porém, os senhores assumiam para os filhos de seus
vassalos e ministeriais os custos da ordenação pela espada e da
armação do cavaleiro, caso eles pudessem armar seus próprios filhos
cavaleiros. Um acontecimento de tal magnitude ocorreu na Páscoa de
1184 diante de Mainz. Lá o imperador Frederico I armou cavaleiros
seus dois filhos, Henrique e Frederico, e com eles um grande número
de outros nobres37. Tais acontecimentos também uniam a casa
senhorial às famílias nobres dependentes e fomentavam vínculos, que
poderiam ser mantidos por gerações.
Com a cavalaria vieram do Ocidente novas formas de jogos de
lutas, os assim chamados torneios, que se desenrolavam conforme
certas regras e serviam à auto-representação dos cavaleiros38. Estes
jogos de lutas também subjaziam a uma evolução. A partir de conflitos
35 Werner Rösener in: Lexikon des Mittelalters, v. 7, München und Zürich 1995, p. 1646 e ss. Além disso
Elsbet Orth, Formen und Funktionen der höfischen Rittererhebung, in: Curialitas. Studien zu Grundfragen
der höfisch-ritterlichen Kultur, org. por Josef Fleckenstein (Veröffentlichungen des Max-Planck-Instituts
für Geschichte 100), Göttingen 1990, p. 128-170; Keen (cf. nota 34), S. 101e ss.
36 Lutz Fenske, Der Knappe: Erziehung und Funktion, in Curialitas (cf. notas 35), p. 55-127.
37 Josef Fleckenstein, Friedrich Barbarossa und das Rittertum. Zur Bedeutung der großen Mainzer
Hoftage von 1184 und 1188, in: Festschrift für Hermann Heimpel zum 70. Geburtstag am 19. Sept. 1971,
v. 2 (Veröffentlichungen des Max-Planck-Instituts für Geschichte 36/II), Göttingen 1972, p. 1023-1041;
Heinz Wolter, Der Mainzer Hoftag von 1184 als politisches Fest, in: Feste und Feiern im Mittelalter, org.
por Detlef Altenburg, Jörg Janut und Hans-Hugo Steinhoff, Sigmaringen 1991, p. 193-199.
38 Das ritterliche Turnier im Mittelalter, org. por Josef Fleckenstein (Veröffentlichungen desMax-Planck-
Instituts für Geschichte 80), Göttingen 1985, com inúmeros artigos ricos em explanações. Além disso
Richard Barber & Juliet Barker, Tournaments. Jousts, Chivalry and Pageants in the Middle Ages,
Woodbridge 1989, com inúmeras estampas.
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desordenados desenvolveu-se uma forma de se medir forças segundo
regras. Os torneios, pensados originariamente como preparação em
caso de necessidade e como exercício com as armas, distanciava-se
sempre mais dos primórdios e tornou-se um fim em si mesmo. Nos
torneios a cavalaria celebrava a si mesmo. Durante o torneio vigia uma
certa igualdade entre os combatentes participantes. Contudo, também
aqui pode se observar, que diferenças de classe eram asseguradas. Um
duque não lutava geralmente com um simples nobre. Quando em 1486
se deveria travar um torneio em Colônia, o imperador Frederico III
proibiu a participação nele de seu filho, Maximiliano. Por trás disso
também havia a preocupação pela saúde do filho, mas da mesma
forma a idéia de que um filho de rei não devia se medir com duques e
condes a ele subordinados39. Tais idéias também estavam disseminadas
nos séculos XI e XII. Estes torneios eram festas da corte, nas quais uma
classe representava para si própria. Expressavam uma cultura nobre e
secular, que contrastava com a eclesiástica e dela se distinguia e, por
conseguinte, encontrava reservas por parte da Igreja40. Todavia, as
proibições eclesiásticas aos torneios não puderam deter a marcha
vitoriosa dos jogos de lutas41, mas sim encontraram plagiadores na
nobreza de todo o ocidente cristão.
Os torneios estavam ligados a outras diversões. À noite ocorria
um banquete, ao qual os senhores ilustres reciprocamente se
convidavam. As iguarias servidas eram abundantes e seletas e
testemunhavam o prestígio do anfitrião. O banquete devia, portanto,
também fortalecer a reputação e a honra do príncipe ou nobre e
consolidá-lo aos olhos dos companheiros de classe42. Geralmente
dançava-se e na dança donzelas nobres, provenientes de conventos
femininos, ocasionalmente tomavam parte43. Contudo, mais
importante é o fato de que tais acontecimentos ofereciam oportunidade
para o canto e a recitação. Todavia, não apenas em tais ocasiões a
palavra era conferida aos poetas. Havia cortes que fomentavam tais
ofertas culturais, como as cortes dos condes de Kleve, do duque
Henrique, o Leão, do landgrave da Turíngia e em especial as cortes do
39 Klaus Militzer, Turniere in Köln, in: Jahrbuch des Kölnischen Geschichtsvereins 64 (1993), p. 37-59;
idem, Turniere in Köln, in: Fasciculi Archaeologiae Historicae 8 (1995), p. 55-65.
40 Keen (cf. nota 34), p. 33 e ss.
41 Sabine Krüger, Das kirchliche Turnierverbot im Mittelalter, in: Das ritterliche Turnier (cf. nota 38), p.
401-422.
42 Sobre a importância das festas, por exemplo: Bernd Schneidmüller, Reichsfürstliches Feiern. Die
Welfen und ihre Feste im 13. Jahrhundert, in: Feste und Feiern (cf. nota 37), p. 165-180.
43 Militzer, Turniere (cf. nota 39), p. 45 e ss.
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rei ou do imperador44. Seguramente os próprios reis e imperadores
como Henrique VI redigiram e recitaram poemas ou mandavam
recitá-los45. Não obstante, eram principalmente membros da
ministerialidade que se apresentavam como trovadores e autores de
poemas épicos. Heinrich von Veldeke, Friedrich von Hausen, Heinrich
von Morungen, Hartmann von Aue, Wolfram von Eschenbach ou
Walter von der Vogelweide, apenas para citar alguns, são para nós
nomes conhecidos, cujas cantigas e poemas podem nos comover, se nós
apenas uma vez nos aproximamos de seu vocabulário e disposição de
idéias46. Contudo, pouco sabemos sobre sua origem e vida. Eles eram
provenientes – talvez com exceção de Hausen47 – da ministerialidade,
deste grupo que, da servidão procurava alcançar a liberdade, que se
apropriou das idéias vindas do oeste e lhes deu formas novas. Ela
continuou a dar forma à idéia da cavalaria e criou uma cultura
secular, que podia concorrer com a eclesiástica. Todavia deve-se
confessar que as obras destes homens eram produtos culturais de
ponta, que nem sempre eram alcançados. Muitas reuniões de nobres
dispensavam estas delicatessen culturais e contentavam-se com a
exibição da posição privilegiada da nobreza nos torneios. Porém, sem a
sobrelevação da vida da nobreza, alocada na idéia da cavalaria, na
qual senhores, ministeriais e simples nobres puderam se encontrar,
teria faltado público para estas realizações culturais. Sem a cavalaria
não teria havido a disposição para escutar e apreciar tais poemas. Não
teria existido o menor ensejo para se apropriar de formas semelhantes
de poesia provenientes do oeste.
A idéia de cavalaria chegou a um certo estágio final, quando o
imperador Frederico II em 1232 proclamou o fim da classe
cavaleiresca48. Doravante somente deveria poder tornar-se cavaleiro e
pertencer à classe dos cavaleiros aquele, cujos antepassados tivessem
pertencido a essa classe. Cavaleiro tornou-se uma designação de classe
de nascimento como conde, duque ou fidalgo. Isto, porém, conduziu à
uma delimitação mais nítida entre as antigas famílias de nobres livres e
44 Joachim Bumke, Höfische Kultur, 2 v., München 1986, entrementes 9ª ed., München 1999; aqui, em
especial: v. 2, p. 638 e ss.
45 Des Minnesangs Frühling, rev. por Carl von Kraus, Stuttgart 196233, p. 42-44. Além disso, Helmut de
Boor, Die höfische Literatur, 11. edição, revista por Ursula Henning (Geschichte der deutschen Literatur
2), München 1991, p. 235 e ss.
46 Cf. de Boor (cf. nota 45), p. 39 e ss., 86 e ss., 237 e ss., 241e ss., 255 e ss., 262 e ss., 277 e ss.
47 Hausen provavelmente descendia da antiga nobreza livre: de Boor (cf. nota 45), p. 241.
48 J.-L.-M. Huillard-Bréholles, Historia diplomatica Friderici secundi, v. 4,1, Paris 1854, p. 163 e ss.
Além disso, Josef Fleckenstein, Zum Problem der Schließung des Ritterstandes, in: Historische
Forschungen für Walter Schlesinger, org. por Helmut Beumann, v. 1, Köln Wien 1974, p. 252-271,
especialmente p. 267 e ss.; Josef Fleckenstein in: Lexikon des Mittelalters, v. 7, München und Zürich
1995, p. 871.
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aquelas, que não pertenciam a esse caso, pois essas procederam da
servidão, da ministerialidade ou não puderam manter sua antiga classe
de nascimento.
A idéia de cavaleiro como vínculo de união entre todos os
membros da classe guerreira permaneceu, contudo, uma ficção. Nem
todos os cavaleiros eram equiparados. Sutis diferenças existiam. A elas
aludimos por ocasião do torneio de Colônia em 148649. Na moderna
pesquisa alemã, menciona-se Karl-Heinz Spieß, destacou-se que as
famílias senhoriais, portanto, as antigas famílias livres, que se
elevaram por sobre a baixa nobreza, na maioria das vezes dispunham
de mais terras e ampliavam seus domínios territoriais, não permitiam
casamentos com a baixa nobreza. Os filhos de tais senhores casavam-se
com as filhas de famílias de classe igual. Em regra, tais senhores
também não davam suas filhas em casamento aos descendentes
oriundos da baixa nobreza50. A antiga diferenciação do direito
territorial entre livre e servo continuou a existir, apenas pouco se
modificou e por fim não pôde ser revogada pela idéia mais abrangente
do cavaleiro cristão.
A sociedade cavaleiresca foi dominada por homens. Os poemas,
especialmente a lírica amorosa, que sobrelevava a mulher51, tinham
muito pouco a ver com a realidade. A imagem cortês da dama era e
permaneceu uma invenção dos poetas, que praticavam seu jogo com
essa mesma figura criada. Os ouvintes também estavam conscientes
disso52. Através de outras fontes, contratos de casamento, crônicas,
decisões jurídicas e afins sabemos que a filha era dada pela família a
um homem e entregue com o casamento ao munt53, isto é, à proteção e
à tutela de seu marido. O marido esperava obediência de sua esposa.
Caso ela não se comportasse como o marido dela esperava, ele poderia
puni-la fisicamente, encarcerá-la ou tentar quebrar sua teimosia de
outra maneira54.
Quando a casa dos Staufer acabou na segunda metade do século
XIII, a sociedade nobre tinha se modificado no Império Alemão. Os
49 Militzer, Turniere (cf. nota 39), p. 42 e ss.
50 Karl-Heinz Spieß, Ständische Abgrenzung und soziale Differenzierung zwischen Hochadel und
Ritteradel im Spätmittelalter, in: Rheinische Vierteljahrsblätter 56 (1992), p. 181-205; do mesmo autor:
Familie und Verwandtschaft im deutschen Hochadel des Spätmittelalters (Vierteljahrschrift für Sozialund
Wirtschaftsgeschichte, Beihefte 111), Stuttgart 1993.
51 Cf. por exemplo de Boor (cf. nota 45), p. 201e ss.
52 Bumke, Höfische Kultur (cf. nota 44), v. 2, p. 453 e ss. Werner Rösener, Die höfische Frau im
Hochmittelalter, in: Curialitas (cf. nota 35), p. 229 e ss. também chamou a atenção sobre a discrepância
entre poesia e realidade.
53 Sobre isso W. Ogris, in: Handwörterbuch zur deutschen Rechtsgeschichte, v. 3, Berlin 1984, p. 750-
761.
54 Sobre isso, especialmente com exemplo convincentes: Spieß, Familie (cf. nota 50), p. 472 e ss.
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ministeriais ascenderam da servidão e uniram-se aos nobres livres,
formando a baixa nobreza. Os senhores permaneceram entre si, ao
lado daqueles e daqueles distinguindo-se. Caso uma família senhorial
não conseguisse conservar sua classe, ela descia para a baixa nobreza,
para o que há inúmeros exemplos, ou extinguia-se, pois seus filhos não
mais encontravam cônjuges de classe correspondente. Também, nesse
cado, podem ser arrolados inúmeros exemplos. O século XII e ainda o
XIII podem ser francamente considerados como os períodos das
famílias que se extinguiram. Isso, por outro lado, levou à concentração
de poder na mão de poucas famílias senhoriais. Na verdade, a idéia da
cavalaria uniu por bom tempo senhores e baixa nobreza, porém não
pôde amalgamá-la em uma classe. A classe dos cavaleiros não era e
nunca foi uma classe homogênea fechada em si. Contudo, a idéia da
cavalaria conduziu a um florescimento de uma cultura secular de
cavaleiros, que claramente contrastava com uma impregnada pelo
meio eclesiástico. Todavia, esta cultura foi cultivada apenas em poucas
cortes e não atingiu, de forma alguma, todos os nobres da mesma
maneira. Porém esta cultura haverá avançado através de contatos
durante os torneios, outras diversões, as cruzadas ou viagens à Roma
até o último rincão do Império Alemão e haverá de deixar resultados,
embora eles ainda possam ter sido diminutos. Estes resultados, porém,
referiam-se apenas ao mundo dos homens. A relação dos sexos um com
o outro mal foi tocada pelo novo espírito. A mulher permaneceu
submissa a seu homem e tinha que obedecê-lo. Apesar disso o Império
Alemão sofrera uma profunda mudança nos séculos, dos Otões até os
Staufer e transformara a sociedade nobre. Ela colocou os reis e
imperadores, após o declínio dos Staufer, diante de novos problemas.
Tradução: Álvaro Alfredo Bragança Júnior
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COPYRIGHT DEVIDO AO AUTOR.

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