segunda-feira, 7 de junho de 2010

612 - IMPÉRIO ROMANO

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Coluna do dia: Quando o esporte funciona como instrumento de alienação
03/02/2010 Por Raphael Machado Silva*

Todo Tirano, seja ele liberal ou marxista, teme o espectro sombrio da possibilidade de revoluções, venham elas das massas ou de elites. Até os primórdios do século XX, a solução para tal possibilidade sempre se fundou na repressão pela força bruta a cada vez que havia a suspeita de dissidência, ou quando se publicava “livros proibidos”, ou quando se fazia discursos públicos de teor “anti-social”, ou quando se praticava qualquer ato que fizesse os Tiranos se sentirem ameaçados.

A ingenuidade dos Tiranos, portanto, foi a causa geradora de inúmeras agitações políticas ao longo dos séculos. A instrumentalidade da Tirania, quando atua de modo visível e direto, quando ela mostra sua face horrenda desavergonhadamente para todos, quando a mesma representa um regozijo aberto da opressão, possui exatamente o efeito contrário do que seria a intenção dos Tiranos. Quando a instrumentalidade da Tirania assim opera, ela endurece os corações dos dissidentes, gera mártires e empurra o apoio popular na direção dos revolucionários.

Com o passar do tempo, porém, vem a experiência. E a experiência ensinou aos Tiranos toda a sorte de sutilezas, diplomacias e lisonjas. Aprenderam, então, que para que uma Tirania se perpetue na história, e afaste completamente o espectro da Revolução, a melhor estratégia de atuação é fazer com que as massas concordem com a permanência da Tirania.

Se nos casos mais primitivos essa concordância se dava pela oferta de segurança frente a alguma ameaça externa, em pouco tempo os Tiranos passaram a adotar novas táticas. A primeira é convencer as massas de que sua escravidão constitui a maior das liberdades. A segunda é a mais eficaz: apaziguar os ímpetos das massas por meio da afluência de objetos materiais e do entretenimento. E é exatamente essa função a que os esportes ocupam na contemporaneidade.

Os antigos romanos, povo muito sábio, já haviam reduzido essa verdade a uma máxima muito conhecida: “panem et circenses”. À época imperial, a agricultura familiar tradicional dos romanos já havia sido esmagada pelos oligarcas, e todas as terras pertenciam a um número muito reduzido de indivíduos, forçando uma enorme massa humana a ocupar a cidade.

Para apaziguar os ânimos e evitar o caos social obviamente causado por tal situação, as massas eram divertidas com fantásticos jogos públicos, realizados em diversos anfiteatros, o mais famoso sendo o Coliseum. Em seu ápice, o Coliseu chegou mesmo a abrigar batalhas navais. As multidões ficavam completamente hipnotizadas pelos jogos, e durante muito tempo eles tiveram a eficácia desejada.

Um dos principais efeitos dos esportes é o de infantilizar as massas, por meio de sua identificação simbólica com equipes ou atletas, os quais simplesmente não se importam minimamente com seus fãs, posto estarem completamente integrados em uma relação industrial fetichista, como commodities, meros produtos geradores de lucros para seus donos.

Assim, as massas idiotizadas por meio de uma identidade artificial são levadas a se submeterem a toda forma de paixões e exaltações por eventos os quais simplesmente não possuem qualquer efeito ou significação efetiva sobre sua realidade pessoal. As massas chegam a ser levadas mesmo à violência física por conta de pseudo-rivalidades construídas por ricos “cartolas” e pela propaganda midiática.

Um hilário exemplo histórico ocorreu no Império Bizantino, quando houve uma autêntica revolta popular porque o ‘time vermelho’ havia vencido o ‘time verde’ na corrida de bigas, ou vice-versa. Quem se importa? Interessantemente, é um caso em que “o tiro saiu pela culatra”, afinal, aparentemente até o desporto pode gerar suficiente insatisfação a ponto de causar revoluções.

Todo o dispêndio de energia gera exaustão. E é exatamente isso o que ocorre às massas por meio da sacralização do esporte, e sua transformação em entretenimento. As massas são exauridas intelectual e emocionalmente. Assim, são nulificadas as potências revolucionárias que poderiam derivar dos ímpetos e paixões dos homens, caso essas fossem dirigidas à política e ao pensamento. A facticidade da referida afirmação pode ser verificada por uma singela análise de qual a importância dada pelas massas ao esporte e à política em suas vidas pessoais.

Colocando em termos mais simples, as massas são simplesmente distraídas pelos esportes, para que elas não prestem atenção e nem deem tanta importância aos eventos políticos, econômicos e sociais de sua pátria, todos os quais sempre as afetam. Justifica-se pateticamente a atenção dada aos esportes (ao futebol, por exemplo) com a falácia do “povo sofrido”. O “povo brasileiro”, por ser “sofrido”, deve ter suas dores e tristezas anestesiadas pela panacéia da histeria coletiva do esporte?

Pois é exatamente essa anestesia, assim como a exaltação do prazer lascivo e da materialidade em geral, que ao afastar o homem do sofrimento, o afasta da consciência da necessidade de tomar nas próprias mãos as rédeas de seu destino político, e de derrubar das alturas todas as Tiranias que o esmagam e subjugam na pior das misérias: a Miséria do Não-Pensamento.

Não se trata aqui de desvalorização do esporte como atividade física ou da vontade natural do humano de pertencer a um grupo que pode, muito bem, ser representado pelos torcedores de um “time”. O que se quer ressaltar é o quanto prejudicial é o fanatismo e valorização, por exemplo, de um “clube de futebol” em detrimento do próprio futuro e da própria família. O quanto é nocivo o fato de serem preferidas mesas redondas sobre futebol em comparação com as que discutem a política mundial e nacional, a economia e a sociedade. O quanto é condenável que se deixe um debate filosófico por conta de um debate a respeito de qual jogador atua melhor na posição de ponta-esquerda.

Que caiam todos os disfarces com que são enfeitadas as desgraças, e que o homem encare de frente o próprio sofrimento. Aí então, os que tiverem valor tornar-se-ão livres.

*Raphael Machado Silva, excepcionalmente escrevendo em uma quarta, é colunista do Perspectiva Política às terças.

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Seções: Raphael M. Silva

Palavras-Chave: 14. História Alienação Artificialidade Autoritarismo Ciência Política Coliseu Entretenimento Esporte Futebol Ideologia Império Bizantino Império Romano Liberalismo Marxismo Opressão Pão e Circo Política Repressão Revolução Rivalidade Tirania

Coluna do dia: Alemanha morta e ressuscitada – A queda do Muro de Berlim
10/11/2009 Por Raphael Machado Silva*

Foram celebrados, no último dia 9, os 20 anos da queda do Muro de Berlim, o qual dividia a Alemanha em duas metades: a República Federal Alemã, capitalista, e a República Democrática Alemã, comunista. Tal evento foi e é considerado como o mais simbólico, o mais representativo, do fim da Guerra Fria.

Segundo relatos dos presentes, o evento se deu quase que de modo absolutamente espontâneo, inexplicável, mágico. De um dia para o outro, sem qualquer razão evidente, toda a Alemanha estava transformada. Ou melhor, a Alemanha havia voltado a existir de verdade.

A Alemanha, aqui entendida também como o conjunto dos povos germânicos, ou seja, como Nação e não só como Estado, tem sido por muitos considerada o terceiro pilar da civilização Ocidental. A chama da civilização Ocidental foi acesa pelos gregos, passada aos romanos e herdada pelos povos alemães.

Toda a história Ocidental após Roma é uma história com um substrato eminentemente germânico. A partir da fusão entre as etnias e culturas germânicas com a herança greco-romana, com a conclusão das Migrações Germânicas que puseram fim ao já decrépito Império Romano, ergueram-se as bases de todo o futuro da Europa.

O Cristianismo após as Invasões é diferente do Cristianismo Primitivo, muito mais próximo ao Judaísmo, posto que foi ‘paganizado’ de modo a possibilitar a conversão das tribos germânicas e eslavas. Alguns teólogos ortodoxos, reconhecendo isso, também chamam o Catolicismo de ‘Cristianismo Germânico’.

Mesmo a estrutura etno-racial dos povos europeus foi alterada com as migrações germânicas. Onde se estabeleceram, nas velhas províncias imperiais, os germânicos se misturaram à aristocracia romana, servindo como base para a futura nobreza feudal. Da Alemanha também vieram as principais contribuições para a Música e para a Filosofia ao longo da História da Humanidade: Beethoven, Bach, Mozart, Händel, Wagner… Kant, Hegel, Schopenhauer, Nietzsche, Heidegger… São todos filhos da Germânia, e são grande parte do ápice da Cultura Ocidental.

Ao mesmo tempo, falar da Alemanha e de seu povo é falar de uma das Nações mais odiadas, vilanizadas, vilipendiadas e, sim, perseguidas do século XX. Um ódio esse que se deriva muito da inveja de anglo-saxões e alguns outros povos, surgido nos fins do século XIX.

A unificação da Alemanha criou o único rival à altura da Grã-Bretanha, e a imediata industrialização realizada por Bismarck foi tão eficaz que em três décadas a Alemanha fez o que a Grã-Bretanha havia feito em um século e meio, e já produzia com qualidade superior aos britânicos.

Quando a França Napoleônica fez o mesmo preteritamente, e apareceu como rival da Inglaterra, como potência européia continental, a brilhante diplomacia inglesa moveu o mundo contra a França. Em verdade, a chave dos mistérios da maior parte dos conflitos europeus dos séculos XIX e XX é o entendimento da linha programática e dos objetivos da política externa inglesa dessa época. O aspecto euro-continental dessa estratégia se fundava na necessidade de não permitir o surgimento de qualquer potência continental européia. Aí está a razão pela qual, em distintas guerras, a Inglaterra se aliou a diferentes Estados, às vezes contra Estados anteriormente aliados. A Inglaterra sempre foi inimiga e algoz das Nações européias que almejassem se elevar em poder.

Assim, a Grã-Bretanha, o país mais beligerante, devastador e sem dúvida um dos mais genocidas dos últimos três séculos, buscou e buscou insistentemente e finalmente conseguiu impor à Alemanha, em 1914, uma Guerra Mundial, sob uma chuva de propagandismos de tablóide, com direito à acusações de que os alemães tinham soldados que praticavam canibalismo com crianças belgas e de que transformavam cadáveres em combustível.

Traída internamente a Alemanha por comunistas, derrubada a sagrada monarquia, ordenada a rendição, fez-se a vontade dos banqueiros e o país foi reduzido a escombros. Primeiro, se impôs um bloqueio marítimo, impedindo que a Alemanha se abastecesse de alimentos: morreram centenas de milhares. A seguir, veio o “Ditado” de Versalhes, no qual roubou-se um pedaço de quase metade do território da Alemanha, o qual foi dado, junto com sua população, à Polônia. Exigiu-se o desarmamento da Alemanha como pré-condição do desarmamento geral.

Desarmada a Alemanha, os vencedores descumpriram o acordo. Sugerido no Parlamento austríaco um plebiscito a respeito da unificação entre Alemanha e Áustria, algo intimamente desejado por ambos povos (que são um só), ameaçou-se ambos de nova aniquilação total. Roubou-se todas as reservas em metais preciosos, principalmente ouro, ao mesmo tempo que se exigiu da Alemanha reparações titânicas por uma Guerra cujas origens remontam à decisões tomadas em Londres, não em Berlim.

Não fosse o ressentimento, o ódio, a inveja e toda uma gama de outros sentimentos absolutamente irracionais contra os alemães que culminaram no “Ditado” de Versalhes e em 15 anos da mais abjeta escravidão de seu povo, a Segunda Guerra Mundial jamais teria acontecido. Tivesse ainda acontecido, todo o modo de condução da mesma teria sido diferente, porque os alemães não haviam se esquecido das centenas de milhares que morriam de fome nas ruas e dos milhões de desempregados. Isso não exime a Alemanha nazista de culpas, mas explica em grande parte os porquês de sua existência.

Nos momentos finais da Segunda Guerra surgiu ressentimento e ódio germanofílico ainda mais forte. Não satisfeitos com o pós-Primeira Guerra, queria-se mais. O povo alemão, principalmente a parcela que nada tinha a ver com a cúpula hitlerista, era visto como um povo mal, um povo beligerante, um povo intrinsecamente maligno, que havia causado duas Grandes Guerras e, portanto, era o responsável pela morte de dezenas de milhões.

Esse povo precisava ser punido, esmagado, destruído. Precisava-se garantir que esse Mal Absoluto jamais ressurgiria, ou seja, precisava-se garantir que não haveria qualquer oposição às maquinações diabólicas de Londres/Nova Iorque e Moscou. Não poderia mais haver oposição aos banqueiros internacionais e ao sistema econômico fundado na usura (para quem não sabe, a Revolução Russa foi financiada por Bancos, o que é demonstrado no livro ‘Wall Street and the Russian Revolution’).

O Plano Morgenthau, apresentado a Roosevelt e seriamente debatido entre os vencedores, previa o extermínio completo da população alemã por meio da esterilização gradual dos homens, da imigração de outras populações e da repartição dos territórios alemães entre todos os seus vizinhos. Venceu uma razoabilidade mínima e o Plano foi parcialmente rejeitado. Sugeriu-se, então, que o extermínio recaísse apenas sob um certo percentual de alemães, os quais deveriam ser julgados em tribunais de linchamento pelos vitoriosos com a sentença já definida previamente (ainda hoje, geriatras com mais de 90 anos são perseguidos pelo ódio anti-alemão).

Milhões de civis alemães foram também colocados em campos de concentração aliados para realizarem trabalho escravo, satisfazendo assim uma injustificável sanha vingativa dos Aliados, com a morte de quase 1 milhão de alemães. Erros não justificam outros.

Satisfez-se a gula e sede de sangue diabólica de Stálin entregando-lhe metade da Europa, apesar dos pedidos desesperados de vários generais americanos, em 1945, para que o Presidente Truman reconhecesse o governo alemão do Almirante Doenitz, autorizasse uma aliança com a Alemanha e declarasse guerra à URSS, cujas hordas vermelhas estavam absolutamente exaustas e enfraquecidas pela guerra no Fronte Oriental e que nessa época ainda não possuía armas nucleares.

Como se sabe, venceram as intrigas, a razão foi derrotada. Dezenas de milhões foram submetidos a uma tirania ainda pior do que qualquer que pudesse ter sido estabelecida pelos alemães. Entregou-se os que haviam se rebelado contra a tirania soviética ao longo da guerra, como os soldados cossacos com suas famílias, para que os mesmos fossem exterminados por Stalin.

Enfim, a Alemanha foi repartida entre os vencedores. O Muro de Berlim foi o muro do ódio. Não do ódio entre capitalistas e comunistas, os quais não se odeiam de verdade nos postos de liderança (haja vista a facilidade com que Comissários viram banqueiros e empresários, e vice-versa, com uma simples mudança de regime), mas apenas entre militantes; mas sim do ódio contra a Alemanha. Dividiu-se a Alemanha com vistas a que ela nunca se reunificasse, nunca se recuperasse, nunca mais resistisse às tiranias vindas da América e da Rússia.

Assim, Heidegger, o maior filósofo do século XX, justificou seu apoio à Alemanha do III Reich: a Alemanha, para ele, era a única coisa que se interpunha no caminho do domínio imperialista total das potências materialistas e desenraizadas, fundadas no Iluminismo, as quais instrumentalizavam sua dominação pela coisificação do homem operada por meio de sua ‘fagocitação’ na técnica (tanto o homem-massa-proletário do comunismo, como o ‘homo oeconomicus’ do capitalismo, mero objeto desumanizado inserido em um mercado são, em essência, idênticos).

Pois realizou-se o que Heidegger temia, dividiu-se o mundo em duas partes, ambas submetidas a abjetas tiranias. Já os alemães foram todos ‘desgermanizados’ culturalmente; metade dos alemães viraram americanos, a outra metade soviéticos.

A(s) Alemanha(s) das últimas décadas foi um país em que se sentia vergonha de se pertencer a ele. Os hinos nunca eram cantados, a bandeira nunca era hasteada. Quando alguém dizia a outro europeu que era alemão, o fazia com um misto de culpa e vergonha. Não há prática mais baixa, vil, mesquinha e ‘plebéia’’ como diria Nietzsche, do que impingir o sentimento de ‘culpa’ sobre os outros.

No caso da Alemanha, a ‘Culpa’ virou símbolo nacional. Uma espécie de ‘coroa de espinhos’, que os alemães ignominiosamente se regozijavam em portar.

Mas o domínio do ódio não pode durar para sempre. O ódio não acabou, mas o povo alemão deu o passo no sentido de retomar as rédeas de direção do próprio Destino. Um passo talvez frágil, mas ainda assim significativo por seu rico simbolismo.

Demonstração de uma pretensa superioridade do Capitalismo? Ora, superioridade não se demonstra por uma mera sobrevivência no tempo, mas pelos valores intrínsecos de uma Idéia e pelos seus efeitos no Mundo. Vitória parcial do Povo Alemão, que se libertou de uma tirania, caindo na talvez mais desumanizadora tirania do Mercado.

Caiu o Muro. Morreu o Comunismo. Falta à Alemanha tentar ser uma nação unida, livre de dualidades e com identidade própria, que tem o direito e o dever de reivindicar os louros que merece pelo que seu povo sofrido, esse sempre vítima, produz.

* Raphael Machado Silva é colunista do Perspectiva Política às terças.

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Seções: Raphael M. Silva

Palavras-Chave: 14. História Alemanha Áustria Bach Beethoven Berlim Bismarck Capitalismo Comunismo Cristianismo Cultura Ditado de Versalhes Eslavos Europa França Germânicos Grã-Bretanha Guerra Fria Harry Truman Hegel Heidegger Händel Império Romano Inglaterra Josef Stalin Judaísmo Kant Morgenthau Mozart Muro de Berlim Nietzsche Ocidente Polônia Povos Germânicos RDA República Democrática Alemã República Federal Alemã RFA Roma Rússia Schopenhauer Segunda Guerra Mundial Stalin Tratado de Versalhes Truman União Soviética URSS Versalhes Wagner

Coluna do dia: A Irlanda e a defesa do Ocidente
12/05/2009 Por Raphael Machado Silva*

Século 5 depois de Cristo. Após séculos de lenta, porém constante e óbvia decadência e degeneração, o Império Romano jaz agonizante, como uma velha inchada e pútrida, repleta de pus e gangrena. A aristocracia dos patrícios, fundadores de Roma, homens em sua maioria geniais, honrados, férreos e impiedosos, em suma, feitos da matéria-prima a partir da qual grandes civilizações são feitas, está praticamente extinta. Em seu lugar se revezam tiranos, muitos dos quais jamais puseram seus pés na Cidade das Sete Colinas. Como déspotas egípcios ou persas, os imperadores demandam genuflexões e consideram a si mesmos como deuses vivos.

Abaixo deles, governa uma burocracia onipresente e praticamente onipotente, inchada como uma rã, composta por eunucos efeminados de sangue bárbaro, que causariam rubores aos velhos estóicos. Por trás dos panos, banqueiros e usurários manipulam a economia e o comércio de modo a acumular cada vez mais riquezas e poder. Até os imperadores e bispos estão endividados.

As legiões estão “sucateadas” e espalhadas em um espaço tão extenso, que sua eficácia defensiva é praticamente nula. Não sendo tudo isso suficiente, o Império em um arroubo de humanismo e piedade cristã, convida os bárbaros a ocuparem as terras fronteiriças do Império, para realizar trabalhos que, supostamente, romano nenhum quer ou pode.

Que distância da Roma de Brutus, Cícero e Catão, ou mesmo de Caio Mário, Júlio César e Augusto! Mas, estarão perdidos os tesouros filosóficos e literários do mundo greco-romano?

Não. Em uma ilha distante, terra de São Patrício, de druidas insanos, de trevos, de duendes e de potes de ouro escondidos no fim dos arco-íris, monges copistas guardam e registram os tesouros dos Pais do Ocidente. Quando findarem as invasões bárbaras e surgirem os reinos germânicos, essas obras passarão de mosteiro a mosteiro, se espalhando por todo o continente europeu. Assim, os irlandeses salvarão o Ocidente de permanecer afogado nas trevas.

O momento agora é outro. Século XXI. Aqueles poucos seres pensantes que não se deixam enfeitiçar facilmente por sereias sofistas entoando palavras sedutoras, riem da crença ridícula e relativamente recente no progresso histórico linear. Assim, é com a serenidade das águias que sobrevoam os picos mais altos, e com um leve sorriso de quem sabe que tudo histórico não passa de um “déjà vu”, que se pode hoje olhar para a posição que ocupa a Irlanda diante da possibilidade de um novo mergulhar do Ocidente nas trevas da ignomínia e da devastação total.

Há tiranos a conspirar em Bruxelas. Eles conspiram pelos mesmos motivos que conspiraram todos os tiranos da história: riquezas e poder. Estão eles servindo apenas a si mesmo ou a outros homens, ocultos por trás da cortina do espetáculo? Não sei e não me importo. Eles simulam muito bem os “tiques” democráticos, até o momento em que a população rejeita claramente seus ímpetos tirânicos. Ou não sabeis que, por exemplo, o povo português rejeitou abertamente o novo Acordo Ortográfico, mas que essa vontade foi simplesmente atropelada pelos abomináveis instintos bestiais de integracionismo e desintegração das Identidades Nacionais? Assim como o povo irlandês, cheio de bravura e orgulho, rejeitou o Tratado de Lisboa e atrasou a implantação do projeto Orwelliano dos tiranos de Bruxelas! Qual foi a reação dos tiranos? “Não aceitamos essa decisão. Queremos um novo referendo. E é melhor o governo irlandês dar um jeito nisso. Senão…”

Ah! E quão ocidental é nossa mídia, não? Aparentemente, o Tratado de Lisboa segundo todos os jornais e revistas que podem ser comprados em bancas de jornal, é ‘apenas uma tentativa de estruturar melhor a União Européia, de modo a tornar mais eficientes suas instituições.’ Ah! Mas a quem serve esses meios midiáticos? Servirão aos povos e sua história? Servirão aos ideais civilizacionais? Servirão às culturas tradicionais? Ou servirão ao capital, que desconhece e abomina toda forma de lealdade identitária, como nacionalidade e religião, e que almeja apenas expandir a si mesmo, como um câncer que a tudo devora? E quem fica mais feliz com o fortalecimento da União Européia, se não os sultões, sheiks e marajás do capital internacional, que sabem que a interposição de diversas camadas de decisão entre o povo e o ápice da pirâmide, serve muito para ocultar coisas como a importação maciça de mão-de-obra imigrante com a finalidade de baratear os custos de produção e eventualmente substituir a população nativa européia por uma mais dócil e fácil de controlar?

Que os irlandeses rejeitem novamente esse ignominioso Tratado no referendo que se aproxima. E que novamente, salvem o Ocidente da degeneração que nós mesmos causamos.

* Raphael Machado Silva é colunista do Perspectiva Política às terças.

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Seções: Raphael M. Silva

Palavras-Chave: 14. História Acordo Ortográfico Blocos Econoômicos Bruxelas Capital Capitalismo Cultura Identidade Nacional Império Romano Imprensa Irlanda Mídia Nacionalismo Ocidente Política Política Internacional Relações Internacionais Roma Tratado de Lisboa União Européia

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