segunda-feira, 16 de abril de 2012

ROLIM DE MOURA

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MEMÓRIAS

Pedro Rocha Jucá

OS DIVERSOS CAMINHOS ATÉ CUIABÁ.



Localizada no centro da América do Sul, entre o Pantanal , a Amazônia e os Cerrados, Cuiabá tem hoje uma posição geográfica das mais privilegiadas, mas no passado pagou um alto preço por ser distante. Além disto, os interesses coloniais portugueses no continente sul-americano levaram para Vila Bela o centro da ação administrativa da nascente Capitania de Mato Grosso, transformando as fronteiras espanholas num inconcebível marco divisório da civilização naquela época. Mas Cuiabá, a primeira vila real do Centro-Oeste, sempre foi um outro marco, o da ocupação do interior brasileiro, a despeito das adversidades que enfrentou desde a sua descoberta.Os diversos caminhos até Cuiabá surgiram por etapas, durante séculos.

Quando Bartolomeu Bueno da Silva, o "Anhangüera" - o diabo velho que podia secar os rios, penetrou os até então desconhecidos sertões existentes a Noroeste de Sorocaba em 1682, acompanhado de vários bandeirantes paulistas, e encontrou ouro e pedras preciosas, jamais imaginou que daria origem à lenda da Serra dos Martírios (devido à configuração do relevo local). E nem que essa lenda, ainda não confirmada, motivaria a criação de duas grandes Capitanias, a de Mato Grosso e a de Goiás, graças ao retorno de dois jovens que participaram da sua expedição e que jamais esqueceram os motivos da lenda: o segundo Bartolomeu Bueno da Silva e Antônio Pires de Campos, o descobridor de Cuiabá, filhos daqueles arrojados bandeirantes do Século XVII, que morreram sem conhecer a riqueza.

Antônio Pires de Campos preferiu o caminho das águas, no período das monções, e não aquele de terra usado pelos seus predecessores. Ele localizava a Serra dos Martírios na região do Rio Araguaia, que assim descrevia: "...Seguindo pelo mesmo abaixo, se avistam uns morros azuis, e nestes acharam a tapera dos Araés, onde chegamos com meu pai, que Deus haja, e achamos várias cunhãs com folhetas pelo pescoço e braços, e desta folhetas mandou meu pai fazer um resplendor para a sua virgem, e também uma coroa do mesmo ouro, que pesa quarenta e tantas oitavas, para a Virgem Senhora do Carmo do Hospício de Itú. E, perguntando aos ditos índios aonde tinham achado aquelas folhetas, respondeu o cacique que foi naqueles morros depois da chuva. Isto foi o que vi, e não foram cousas contadas. Na volta que fizemos nos encontramos com o pai do capitão-mor Bartolomeu Bueno (da Silva), e ouvindo a meu pai todo o referido..." Ele navegou, então, pelos rios Tietê, Paraná, Anhanduí e Pardo e, carregando pesados batelões nas costas, atravessou os Campos das Vacarias até o Rio Meteteu, dele passando para o Rio Paraguai, para atingir o Rio Cuiabá, então desconhecido, e subiu até à foz do Rio Coxipó, também nunca navegado. Vendo o erro do seu roteiro, ele deixou o Arraial de São Gonçalo e desceu o Rio Cuiabá, quando se encontrou com a bandeira comandada pelo sorocabano Pascoal Moreira Cabral, que buscava índios para aprisionar, e lhe orientou a direção do arraial que havia montado em Cuiabá. Antônio Pires de Campos conseguiu voltar à região do Araguaia, atravessando não se sabe como o divisor de águas, mas nunca encontrou as suas sonhadas minas. O descobridor de Cuiabá reaparece mais tarde combatendo os índios Caiapós. Por sua vez, Pascoal Moreira Cabral que jamais sonhou em fundar uma cidade tão importante como Cuiabá, ali encontrou as mais ricas lavras de ouro do Brasil colônia no início do Século XVIII.

Bartolomeu Bueno da Silva (o filho), depois de também procurar a lendária Serra dos Martírios com o seu contemporâneo Antônio Pires de Campos, fixou-se nas minas onde surgiria o Arraial de Sant'Ana, em 1728, depois Vila Boa (25/07/1746) e hoje cidade de Goiás, e futura Capital da Capitania de Goiás. Embora tendo chegado ao posto de superintendente e guarda-mor das Minas de Goiás, ele morreu pobre no dia 19/09/1740, com pouco mais de 70 anos. Eles dois aumentaram os limites do Brasil Colônia e não foram reconhecidos em vida pela Coroa Portuguesa. Contudo, tiveram o mesmo sonho: as riquêzas imensas de uma Serra dos Martírios que ainda continua sendo apenas uma lenda.

A partir de 1725, o caminho das águas ficou mais rápido e mais confortável, com um segundo trajeto monçoeiro: os mesmos rios Tietê, Paraná e Pardo, percorrendo os rios Miranda e Sanguessuga, com uma travessia por terra pelo Varadouro de Camapuã, atingindo os rios Coxim e Taquari, para novamente chegar aos rios Paraguai e Cuiabá. Em Camapuã eles plantavam os cereais para a segunda etapa, reduzindo os apetrechos de viagem. Porém, surgiu um novo problema: os índios Caiapós, Paiaguás e Guicarurús tudo fizeram para impedir o percurso das bandeiras paulistas por ali até o Século XIX, quando não tinham mais forças para enfrentar o avanço da civilização portuguesa.

Cuiabá tornou-se, em pouco tempo, o principal polo para o avanço do povoamento em direção do interior do Brasil. No dia 16/11/1726, o capitão-general de São Paulo, Dom Rodrigo César de Menezes, chegou a Cuiabá depois de quatro meses de viagem. Estava acompanhado de uma expedição, jamais vista na época, formada por cerca de 3.000 pessoas, embarcadas em 300 canoas. Veio instalar, com autorização de Lisboa, no dia 01/01/1727, a Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, que tinha "oito ou nove casas de telha", conforme o cronista Joseph Barboza de Sá. Ainda usando o segundo trajeto monçoeiro, o governante paulista deixou Cuiabá no dia 04/06/1728. Qualquer viagem de ou para Cuiabá, era uma aventura.

Os primeiros povoados de Goiás tiveram ligação terrestre, embora precária, com São Paulo. A Carta Régia de 10/01/1730 determinou que houvesse apenas um caminho de terra entre Goiás e as vilas paulistas, para melhor fiscalização e cobrança do direito das entradas. Embora o avô e o pai, com o mesmo nome, tenham morrido pobres, o neto de "Anhagüera" recebeu uma recompensa da Rainha D. Mariana. Pela Carta Régia de 18/05/1746, o terceiro Bartolomeu Bueno da Silva arrecadava os rendimentos das passagens dos rios Jaguari, Atibaia, rio Grande, das Velhas e Corumbá.

A Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá ainda continuava isolada. No dia 04/08/1746, com seis canoas grandes, tripuladas por 50 pessoas (32, escravos seus), o sargento-mor João de Souza Azevedo iniciou na Cachoeira Grande, no Rio Jauru, a primeira viagem fluvial de Mato Grosso ao Pará. Subiu o Rio Paraguai até o Rio Sepotúba e dai percorreu a pé 18 quilômetros, com as canoas nos ombros, durante 50 dias. No dia 26/10/1746 ele chegou às águas do Rio Sumidouro, passou para o Rio Arinos, e através do Rio Tapajós chegou a Belém. Três anos depois ele regressou a Mato Grosso, navegando pelo Rio Madeira.

Pelo Alvará de 09/05/1748, Dom João V criou as Capitanias de Mato Grosso e Goiás, subordinando as Comarcas de São Paulo e Paranaguá à Capitania do Rio de Janeiro. Por isto, o soberano português determinou ao governador Luiz de Mascarenhas, de São Paulo, a se recolher "para o Reino na primeira frota". Não havia, exatamente, um limite territorial entre as duas novas Capitanias, pois o citado alvará foi omisso a respeito: "... e os confins do Governo de Mato Grosso e Cuiabá hão de ser para a parte de São Paulo pelo dito Rio Grande (Paraná) e pelo que respeita à sua confrontação com os Governos de Goiás e Maranhão, vista a pouca notícia que ainda há daqueles sertões, tenho determinado se ordene a cada um dos novos governadores, e também ao do Maranhão, informem por onde poderá determinar-se mais cômoda e naturalmente a divisão".

Um grupo liderado por Francisco Rossi Colombina tentou abrir um caminho de terra de São Paulo para Cuiabá, passando pela Capital de Goiás, Vila Boa, e requereram privilégio de receber os rendimentos de uso por dez anos, além de uma sesmaria de três em três léguas em toda a extensão dessa estrada. Uma Provisão de 06/12/1750 concedeu os direitos requeridos, porém o projeto nunca foi executado por falta de recursos financeiros. A criação da Capitania de Goiás visava o controle mais efetivo das extração mineral, principalmente dos diamantes do Serro Frio. O contrabando de ouro e outros minerais era feito em larga escala e não interessava ao governo colonial facilitar os meios de transporte.

No dia 12/01/1751, foi recebido com todas as pompas da época o primeiro capitão-general de Mato Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura, que assumiu cinco dias depois. Uma de suas missões era instalar no Distrito de Mato Grosso, onde seria fundada Vila Bela, a "cabeça do governo". Veio, ainda, pelo trajeto das monções, sofrendo todos os tradicionais incômodos, depois de cinco meses e sete dias de viagem. Ele foi nomeado por Dom João V no dia 20/07/1748, mas chegou ao Brasil no dia 01/04/1750, quando se dirigiu a Parati a fim de conferenciar com o capitão-general do Rio de Janeiro, Dom Gomes Freire de Andrade, que respondia interinamente pela Capitania de Mato Grosso, onde nunca esteve e nem pensou nisto. Depois de descansar por alguns dias em Porto Feliz, Araritaguaba, ele seguiu viagem para Cuiabá no dia 05/08/1750, acompanhado de uma comitiva de 190 homens, que viajavam em 24 canoas.

Tomadas as primeiras providências administrativas para o bom funcionamento da Capitania de Mato Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura saiu de Cuiabá no dia 03/11/1751 para, finalmente, fundar no dia 19/03/1752 a segunda Capital da Capitania de Mato Grosso, Vila Bela da Santíssima Trindade, na margem direita do Rio Guaporé. A Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá continuava com a maior população da Capitania e Vila Bela era o seu segundo núcleo urbano. A nova Capital poderia ter uma grande importância estratégica, mas fez crescer o problema de comunicação entre o governo regional e o resto da colônia.

O segundo capitão-general de Mato Grosso foi Dom João Pedro da Câmara. Ele nunca esteve em Cuiabá e chegou a Vila Bela no dia 25/12/1764 pelo Rio Madeira, vindo do Pará. Ele tomou posse no dia 01//01/1765. Foi a primeira autoridade mato-grossense a usar o caminho fluvial da região amazônica, dei-xando de usar o costumeiro trajeto fluvial das monções. O terceiro capitão-general de Mato Grosso, Dom Luiz Pinto de Souza Coutinho, que tomou posse no dia 03/01/1769, seguiu o exemplo do seu antecessor e também nunca esteve em Cuiabá.

Em "Reflexões Sobre a Capitania de Mato Grosso", os tenentes-coronéis engenheiros Joaquim José Ferreira e Ricardo Franco de Almeida Serra, que conheciam muito bem o problema da navegação fluvial pelo trajeto amazônico, disseram a propósito: "A navegação que até agora se tem feito da cidade do Pará para Mato Grosso, além de ser extensa, trabalhosa e com manifesto risco, faz a despesa de vinte e tantos por cento, tendo os comerciantes que desta Capitania vão àquela cidade o seu dinheiro morto por quase dois anos. Este lucro cessante, unido àquela despesa, faz dar um exorbitante valor aos necessários efeitos para estas minas; acrescendo de mais o não poderem achar os socorros indispensáveis de canoas, mantimentos e remeiros, desde a boca do Madeira até o Forte do Príncipe, espaço de mais de trezentas léguas totalmente deserto, em que se compreendem setenta léguas de perigosas cachoeiras". Vale lembrar que uma légua corresponde a seis quilômetros.

Para comprovar a viabilidade geográfica de uma viagem usando apenas o caminho de terra, chegou a Cuiabá no dia 04/10/1772 o quarto e maior capitão-general da Capitania, Dom Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres. Ele tomou posse no dia 13/12/1772 e governou Mato Grosso durante 17 anos. Ele foi substituído por Dom João de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, seu irmão, que tomou posse no dia 20/11/1789. O necessário caminho terrestre por Goiás foi inaugurado pelo sexto capitão-general de Mato Grosso, Dom Caetano Pinto de Miranda Montenegro, quando veio assumir o governo da Capitania, em Vila Bela, no dia 06/11/1796. Todos os demais governantes da Capitania seguiram o seu exemplo.

Considerarando Vila Bela da Santíssima Trindade uma região insalubre, o oitavo e penúltimo capitão-general de Mato Grosso, Dom João Carlos Augusto d'Oeynhausen Grevenberg, tomou posse em Cuiabá no dia 18/11/1807, no que foi acompanhado pelo nono e último capitão-general Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, que governou a Capitania de Mato Grosso de 06/01/1819 a 20/08/1821, quando foi deposto com o início das agitações políticas pela Independência do Brasil. Foi ele quem efetivou a mudança da Capital para Cuiabá, conforme estava previsto nos projetos da administração colonial, por sugestão do capitão-general Caetano Pinto de Miranda Montenegro.

A notícia da coroação de Dom Pedro I, ocorrida no dia 12/10/1822, somente chegou a Cuiabá no dia 08/03/1823, pelo correio terrestre vindo de Goiás. Com ela, vieram também os atos criando a bandeira e as armas do Brasil independente. A administração pública já não era regional e sim nacional. A Capital do Im-pério centralizava as decisões que antes eram dos capitães-generais, os delegados de um rei bem distante. As antigas Capitais das Capitanias perderam muitas das suas regalias e as Províncias já adotavam um novo relacionamento entre si e as atenções passaram para São Paulo e Rio de Janeiro.

No seu livro "Itinerário da Viagem de Cuiabá a S. Paulo", o comerciante Joaquim Ferreira Moutinho, que residiu em Cuiabá durante 18 anos, fez o percurso usado quando o governo de Assunção decidia fechar a navegação pelo Rio Paraguai. Ele saiu de Cuiabá no dia 25/05/1868 e percorreu um caminho, de picadas, que passava pelo flanco Norte da Chapada dos Guimarães. Das referências citadas, as mais conhecidas eram: 1) ponte do Rio Aricá; 2) localidade de Pires, às margens do Rio Cupim; 3) sempre margeando o Rio Cupim, já nas suas "belas cachoeiras", em cima da Chapada dos Guimarães; 4) Rio Manso; 5) Ribeirão Roncador; 6) Serra do Alecrim; 7) Serra das Lavrinhas; 8) Córrego Sucuri; 9) Rio Água Branca); 10) Serra do Taquaral; 11) Rio Água Branca; 12) Ribeirão Sangradorzinho; 13) Ribeirão Samambaia; 14) Paredão; 15) Ribeirão das Areias; 16) Serra das Lages; 17) Rio Mutum; 18; Porto do Araguaia, divisa com a Província de Goiás; 19) Ribeirão Ponte Alta; 20) Rio das Almas; 21) Rio Lajeado; 22) Rio Claro; 23) Rio Meia Ponte; 24) Rio Paranaíba (na divisa de Goiás e Minas Gerais).

A 17/06/1868, 23 dias dias depois da sua saída de Cuiabá ele relatava: "...Mais 2 léguas adiante está o Paredão, onde pousamos. É este lugar um dos mais belos e célebres do sertão. Uma muralha de 150 pés de altura, cortada a pique, e que forma a face ocidental de uma montanha, ergue-se no meio de uma campanha fechada ao longe por linhas verde-escuras de matas sem fim". A sua chegada ao porto do Rio Araguaia foi no dia 27/06/1868. Prossegue Joaquim Ferreira Moutinho: "Ai é o limite da Província de Mato Grosso com Goiás. Na margem esquerda do rio há um destacamento cuiabano, composto de algumas praças comandadas por um cadete. A povoação de Nossa Senhora da Piedade é pequena, reduzindo-se a algumas casas cobertas de capim, uma pobre capelinha, e um rancho na beira do rio; nada oferece o lugar de notável a não ser a sua beleza natural, realçada pelo Araguaia, largo e majestoso". Chegou ao Rio Araguaia após 33 dias de viagem a partir de Cuiabá.

Tudo era difícil para o viajante e Joaquim Ferreira Moutinho soube descrever o cenário: "Em todo o sertão não existe uma braça ao menos no caminho que se possa dizer estrada; é apenas uma simples vereda que não admite outro veículo de condução a não ser o de animais de carga. Este caminho foi aberto em 1736, por uma bandeira que a requerimento do povo e da Câmara partiu de Cuiabá para Goiás, por or-dem do ouvidor João Gonçalves Ferreira. Tem sofrido bastante alterações, mas nunca teve benefício algum".

Ele não passou pela cidade Goiás, a Capital da vizinha Província, mas reclamou de duas barreiras, uma no Rio Araguaia e outra no Rio Paranaíba: "Aos negociantes de Mato Grosso torna-se por demais pesada esta contribuição, aliás injusta, visto como nada tem eles com a importação de Goiás".

Quando passou à condição de Província, com o Brasil já independente, Mato Grosso já havia usado três vias de transporte: a) o caminho das monções; b) o caminho fluvial amazônico; e c) o caminho terrestre de Goiás. No dia 20/02/1857, chegou a Cuiabá o "vapor "Corça", o primeiro da modalidade, conforme um tratado de navegação firmado entre o Brasil e o Paraguai no dia 06/04/1856. No Porto Geral, no final da Avenida 15 de Novembro, estavam presentes todas as autoridades locais e um público jamais visto, que foi estimado em 4.000 pessoas, para recepcionar a nova embarcação. No dia 22/06/1858 foi firmado o contrato para a navegação comercial no Rio Paraguai até Cuiabá. O documento foi assinado pelo governo imperial e pelo cidadão José Antônio Soares, possibilitando a criação da empresa que assumiu a responsabilidade de manter uma viagem mensal entre Montevidéu e Cuiabá.

Encerrada a chamada "Guerra do Paraguai", a Companhia Nacional de Navegação a Vapor iniciou as viagens regulares entre Corumbá e Cuiabá no dia 25/04/1872, com o paquete "Coxipó", embarcação que permaneceu em atividade durante muitos anos e foi importante para o transporte fluvial de Mato Grosso. No dia 07/01/1880, a população de Cáceres recebeu festivamente o vapor "Novo Mundo", um dos maiores que já navegou em rios mato-grossenses. Para a sua construção, foi formada, sob a denominação de União de Vila Maria, uma empresa local que tinha como maior acionista o major João Carlos Pereira Leite.

Cáceres foi a primeira cidade mato-grossense a ingressar na era da aviação. O hidroavião "Santa Maria", Savóia Marchetti S. 55, pilotado pelo marquês italiano Francisco de Pinedo, foi a primeira aeronave a sobrevoar os céus de Mato Grosso. Chegou a Cáceres, procedente de Assunção, no dia 16/03/1927, e dois dias depois seguiu para Guajará-Mirim, em viagem pela América do Sul. Mas a primeira aterrissagem foi em Cuiabá, com o apoio do presidente Mário Corrêa da Costa, que construiu um modesto "campo de aviação" no Pico do Amor, onde hoje existe o Bairro Campo Velho. O primeiro avião chegou a Cuiabá às 17:30 horas do dia 28/03/1929, vindo de Santos. Era o "Mato Grosso", um avião semelhante aos atuais ultra-leves. O governo mato-grossense ofereceu um prêmio de 30 contos de réis ao piloto que trouxesse um avião a Cuiabá. O valor foi pago duas vezes porque outro avião, o "Presidente Mário Corrêa", vindo do Rio de Janeiro, teve dificuldades no percurso e chegou a Cuiabá quatro dias depois, com uma história para servir de tema para um filme de primeira categoria.

A etapa seguinte das viagens aéreas em Mato Grosso corresponde ao ciclo dos hidroaviões, que operaram nas águas dos rios Paraguai e Cuiabá por mais de dez anos. A primeira linha aérea regular de Mato Grosso, ligando Corumbá e Cuiabá, teve início no dia 16/09/1930, mantendo um pouco daquele sabor de aventura das primeiras viagens. No dia 01/01/1932, o Sindicato Condor Limitada passou a realizar vôos entre Corumbá e Campo Grande, com aviões aptos a operar em precários "campos de aviação". A partir de 08/09/1933, essa linha foi ampliada até São Paulo, com escalas em Três Lagoas, Araçatuba, Penápolis, Lins e Bauru. Os hidroaviões continuaram voando entre Corumbá e Cuiabá até outubro de 1940. Realizando um vôo experimental, o primeiro trimotor da Condor aterrissou em Cuiabá no dia 11/03/1940. Finalmente, no dia 14/10/1940 coube à Condor inaugurar a primeira linha aérea comercial, com vôo direto entre o Rio de Janeiro e Cuiabá, no dia 14/10/1940. Às 17:15 horas, cinco minutos antes do que era previsto, o trimotor "Maipu" aterrissou no campo de aviação de Cuiabá, onde hoje se encontra a Vila Militar, na Avenida Miguel Sutil, não tendo usado a metade da pista. Desde o dia 18/06/1940 os aviões do Correio Aéreo Nacional faziam escala em Cuiabá, num vôo regular entre Campo Grande, Herculânea, Lajeado, Cuiabá, Poconé e Cáceres. Era o fim do ciclo dos hidroaviões e dos pernoites obrigatórios em Corumbá.

O problema rodoviário demorou um pouco mais. As estradas, de terra, eram precárias. A Empresa Saccadura, a única então existente, era exemplo de pioneirismo. Os pontos críticos entre Cuiabá e Campo Grande estavam no "Portão do Inferno" e na "Mata Fria", na atual subida para a Chapada dos Guimarães, além das balsas em Rondonópolis, São Lourenço e Coxim. O Sr. Albino Augusto Pereira, mais conhecido por "Saccadura", era um arrojado empresário. Para garantir o tráfego permanente entre essas duas cidades, o interventor Júlio Strübing Müller autorizou a contratação de seis trabalhadores. A viagem era cansativa, porém mais rápida do que aquela feita por lancha, que transportou passageiros e cargas para Cuiabá até a metade do século passado.

Retornando de Cuiabá, o Sr. Pedro Borges escreveu no jornal "O Progressista", de Campo Grande, em artigo republicado no "Diário Oficial do Estado" no dia 19/08/1939: "Uma das maiores realizações que o atual interventor pretende levar a efeito é melhorar, tanto quanto possível, as comunicações terrestres entre Cuiabá e Campo Grande. Ele pretende reduzir a viagem em jardineira de 60 para 36 horas, na distância, na distância de 150 léguas que separam as duas grandes cidades". E lembrou: "A 12 léguas aquém de Cuiabá, na descida da serra, vêem-se notáveis melhoramentos na rodovia, levados a cabo com inexcedível zelo pelo Batalhão de Sapadores da Força Pública, este sob o criterioso comando do tenente-coronel Máximo Levi, trabalhos esses que honram a engenharia mato-grossese".

As mercadorias adquiridas em São Paulo demoravam até três meses para chegar à Capital de Mato Grosso. A série de transbordos começava na utilização de duas ferrovias (a Paulista, até Bauru, em bitola larga, e a Noroeste do Brasil, até Porto Esperança, em bitola estreita). Devido a falta de armazéns, a carga ficava na barranca do Rio Paraguai esperando as lanchas que navegavam até Cuiabá. E isto era um grande avanço, pois não estava longe a época em que o único transporte disponível era o fluvial, vindo do Oceano Atlântico, entrando pela foz da Bacia Platina, o Rio Paraguai e finalmente o Rio Cuiabá. Para os passageiros a viagem era mais rápida, mas eles ainda enfrentavam duas baldeações: pelo vapor "Fernandes Vieira" até Corumbá, e e pelos vapores "Guaporé" e "Cidade de Corumbá" até à Capital do Estado.

Para facilitar o trajeto das famosas "jardineiras" da Empresa Saccadura e reduzir a distância entre Campo Grande e Cuiabá, o governo mato-grossense fez a retificação da rodovia entre as duas cidades, na altura da Serra de São Vicente. O trajeto anterior, pelo flanco Sul da Chapada dos Guimarães, permanece até hoje, ainda de terra, apenas como alternativa. Para as obras de terraplanagem na Serra de São Vicente, o interventor Júlio Strübing Müller autorizou a compra de um trator "International", que foi o primeiro a operar em Mato Grosso. No dia 07/09/1943 foi inaugurada uma ponte sobre o Rio Vermelho, em Rondonópolis, encerrando o ciclo de balsas no percurso rodoviário entre Cuiabá e Campo Grande.

Mas Mato Grosso continuou sem rodovias asfaltadas até a década de 70 do século passado. Com as exigências do progresso, novas dificuldades surgiram. Sem o esperado asfalto, o progresso de Mato Grosso poderia ser prejudicado a curto prazo. Com os recursos oriundos do PRODOESTE e do Plano de Integração Nacional foi pavimentada a rodovia para Campo Grande e em seguida, o mesmo ocorria na rodovia para Goiânia, passando por Barra do Garças, por cima da Serra de São Vicente, desenvolvendo a vasta região do Araguaia, que continuava a ser um grande vazio demográfico mesmo depois de extinta a Fundação Brasil Central. Na década seguinte o asfalto avançava em direção de Santarém, cortando o atual "Nortão", que passou a se desenvolver rapidamente, e em direção de Porto Velho, garantindo o povoamento de uma das mais férteis regiões do Brasil. Estava mais longe ainda a época da barca-pêndulo no Rio Cuiabá.

Ao retornar da sua viagem a Cuiabá como presidente, o marechal Eurico Gaspar Dutra, comentou com orgulho: " Cuiabá não está mais tão longe. Tomei café hoje lá e estou jantando aqui no Rio de Janeiro". O orgulhoso cuiabano estava vibrando e, com sua observação, resumiu a longa jornada de Cuiabá desde aquelas primeiras viagens nos dois trajetos usados no período das Monções pelos bandeirantes paulistas que chegaram ao centro da América do Sul. Embora fosse uma decisão pessoal de Dom Pedro II, os trilhos de uma ferrovia ainda não chegaram a Cuiabá, pois o projeto inicial foi mudado para atender ao Acordo de Roboré, entre o Brasil e a Bolívia. Os trilhos foram direcionados de Campo Grande para Santa Cruz de La Sierra, passando por Corumbá. Agora, a Ferronorte já está em Alto Araguaia, mas nem tudo está fácil para atingir Rondonópolis e daí Cuiabá. Mas algum dia a Ferronorte chegará à Capital de Mato Grosso. Já estivemos bem mais longe e tudo deu certo.



































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Localizada no centro da América do Sul, entre o Pantanal , a Amazônia e os Cerrados, Cuiabá tem hoje uma posição geográfica das mais privilegiadas, mas no passado pagou um alto preço por ser distante. Além disto, os interesses coloniais portugueses no continente sul-americano levaram para Vila Bela o centro da ação administrativa da nascente Capitania de Mato Grosso, transformando as fronteiras espanholas num inconcebível marco divisório da civilização naquela época. Mas Cuiabá, a primeira vila real do Centro-Oeste, sempre foi um outro marco, o da ocupação do interior brasileiro, a despeito das adversidades que enfrentou desde a sua descoberta.Os diversos caminhos até Cuiabá surgiram por etapas, durante séculos.

Quando Bartolomeu Bueno da Silva, o "Anhangüera" - o diabo velho que podia secar os rios, penetrou os até então desconhecidos sertões existentes a Noroeste de Sorocaba em 1682, acompanhado de vários bandeirantes paulistas, e encontrou ouro e pedras preciosas, jamais imaginou que daria origem à lenda da Serra dos Martírios (devido à configuração do relevo local). E nem que essa lenda, ainda não confirmada, motivaria a criação de duas grandes Capitanias, a de Mato Grosso e a de Goiás, graças ao retorno de dois jovens que participaram da sua expedição e que jamais esqueceram os motivos da lenda: o segundo Bartolomeu Bueno da Silva e Antônio Pires de Campos, o descobridor de Cuiabá, filhos daqueles arrojados bandeirantes do Século XVII, que morreram sem conhecer a riqueza.

Antônio Pires de Campos preferiu o caminho das águas, no período das monções, e não aquele de terra usado pelos seus predecessores. Ele localizava a Serra dos Martírios na região do Rio Araguaia, que assim descrevia: "...Seguindo pelo mesmo abaixo, se avistam uns morros azuis, e nestes acharam a tapera dos Araés, onde chegamos com meu pai, que Deus haja, e achamos várias cunhãs com folhetas pelo pescoço e braços, e desta folhetas mandou meu pai fazer um resplendor para a sua virgem, e também uma coroa do mesmo ouro, que pesa quarenta e tantas oitavas, para a Virgem Senhora do Carmo do Hospício de Itú. E, perguntando aos ditos índios aonde tinham achado aquelas folhetas, respondeu o cacique que foi naqueles morros depois da chuva. Isto foi o que vi, e não foram cousas contadas. Na volta que fizemos nos encontramos com o pai do capitão-mor Bartolomeu Bueno (da Silva), e ouvindo a meu pai todo o referido..." Ele navegou, então, pelos rios Tietê, Paraná, Anhanduí e Pardo e, carregando pesados batelões nas costas, atravessou os Campos das Vacarias até o Rio Meteteu, dele passando para o Rio Paraguai, para atingir o Rio Cuiabá, então desconhecido, e subiu até à foz do Rio Coxipó, também nunca navegado. Vendo o erro do seu roteiro, ele deixou o Arraial de São Gonçalo e desceu o Rio Cuiabá, quando se encontrou com a bandeira comandada pelo sorocabano Pascoal Moreira Cabral, que buscava índios para aprisionar, e lhe orientou a direção do arraial que havia montado em Cuiabá. Antônio Pires de Campos conseguiu voltar à região do Araguaia, atravessando não se sabe como o divisor de águas, mas nunca encontrou as suas sonhadas minas. O descobridor de Cuiabá reaparece mais tarde combatendo os índios Caiapós. Por sua vez, Pascoal Moreira Cabral que jamais sonhou em fundar uma cidade tão importante como Cuiabá, ali encontrou as mais ricas lavras de ouro do Brasil colônia no início do Século XVIII.

Bartolomeu Bueno da Silva (o filho), depois de também procurar a lendária Serra dos Martírios com o seu contemporâneo Antônio Pires de Campos, fixou-se nas minas onde surgiria o Arraial de Sant'Ana, em 1728, depois Vila Boa (25/07/1746) e hoje cidade de Goiás, e futura Capital da Capitania de Goiás. Embora tendo chegado ao posto de superintendente e guarda-mor das Minas de Goiás, ele morreu pobre no dia 19/09/1740, com pouco mais de 70 anos. Eles dois aumentaram os limites do Brasil Colônia e não foram reconhecidos em vida pela Coroa Portuguesa. Contudo, tiveram o mesmo sonho: as riquêzas imensas de uma Serra dos Martírios que ainda continua sendo apenas uma lenda.

A partir de 1725, o caminho das águas ficou mais rápido e mais confortável, com um segundo trajeto monçoeiro: os mesmos rios Tietê, Paraná e Pardo, percorrendo os rios Miranda e Sanguessuga, com uma travessia por terra pelo Varadouro de Camapuã, atingindo os rios Coxim e Taquari, para novamente chegar aos rios Paraguai e Cuiabá. Em Camapuã eles plantavam os cereais para a segunda etapa, reduzindo os apetrechos de viagem. Porém, surgiu um novo problema: os índios Caiapós, Paiaguás e Guicarurús tudo fizeram para impedir o percurso das bandeiras paulistas por ali até o Século XIX, quando não tinham mais forças para enfrentar o avanço da civilização portuguesa.

Cuiabá tornou-se, em pouco tempo, o principal polo para o avanço do povoamento em direção do interior do Brasil. No dia 16/11/1726, o capitão-general de São Paulo, Dom Rodrigo César de Menezes, chegou a Cuiabá depois de quatro meses de viagem. Estava acompanhado de uma expedição, jamais vista na época, formada por cerca de 3.000 pessoas, embarcadas em 300 canoas. Veio instalar, com autorização de Lisboa, no dia 01/01/1727, a Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, que tinha "oito ou nove casas de telha", conforme o cronista Joseph Barboza de Sá. Ainda usando o segundo trajeto monçoeiro, o governante paulista deixou Cuiabá no dia 04/06/1728. Qualquer viagem de ou para Cuiabá, era uma aventura.

Os primeiros povoados de Goiás tiveram ligação terrestre, embora precária, com São Paulo. A Carta Régia de 10/01/1730 determinou que houvesse apenas um caminho de terra entre Goiás e as vilas paulistas, para melhor fiscalização e cobrança do direito das entradas. Embora o avô e o pai, com o mesmo nome, tenham morrido pobres, o neto de "Anhagüera" recebeu uma recompensa da Rainha D. Mariana. Pela Carta Régia de 18/05/1746, o terceiro Bartolomeu Bueno da Silva arrecadava os rendimentos das passagens dos rios Jaguari, Atibaia, rio Grande, das Velhas e Corumbá.

A Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá ainda continuava isolada. No dia 04/08/1746, com seis canoas grandes, tripuladas por 50 pessoas (32, escravos seus), o sargento-mor João de Souza Azevedo iniciou na Cachoeira Grande, no Rio Jauru, a primeira viagem fluvial de Mato Grosso ao Pará. Subiu o Rio Paraguai até o Rio Sepotúba e dai percorreu a pé 18 quilômetros, com as canoas nos ombros, durante 50 dias. No dia 26/10/1746 ele chegou às águas do Rio Sumidouro, passou para o Rio Arinos, e através do Rio Tapajós chegou a Belém. Três anos depois ele regressou a Mato Grosso, navegando pelo Rio Madeira.

Pelo Alvará de 09/05/1748, Dom João V criou as Capitanias de Mato Grosso e Goiás, subordinando as Comarcas de São Paulo e Paranaguá à Capitania do Rio de Janeiro. Por isto, o soberano português determinou ao governador Luiz de Mascarenhas, de São Paulo, a se recolher "para o Reino na primeira frota". Não havia, exatamente, um limite territorial entre as duas novas Capitanias, pois o citado alvará foi omisso a respeito: "... e os confins do Governo de Mato Grosso e Cuiabá hão de ser para a parte de São Paulo pelo dito Rio Grande (Paraná) e pelo que respeita à sua confrontação com os Governos de Goiás e Maranhão, vista a pouca notícia que ainda há daqueles sertões, tenho determinado se ordene a cada um dos novos governadores, e também ao do Maranhão, informem por onde poderá determinar-se mais cômoda e naturalmente a divisão".

Um grupo liderado por Francisco Rossi Colombina tentou abrir um caminho de terra de São Paulo para Cuiabá, passando pela Capital de Goiás, Vila Boa, e requereram privilégio de receber os rendimentos de uso por dez anos, além de uma sesmaria de três em três léguas em toda a extensão dessa estrada. Uma Provisão de 06/12/1750 concedeu os direitos requeridos, porém o projeto nunca foi executado por falta de recursos financeiros. A criação da Capitania de Goiás visava o controle mais efetivo das extração mineral, principalmente dos diamantes do Serro Frio. O contrabando de ouro e outros minerais era feito em larga escala e não interessava ao governo colonial facilitar os meios de transporte.

No dia 12/01/1751, foi recebido com todas as pompas da época o primeiro capitão-general de Mato Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura, que assumiu cinco dias depois. Uma de suas missões era instalar no Distrito de Mato Grosso, onde seria fundada Vila Bela, a "cabeça do governo". Veio, ainda, pelo trajeto das monções, sofrendo todos os tradicionais incômodos, depois de cinco meses e sete dias de viagem. Ele foi nomeado por Dom João V no dia 20/07/1748, mas chegou ao Brasil no dia 01/04/1750, quando se dirigiu a Parati a fim de conferenciar com o capitão-general do Rio de Janeiro, Dom Gomes Freire de Andrade, que respondia interinamente pela Capitania de Mato Grosso, onde nunca esteve e nem pensou nisto. Depois de descansar por alguns dias em Porto Feliz, Araritaguaba, ele seguiu viagem para Cuiabá no dia 05/08/1750, acompanhado de uma comitiva de 190 homens, que viajavam em 24 canoas.

Tomadas as primeiras providências administrativas para o bom funcionamento da Capitania de Mato Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura saiu de Cuiabá no dia 03/11/1751 para, finalmente, fundar no dia 19/03/1752 a segunda Capital da Capitania de Mato Grosso, Vila Bela da Santíssima Trindade, na margem direita do Rio Guaporé. A Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá continuava com a maior população da Capitania e Vila Bela era o seu segundo núcleo urbano. A nova Capital poderia ter uma grande importância estratégica, mas fez crescer o problema de comunicação entre o governo regional e o resto da colônia.

O segundo capitão-general de Mato Grosso foi Dom João Pedro da Câmara. Ele nunca esteve em Cuiabá e chegou a Vila Bela no dia 25/12/1764 pelo Rio Madeira, vindo do Pará. Ele tomou posse no dia 01//01/1765. Foi a primeira autoridade mato-grossense a usar o caminho fluvial da região amazônica, dei-xando de usar o costumeiro trajeto fluvial das monções. O terceiro capitão-general de Mato Grosso, Dom Luiz Pinto de Souza Coutinho, que tomou posse no dia 03/01/1769, seguiu o exemplo do seu antecessor e também nunca esteve em Cuiabá.

Em "Reflexões Sobre a Capitania de Mato Grosso", os tenentes-coronéis engenheiros Joaquim José Ferreira e Ricardo Franco de Almeida Serra, que conheciam muito bem o problema da navegação fluvial pelo trajeto amazônico, disseram a propósito: "A navegação que até agora se tem feito da cidade do Pará para Mato Grosso, além de ser extensa, trabalhosa e com manifesto risco, faz a despesa de vinte e tantos por cento, tendo os comerciantes que desta Capitania vão àquela cidade o seu dinheiro morto por quase dois anos. Este lucro cessante, unido àquela despesa, faz dar um exorbitante valor aos necessários efeitos para estas minas; acrescendo de mais o não poderem achar os socorros indispensáveis de canoas, mantimentos e remeiros, desde a boca do Madeira até o Forte do Príncipe, espaço de mais de trezentas léguas totalmente deserto, em que se compreendem setenta léguas de perigosas cachoeiras". Vale lembrar que uma légua corresponde a seis quilômetros.

Para comprovar a viabilidade geográfica de uma viagem usando apenas o caminho de terra, chegou a Cuiabá no dia 04/10/1772 o quarto e maior capitão-general da Capitania, Dom Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres. Ele tomou posse no dia 13/12/1772 e governou Mato Grosso durante 17 anos. Ele foi substituído por Dom João de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, seu irmão, que tomou posse no dia 20/11/1789. O necessário caminho terrestre por Goiás foi inaugurado pelo sexto capitão-general de Mato Grosso, Dom Caetano Pinto de Miranda Montenegro, quando veio assumir o governo da Capitania, em Vila Bela, no dia 06/11/1796. Todos os demais governantes da Capitania seguiram o seu exemplo.

Considerarando Vila Bela da Santíssima Trindade uma região insalubre, o oitavo e penúltimo capitão-general de Mato Grosso, Dom João Carlos Augusto d'Oeynhausen Grevenberg, tomou posse em Cuiabá no dia 18/11/1807, no que foi acompanhado pelo nono e último capitão-general Francisco de Paula Magessi Tavares de Carvalho, que governou a Capitania de Mato Grosso de 06/01/1819 a 20/08/1821, quando foi deposto com o início das agitações políticas pela Independência do Brasil. Foi ele quem efetivou a mudança da Capital para Cuiabá, conforme estava previsto nos projetos da administração colonial, por sugestão do capitão-general Caetano Pinto de Miranda Montenegro.

A notícia da coroação de Dom Pedro I, ocorrida no dia 12/10/1822, somente chegou a Cuiabá no dia 08/03/1823, pelo correio terrestre vindo de Goiás. Com ela, vieram também os atos criando a bandeira e as armas do Brasil independente. A administração pública já não era regional e sim nacional. A Capital do Im-pério centralizava as decisões que antes eram dos capitães-generais, os delegados de um rei bem distante. As antigas Capitais das Capitanias perderam muitas das suas regalias e as Províncias já adotavam um novo relacionamento entre si e as atenções passaram para São Paulo e Rio de Janeiro.

No seu livro "Itinerário da Viagem de Cuiabá a S. Paulo", o comerciante Joaquim Ferreira Moutinho, que residiu em Cuiabá durante 18 anos, fez o percurso usado quando o governo de Assunção decidia fechar a navegação pelo Rio Paraguai. Ele saiu de Cuiabá no dia 25/05/1868 e percorreu um caminho, de picadas, que passava pelo flanco Norte da Chapada dos Guimarães. Das referências citadas, as mais conhecidas eram: 1) ponte do Rio Aricá; 2) localidade de Pires, às margens do Rio Cupim; 3) sempre margeando o Rio Cupim, já nas suas "belas cachoeiras", em cima da Chapada dos Guimarães; 4) Rio Manso; 5) Ribeirão Roncador; 6) Serra do Alecrim; 7) Serra das Lavrinhas; 8) Córrego Sucuri; 9) Rio Água Branca); 10) Serra do Taquaral; 11) Rio Água Branca; 12) Ribeirão Sangradorzinho; 13) Ribeirão Samambaia; 14) Paredão; 15) Ribeirão das Areias; 16) Serra das Lages; 17) Rio Mutum; 18; Porto do Araguaia, divisa com a Província de Goiás; 19) Ribeirão Ponte Alta; 20) Rio das Almas; 21) Rio Lajeado; 22) Rio Claro; 23) Rio Meia Ponte; 24) Rio Paranaíba (na divisa de Goiás e Minas Gerais).

A 17/06/1868, 23 dias dias depois da sua saída de Cuiabá ele relatava: "...Mais 2 léguas adiante está o Paredão, onde pousamos. É este lugar um dos mais belos e célebres do sertão. Uma muralha de 150 pés de altura, cortada a pique, e que forma a face ocidental de uma montanha, ergue-se no meio de uma campanha fechada ao longe por linhas verde-escuras de matas sem fim". A sua chegada ao porto do Rio Araguaia foi no dia 27/06/1868. Prossegue Joaquim Ferreira Moutinho: "Ai é o limite da Província de Mato Grosso com Goiás. Na margem esquerda do rio há um destacamento cuiabano, composto de algumas praças comandadas por um cadete. A povoação de Nossa Senhora da Piedade é pequena, reduzindo-se a algumas casas cobertas de capim, uma pobre capelinha, e um rancho na beira do rio; nada oferece o lugar de notável a não ser a sua beleza natural, realçada pelo Araguaia, largo e majestoso". Chegou ao Rio Araguaia após 33 dias de viagem a partir de Cuiabá.

Tudo era difícil para o viajante e Joaquim Ferreira Moutinho soube descrever o cenário: "Em todo o sertão não existe uma braça ao menos no caminho que se possa dizer estrada; é apenas uma simples vereda que não admite outro veículo de condução a não ser o de animais de carga. Este caminho foi aberto em 1736, por uma bandeira que a requerimento do povo e da Câmara partiu de Cuiabá para Goiás, por or-dem do ouvidor João Gonçalves Ferreira. Tem sofrido bastante alterações, mas nunca teve benefício algum".

Ele não passou pela cidade Goiás, a Capital da vizinha Província, mas reclamou de duas barreiras, uma no Rio Araguaia e outra no Rio Paranaíba: "Aos negociantes de Mato Grosso torna-se por demais pesada esta contribuição, aliás injusta, visto como nada tem eles com a importação de Goiás".

Quando passou à condição de Província, com o Brasil já independente, Mato Grosso já havia usado três vias de transporte: a) o caminho das monções; b) o caminho fluvial amazônico; e c) o caminho terrestre de Goiás. No dia 20/02/1857, chegou a Cuiabá o "vapor "Corça", o primeiro da modalidade, conforme um tratado de navegação firmado entre o Brasil e o Paraguai no dia 06/04/1856. No Porto Geral, no final da Avenida 15 de Novembro, estavam presentes todas as autoridades locais e um público jamais visto, que foi estimado em 4.000 pessoas, para recepcionar a nova embarcação. No dia 22/06/1858 foi firmado o contrato para a navegação comercial no Rio Paraguai até Cuiabá. O documento foi assinado pelo governo imperial e pelo cidadão José Antônio Soares, possibilitando a criação da empresa que assumiu a responsabilidade de manter uma viagem mensal entre Montevidéu e Cuiabá.

Encerrada a chamada "Guerra do Paraguai", a Companhia Nacional de Navegação a Vapor iniciou as viagens regulares entre Corumbá e Cuiabá no dia 25/04/1872, com o paquete "Coxipó", embarcação que permaneceu em atividade durante muitos anos e foi importante para o transporte fluvial de Mato Grosso. No dia 07/01/1880, a população de Cáceres recebeu festivamente o vapor "Novo Mundo", um dos maiores que já navegou em rios mato-grossenses. Para a sua construção, foi formada, sob a denominação de União de Vila Maria, uma empresa local que tinha como maior acionista o major João Carlos Pereira Leite.

Cáceres foi a primeira cidade mato-grossense a ingressar na era da aviação. O hidroavião "Santa Maria", Savóia Marchetti S. 55, pilotado pelo marquês italiano Francisco de Pinedo, foi a primeira aeronave a sobrevoar os céus de Mato Grosso. Chegou a Cáceres, procedente de Assunção, no dia 16/03/1927, e dois dias depois seguiu para Guajará-Mirim, em viagem pela América do Sul. Mas a primeira aterrissagem foi em Cuiabá, com o apoio do presidente Mário Corrêa da Costa, que construiu um modesto "campo de aviação" no Pico do Amor, onde hoje existe o Bairro Campo Velho. O primeiro avião chegou a Cuiabá às 17:30 horas do dia 28/03/1929, vindo de Santos. Era o "Mato Grosso", um avião semelhante aos atuais ultra-leves. O governo mato-grossense ofereceu um prêmio de 30 contos de réis ao piloto que trouxesse um avião a Cuiabá. O valor foi pago duas vezes porque outro avião, o "Presidente Mário Corrêa", vindo do Rio de Janeiro, teve dificuldades no percurso e chegou a Cuiabá quatro dias depois, com uma história para servir de tema para um filme de primeira categoria.

A etapa seguinte das viagens aéreas em Mato Grosso corresponde ao ciclo dos hidroaviões, que operaram nas águas dos rios Paraguai e Cuiabá por mais de dez anos. A primeira linha aérea regular de Mato Grosso, ligando Corumbá e Cuiabá, teve início no dia 16/09/1930, mantendo um pouco daquele sabor de aventura das primeiras viagens. No dia 01/01/1932, o Sindicato Condor Limitada passou a realizar vôos entre Corumbá e Campo Grande, com aviões aptos a operar em precários "campos de aviação". A partir de 08/09/1933, essa linha foi ampliada até São Paulo, com escalas em Três Lagoas, Araçatuba, Penápolis, Lins e Bauru. Os hidroaviões continuaram voando entre Corumbá e Cuiabá até outubro de 1940. Realizando um vôo experimental, o primeiro trimotor da Condor aterrissou em Cuiabá no dia 11/03/1940. Finalmente, no dia 14/10/1940 coube à Condor inaugurar a primeira linha aérea comercial, com vôo direto entre o Rio de Janeiro e Cuiabá, no dia 14/10/1940. Às 17:15 horas, cinco minutos antes do que era previsto, o trimotor "Maipu" aterrissou no campo de aviação de Cuiabá, onde hoje se encontra a Vila Militar, na Avenida Miguel Sutil, não tendo usado a metade da pista. Desde o dia 18/06/1940 os aviões do Correio Aéreo Nacional faziam escala em Cuiabá, num vôo regular entre Campo Grande, Herculânea, Lajeado, Cuiabá, Poconé e Cáceres. Era o fim do ciclo dos hidroaviões e dos pernoites obrigatórios em Corumbá.

O problema rodoviário demorou um pouco mais. As estradas, de terra, eram precárias. A Empresa Saccadura, a única então existente, era exemplo de pioneirismo. Os pontos críticos entre Cuiabá e Campo Grande estavam no "Portão do Inferno" e na "Mata Fria", na atual subida para a Chapada dos Guimarães, além das balsas em Rondonópolis, São Lourenço e Coxim. O Sr. Albino Augusto Pereira, mais conhecido por "Saccadura", era um arrojado empresário. Para garantir o tráfego permanente entre essas duas cidades, o interventor Júlio Strübing Müller autorizou a contratação de seis trabalhadores. A viagem era cansativa, porém mais rápida do que aquela feita por lancha, que transportou passageiros e cargas para Cuiabá até a metade do século passado.

Retornando de Cuiabá, o Sr. Pedro Borges escreveu no jornal "O Progressista", de Campo Grande, em artigo republicado no "Diário Oficial do Estado" no dia 19/08/1939: "Uma das maiores realizações que o atual interventor pretende levar a efeito é melhorar, tanto quanto possível, as comunicações terrestres entre Cuiabá e Campo Grande. Ele pretende reduzir a viagem em jardineira de 60 para 36 horas, na distância, na distância de 150 léguas que separam as duas grandes cidades". E lembrou: "A 12 léguas aquém de Cuiabá, na descida da serra, vêem-se notáveis melhoramentos na rodovia, levados a cabo com inexcedível zelo pelo Batalhão de Sapadores da Força Pública, este sob o criterioso comando do tenente-coronel Máximo Levi, trabalhos esses que honram a engenharia mato-grossese".

As mercadorias adquiridas em São Paulo demoravam até três meses para chegar à Capital de Mato Grosso. A série de transbordos começava na utilização de duas ferrovias (a Paulista, até Bauru, em bitola larga, e a Noroeste do Brasil, até Porto Esperança, em bitola estreita). Devido a falta de armazéns, a carga ficava na barranca do Rio Paraguai esperando as lanchas que navegavam até Cuiabá. E isto era um grande avanço, pois não estava longe a época em que o único transporte disponível era o fluvial, vindo do Oceano Atlântico, entrando pela foz da Bacia Platina, o Rio Paraguai e finalmente o Rio Cuiabá. Para os passageiros a viagem era mais rápida, mas eles ainda enfrentavam duas baldeações: pelo vapor "Fernandes Vieira" até Corumbá, e e pelos vapores "Guaporé" e "Cidade de Corumbá" até à Capital do Estado.

Para facilitar o trajeto das famosas "jardineiras" da Empresa Saccadura e reduzir a distância entre Campo Grande e Cuiabá, o governo mato-grossense fez a retificação da rodovia entre as duas cidades, na altura da Serra de São Vicente. O trajeto anterior, pelo flanco Sul da Chapada dos Guimarães, permanece até hoje, ainda de terra, apenas como alternativa. Para as obras de terraplanagem na Serra de São Vicente, o interventor Júlio Strübing Müller autorizou a compra de um trator "International", que foi o primeiro a operar em Mato Grosso. No dia 07/09/1943 foi inaugurada uma ponte sobre o Rio Vermelho, em Rondonópolis, encerrando o ciclo de balsas no percurso rodoviário entre Cuiabá e Campo Grande.

Mas Mato Grosso continuou sem rodovias asfaltadas até a década de 70 do século passado. Com as exigências do progresso, novas dificuldades surgiram. Sem o esperado asfalto, o progresso de Mato Grosso poderia ser prejudicado a curto prazo. Com os recursos oriundos do PRODOESTE e do Plano de Integração Nacional foi pavimentada a rodovia para Campo Grande e em seguida, o mesmo ocorria na rodovia para Goiânia, passando por Barra do Garças, por cima da Serra de São Vicente, desenvolvendo a vasta região do Araguaia, que continuava a ser um grande vazio demográfico mesmo depois de extinta a Fundação Brasil Central. Na década seguinte o asfalto avançava em direção de Santarém, cortando o atual "Nortão", que passou a se desenvolver rapidamente, e em direção de Porto Velho, garantindo o povoamento de uma das mais férteis regiões do Brasil. Estava mais longe ainda a época da barca-pêndulo no Rio Cuiabá.

Ao retornar da sua viagem a Cuiabá como presidente, o marechal Eurico Gaspar Dutra, comentou com orgulho: " Cuiabá não está mais tão longe. Tomei café hoje lá e estou jantando aqui no Rio de Janeiro". O orgulhoso cuiabano estava vibrando e, com sua observação, resumiu a longa jornada de Cuiabá desde aquelas primeiras viagens nos dois trajetos usados no período das Monções pelos bandeirantes paulistas que chegaram ao centro da América do Sul. Embora fosse uma decisão pessoal de Dom Pedro II, os trilhos de uma ferrovia ainda não chegaram a Cuiabá, pois o projeto inicial foi mudado para atender ao Acordo de Roboré, entre o Brasil e a Bolívia. Os trilhos foram direcionados de Campo Grande para Santa Cruz de La Sierra, passando por Corumbá. Agora, a Ferronorte já está em Alto Araguaia, mas nem tudo está fácil para atingir Rondonópolis e daí Cuiabá. Mas algum dia a Ferronorte chegará à Capital de Mato Grosso. Já estivemos bem mais longe e tudo deu certo.



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