segunda-feira, 28 de maio de 2012

MISÉRIA E FOME NA CAATINGA DO NORDESTE

A IDÉIA DE CICLO OU DE “ ETERNO RETORNO ” EM VIDAS SECAS José Marcos Barros Devillart (UERJ) Renata Furtado Simião (UERJ) Graciliano Ramos e história das Vidas Secas A idéia de escrever os capítulos como se fossem contos era um artifício utilizado pelo escritor pra ganhar mais dinheiro , publicando-os isoladamente em jornais e revistas à medida que os produzia. Francisco de Assis Barbosa ao vasculhar os originais , comprovaria a ausência de seguimento na narrativa . “ Baleia ”, o nono capítulo , foi escrito em 4 de maio de 1937. Um mês depois escreveria “Sinha Vitória ”, o quarto capítulo . E “ Mudança ”, o primeiro na ordem de apresentação , só seria escrito em 16 de julho do mesmo ano . Depois de todos os episódios reunidos, Graciliano ordenou-os para a publicação. Por isso , alguns acham Vidas Secas um romance “desmontável”. Essa idéia será retomada ao falarmos, propriamente, sobre o “ eterno retorno ”. Graciliano faz uma conexão entre passado – os anos de seca na sua infância , em Buíque (PE) – e o presente – fim da década de 30 – em que se intensifica a migração interna do nordeste para o Sul . “O sentimento da terra nordestina é o fio condutor da narrativa , materializado nos ásperos e cruéis embates do homem com a natureza da região ”. (O velho Graça , p. 163) A respeito de romance , Graciliano falaria tempos mais tarde : O que me interessa é o homem , o homem daquela região aspérrima . Julgo que é a primeira vez que esse sertanejo aparece em “ literatura ” – vale a pena lembrarmos da diferença existente entre este sertanejo e o sertanejo romântico, o herói , de José de Alencar. – Os romancistas do Nordeste têm pintado geralmente o homem do brejo . É o sertanejo que parece na obra de José Américo e José Lins. Procurei auscultar a alma do ser rude e quase primitivo que mora na zona mais recuada do sertão , observar a reação desse espírito bronco ante o mundo exterior , isto é, a hostilidade do meio físico e da injustiça humana . Por pouco que o selvagem pense – e os meus personagens são quase selvagens – o que ele pensa merece anotação. Foi essa pesquisa psicológica que procurei fazer ; pesquisa que os escritores regionalistas não fazem nem mesmo podem fazer ; porque comumente não conheceram o sertão , não são familiares do ambiente que descrevem. (O velho Graça , p. 163) Curiosa foi a escolha do título . A gráfica chegaria a compor O mundo coberto de penas , o mesmo nome do nono capítulo . Mas acabaria mudando. Um dos amigos sugerira Vidas amargas; Graciliano pensara em Fuga , nome de um outro capítulo , mas seria de Daniel Pereira , irmão de José Olympio o palpite vencedor: Graciliano, esse título , O mundo coberto de penas , não tem nada a ver com seu romance . Tinha que ser alguma coisa que retratasse melhor esses seus personagens , que têm umas vidas secas ... (O velho Graça , p. 165) Em março de 1938 Vidas Secas é lançado com bastante sucesso e com alguns sustos por parte dos críticos . Assustava, e ainda assusta-nos, a animalização de Fabiano, antropomorfização de baleia , a fome e a miséria no sertão nordestino. Um susto bom , de arte literária , que nos acorda para as dores de nossos irmãos . Do susto que nos deu, podemos concluir que Graciliano Ramos foi um humanista por excelência , belas são as palavras do seu grande amigo , Jorge Amado : “Graciliano parecia seco e difícil , diziam-no pessimista ; era terno e solidário , acreditava no homem e no futuro ”. (O velho Graça , p.319) A idéia de ciclo ou “eterno retorno” em Vidas Secas Assim este instante : ele já esteve aí uma vez e muitas vezes e igualmente retornará, todas as forças repartidas exatamente como agora : e do mesmo modo se passa com a instante que gerou este , e com o que é filho do de agora . Homem ! Tua vida inteira , como uma ampulheta , será sempre desvirada outra vez e sempre se escoará outra vez , - um grande minuto de tempo no intervalo , até todas as condições , a partir das quais vieste a ser , se reunam outra vez no curso circular do mundo . E então encontrarás cada prazer e cada amigo e inimigo e todas as coisas . Esse anel , em que és um grão , resplandece sempre outra vez . E em cada anel da existência humana em geral há sempre uma hora em que primeiro para um , depois para muitos , depois para todos , emerge o mais poderoso dos pensamentos , o pensamento do eterno retorno de todas as coisas : - é cada vez , para a humanidade , a hora do meio dia . (Nietzsche) O problema da seca nordestina, bem como as cheias no sul , vem se repetindo por vários anos . É algo previsível, já detectado, hoje em dia , pela meteorologia , que acontece a cada 13, 15 anos e dura , aproximadamente, de 2 a 3 anos . Tentaremos analisar este grande ciclo natural e outros pequenos anéis existentes em Vidas Secas , inseridos em um ciclo sócio-econômico. Vale lembrar que a ordenação dos capítulos deste romance é feita de acordo com o andamento da seca , contrapondo-se a noção “de romance desmontável”, difundida por alguns teóricos literários . Não existindo tal ordenação , talvez não existisse a forte idéia do ciclo da seca . Ciclo Mitológico Um dos fatores que nos faz afirmar que Vidas Secas não é um “ romance desmontável” é a associação que pode ser feita entre o romance e o “ ciclo mitológico ”. Todas as lendas da mitologia Grega e Latina relatavam cruzadas da raça humana, pois através de seus heróis as percebemos e interagimos com nossa própria consciência. Essas lendas, realizadas em forma de ciclo, são dividas em três etapas: Separação, Iniciação e Retorno. No romance em questão, notamos que a Separação ocorrera antes do primeiro capítulo, Mudança. Temos a certeza de que ela existiu através de relatos das memórias das personagens, primorosamente utilizados por Graciliano. Nesta etapa o herói se desliga da “mãe terra”, que o protege e sustenta, para lançar-se ao mundo a procura de uma vida melhor. Após a Separação , dá-se início ao “ rito iniciático”, caracterizado pela “energização” do herói : a família de Fabiano descansa sob um juazeiro [1], árvore similar ao salgueiro , símbolo detentor da fecundidade e imortalidade . Esta recarga de energia será necessária para que Fabiano e sua família tenham esperança em continuar lutando pela sobrevivência . A partir daí seguem-se os capítulos que testam os nossos heróis : Fabiano, Cadeia , Sinhá Vitória , O menino mais novo , O menino mais velho , Inverno , Festa , Baleia , Contas e O soldado amarelo . No penúltimo capítulo , O mundo coberto de penas , a premunição de que a seca voltará e o retorno àquela condição de incertezas os assombra . Nossos heróis atravessam o último capítulo , Fuga , e a última etapa do ciclo , o Retorno , que os levará novamente a primeira etapa , pois serão obrigados a peregrinar apenas com alguns de seus poucos sonhos , sem saber se completarão mais um ciclo de suas vidas . O Ciclo da Seca E se o estado deste instante esteve aí , então também esteve aquele que o gerou, e seu estado prévio , e assim por diante , para trás , – de onde resulta que também uma segunda , terceira vez ele estará aí – inúmeras vezes para frente e para trás . (Nietzsche) A idéia de ciclo nos remete à idéia de ação , ao movimento feito pela família de Fabiano fugindo da seca . Este movimento cíclico pode ser observado nos capítulos das extremidades , “ Mudança ” e “ Fuga ”. Fugas e mudanças aconteceram infinitamente para trás , e acontecerão infinitamente para frente . Eternamente retornarão os mesmos eventos . No primeiro capítulo encontraremos índices das “eternas fugas ” anteriores : Estavam no pátio de uma fazenda sem vida . O curral deserto , a casa do vaqueiro fechada, tudo anunciava abandono . Certamente o gado se findara e os moradores tinha fugido. ( Vidas Secas , p. 13). Ainda dentro do “ eterno retorno ”, Nietzsche nos fala do “ medo do mal ”. Mas o que seria o mal em Vidas Secas ? O mal , em nossa opinião , seria a consciência da impotência diante dos acontecimentos . Seria a aceitação da sina . Como se tudo retornasse como um merecido e eterno castigo . “A crença de que no mal há um bom sentido , significa renunciar a combatê-lo”. A grandiosidade da força deste ciclo é demonstrada nesta passagem : Entristeceu. Considerar-se plantado em terra alheia ! Engano . A sina dele era correr mundo , andar para cima e para baixo , à toa , como judeu errante . Um vagabundo empurrado pela seca , era hóspede que demorava demais , tomava amizade à casa , ao curral , ao chiqueiro das cabras , ao juazeiro que os tinha abrigado uma noite . ( Vidas Secas , p.20). No próximo trecho escolhido, a partir da descrição do espaço característico da seca , há o medo do mal que se aproxima. Teremos então a renúncia ao combate , o conformismo , e a submissão ao “ eterno castigo ”: castigo do passado , castigo do presente , castigo do futuro . Olhou a catinga amarela , que o poente avermelhava. Se a seca chegasse, não ficaria planta verde . Arrepiou-se. Chegaria, naturalmente . Sempre tinha sido assim desde que ele se entendera. E antes de se entender , antes de nascer , sucedera o mesmo – anos bons misturados com anos ruins . Talvez andasse perto . Nem valia a pena trabalhar . Ele marchando para casa , trepando a ladeira , espalhando seixos com alpercatas – ela se avizinhando a galope , com vontade de matá-lo. ( Vidas Secas , p.25) Como dissemos anteriormente , os capítulos foram ordenados , não sabemos se consciente ou inconscientemente , de forma a copiar o ciclo da seca . No capítulo sete , “ Inverno ”, temos o meio do romance , e ao que indica o meio do ciclo , com as chuvas torrenciais . De acordo com a simbologia, sete é o número da perfeição . Fabiano, Sinha Vitória , os meninos e Baleia , vivem momentos de glória , apesar dos contratempos trazidos pelas chuvas . Assim diz o narrador. Dentro em pouco o despotismo de água ia acabar , mas Fabiano não pensava no futuro . Por enquanto a inundação crescia, matava bichos , ocupava grotas e várzeas . Tudo muito bem . E Fabiano esfregava as mãos . Não havia perigo da seca imediata , que aterrorizava a família durante meses. ( Vidas Secas , p.68). A seca demoraria mais um pouco , porém , certamente , viria como um fantasma a perseguí-los. No capítulo 12, “ Mundo coberto de penas ”, vemos o perigo da seca avizinhando-se a família de Fabiano, índice de eterna fuga : “O mulungu do bebedouro cobria-se de arribações . Mau sinal , provavelmente o sertão ia pegar fogo ”. ( Vidas Secas , p.115) Em “ Fuga ”, último capítulo , como já era previsto nos capítulos anteriores , a seca chega , e com ela mais um ciclo de enorme sofrimento. Não resta mais nada a esta família , senão repetir o mesmo movimento dos antigos ocupantes da fazenda . Mas quando a fazenda se despovoar , viu que tudo estava perdido, combinou a viagem com a mulher . ( Vidas Secas , p. 123) Nietzsche também faz alusão à “ força da potência ”. Esta seria uma forma de atuar sobre o “ medo do mal ” que há de vir . Para ele , combater este medo significaria atuar previamente sobre ele – preveni-lo. E como se prevenir da seca ? Dentro da ficção , desejando o autor , pode-se inventar fórmulas mágicas para esta missão , mas não Graciliano. Isto seria ignorar o real . Seu propósito era relatar as mazelas do homem de sua terra – que é uma das características do romance nordestino de 1930; um romance ideológico. Então , como ele atuou sobre este medo ? No último capítulo , parecendo ouvir as citações de Nietzsche, o escritor incute a esperança em seus personagens . Esperança . Parece-nos que essa foi a única maneira de levá-los ao enfrentamento de mais um “ novo ” e aterrador ciclo . E talvez esse lugar para onde iam fosse melhor que os outros onde tinham estado . Fabiano estirou o beiço , duvidando. Sinha Vitória combateu a dúvida . Porque não haveriam de ser gente , possuir uma cama igual à de seu Tomás da bolandeira? (...). Com certeza existiam no mundo coisas extraordinárias. Podiam viver escondidos, como bichos ? Fabiano respondeu que não podiam. ( Vidas Secas , p.129) Não há, por enquanto , em nosso país , formas de atuação sobre este ciclo da natureza , mas há certamente , soluções diversas para se combater a fome que é gerada por ele . “... então encontrarás cada dor e cada amigo e inimigo e cada esperança ...” (Nietzsche) O Ciclo Sócio-econômico Quando se fala em Nordeste , vem imediatamente à lembrança a imagem de uma região de extrema miséria , sujeita a secas periódicas que dizimam os rebanhos e frustram as lavouras , provocando o êxodo e a morte por fome e sede . A seca é mais um fenômeno sócio-econômico do que meteorológico. Ela não é exatamente a ausência de chuvas , pois todos os anos chove nas caatingas sertanejas, o que a determina á a irregularidade das precipitações pluviométricas; ela é um fenômeno econômico resultante também da incapacidade do homem em se adaptar totalmente ao clima . Apesar do Nordeste possuir dois terços da população em situação de pobreza absoluta , ele não é apenas isso . Na verdade existem “ vários Nordestes ”, com características climáticas, humanas e culturais diferenciadas. No Romance Regionalista aqui analisado, Vidas Secas , podemos observar a crueldade imposta pela seca nordestina que ultrapassa os limites geográficos e seus males , definhando a vegetação e gerando diversos problemas como : a miséria , a ignorância e até mesmo o desespero . A crueldade descrita e desenvolvida nessa narrativa nos leva a várias reflexões , a começar pela análise semântica do título Vidas Secas , que traduz o tema por si mesmo , pois “ vidas ” no plural , sinônimo de existência , adjetivado por “ secas , áridas, esterilidade da terra ; daí, Vidas Secas transportar-nos para a impotência do homem diante da vida , da maneira como ela se apresenta a ele ”. Segundo Nietzsche, se o “ equilíbrio de forças ” fosse possível , já teria ocorrido e duraria eternamente , pois os desequilíbrios são gerados uns pelos outros , isto significa que a vida é como ...uma ampulheta , será sempre desvirada outra vez e sempre se escoará outra vez- um grande minuto de tempo no intervalo , até que todas as condições , a partir as quais vieste a ser , se reunam outra vez no curso circular do mundo . (Nietzsche) Este fato é exemplificado no ciclo vivido pela família de retirantes protagonistas do Romance , onde a seca os obriga a peregrinar pelo sertão , alojando-se na terra alheia , submetendo-se a autoridades opressoras e injustas como “o patrão ” e o “ soldado amarelo ”. Com o retorno da seca , a própria natureza os conduz, novamente sem rumo , com os urubus à espreita dos seus corpos : Estava direito ? Trabalhar como um negro e nunca arranjar carta de alforria !” (...) Sentia um ódio imenso de qualquer coisa que era ao mesmo tempo a campina seca , o patrão , os soldados e os agentes da prefeitura . Tudo na verdade era contra ele . (...) A lembrança das aves medonhas, que ameaçavam com os bicos pontudos os olhos de criaturas vivas , horrorizou Fabiano (...) ( Vidas Secas , p. 134) O desequilíbrio social é claro na relação : homem x mundo , pois Fabiano e a família estão constantemente oprimidos pela seca ou pelo medo dela, que á a manifestação da “ natureza má”, fora do controle do homem . Segundo Alfredo Bosi, “o realismo de Graciliano não é orgânico nem espontâneo , é crítico . O “ herói ” é sempre um problema : não aceita o mundo , nem os outros , nem a si mesmo .” Ora , Fabiano não aceita a seca , a autoridade , a exploração do governo , do patrão e do soldado amarelo , nem a própria posição brutal , desejava ser como o Sr. Tomás da bolandeira. Desta forma , o autor usa as “ tensões sociais ” como “ motor dos comportamentos ”, como podemos ver nos exemplos que se seguem: A não aceitação da seca (...) Era uma sorte ruim , mas Fabiano desejava brigar com ela , sentir-se com força para brigar com ela e vencê-la. ( Vidas Secas , p. 16) Formas de exploração (...) O soldado amarelo estava ali perto , além da grande , era fraco e ruim , jogava na esteira com os matutos e provocava-os depois . O governo não devia consentir tão grande safadeza . ( Vidas Secas , p. 35) Posição brutal Se não fosse aquilo ... Nem sabia. O fio da idéia cresceu, engrossou – e partiu-se. Difícil pensar . Vivia tão agarrado aos bichos ... Nunca vira uma escola . Por isso não conseguia defender-se, estar as idéias nos seus lugares (...). Enfim , contanto ... Seu Tomás daria informações . Fossem perguntar a ele . Homem bom , Seu Tomás da bolandeira, homem aprendido. Cada qual como Deus o fez. Ele , Fabiano, era aquilo mesmo , um bruto . ( Vidas Secas , p. 30) Reificação Pensou na família , sentiu fome . Caminhando , movia-se como uma coisa , para bem dizer não se diferenciava muito da bolandeira de Seu Tomás. ( Vidas Secas , p. 15) Bosi ainda acrescenta que sob o eixo da vida de Fabiano, a obra relata o destino de sua família em “ casulos de vida isolada que são os diversos capítulos ”, ou seja, a desagregação de suas vidas produzida pelo próprio meio : (...) E ela (Sinha Vitória ) se encolhia Num canto , e o marido noutro, não podiam estirar-se no centro . ( Vidas Secas , p. 47) (...) Apesar de ter medo do pai , chegou-se a ele devagar , esfregou-se nas perneiras , tocou as abas do gibão . ( Vidas Secas , p. 52) (...) Achava as pancadas naturais quando as pessoas grandes se zangavam, pensava até que a zanga delas era a causa única dos cascudos e puxavantes de orelhas . Esta convicção tornava-o desconfiado , fazia-o observar os pais antes de se dirigir a eles . ( Vidas Secas , p. 58) Retornando ao pensamento de Nietzsche, “ tudo é eterno , nada veio a ser : se houve um caos de forças , também o caos era eterno e retorna em cada anel .” Uma repetição que tende a ir além da saga de Fabiano e da família : (...) Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá . O sertão mandaria para a cidade homens fortes , brutos , como Fabiano, Sinha Vitória e os dois meninos . ( Vidas Secas , p. 134) Assim , os fatos iniciais , com suas sensações , desejos e ambições , tendem à repetição , na tentativa inútil de Fabiano e família estabelecerem-se num local que lhes propiciasse uma vida mais digna . Início : Um dia ... Sim , quando as secas desaparecem e tudo andasse direito ... Aquela hora Sinha Vitória devia estar na cozinha , acocorada junto à trempe, a saia de ramagens entalada entre as cochas, preparando a janta . Fabiano sentiu vontade de comer . Depois da comida falaria com Sinha Vitória a respeito da educação dos meninos . ( Vidas Secas , p. 15) Final : Pouco a pouco uma vida nova , ainda confusa se foi esboçando (...). Cultivaria um pedaço de terra . Mudar-se-iam para uma cidade , e os meninos freqüentariam escolas , seriam diferentes deles. ( Vidas Secas , p. 134) Ainda as Vidas Secas Há mais de sessenta anos , Graciliano Ramos escrevia Vidas Secas inspirado em imagens da infância somada à sua visão de adulto . O tempo passou, mas a cena ainda se repete: nuvens densas borram o céu , mas chuva que é bom , nada . E assim como as nuvens , as vidas seguem secas . Recentemente , por uma infeliz coincidência , vemos o retorno deste aterrorizante ciclo . Palmeira dos Índios , Alagoas, cidade da qual foi prefeito , bem como outras localidades do sertão nordestino, passa por uma das piores secas do século . Choveu menos da metade da média anual . Nenhum roçado vingou. O chão seco se abriu como ferida e vai virando areia , minando as vidas , espreitando a morte . Não há feijão para colher , nem milho , nem nada . Mas o sertanejo é bravo , não se entrega jamais . Na terra ruim da seca , ele planta a palma , um cacto que serve para alimentar o gado , e que muita gente come também . A eterna capacidade de sonhar nos revela a dignidade do sertanejo . Ela é tudo o que eles mais precisam no meio de tantas atribulações . Sempre foi assim . Por isso dizemos que Vidas Secas é um romance atual . Qual a receita para se viver assim ? A simples resposta vem destes mesmos personagens : contra a fome , a esperança . Contra o medo , a fé . Seguindo esta receita é que eles vão resistindo. Simples também é prever o seu destino : a seca sempre voltará. É um mal que parece não ter cura , transcendendo a atualidade de Vidas Secas e fazendo dele um romance eterno . Referências Bibliográficas Livro base RAMOS , Graciliano. Vidas Secas ; posfácio de Álvaro Lins, ilustrações de Aldemir Martins. 34ª ed. Rio : Record; São Paulo: Martins, 1975. Bibliografia de Apoio ALMEIDA, José Maurício Gomes de. O regionalismo nordestino de 30. In –––. A tradição regionalista no Romance Brasileiro . Rio de Janeiro : Achiamé, 1981. AULETE, Caldas . Dicionário contemporâneo da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro : Delta , 1958. BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira . 33ª ed. São Paulo: Cultrix, 1994. BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega , Vol. I, II e III. Petrópolis: Vozes , 1998. CÂNDIDO , Antônio. Ficção e Confissão . São Paulo: Martins, ensaio que abre a 6ª edição de Caetés . CARVALHO , J. e PEIXOTO, Vicente. Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Credilep, 1971. MORAES , Dênis. O velho Graça . Rio de Janeiro : José Olympio, 1992. NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. O Eterno Retorno . In –––. Os Pensadores . São Paulo: Nova Cultural, 1987. PINTO , Manuel da Costa . Os cárceres da linguagem . In: CULT, N° 42, Janeiro de 2001. Os caminhos da Terra . Julho , 1998, ano 7, nº 7. SANT` ANA , Affonso Romano de. Análise Estrutural de Romances Brasileiros . 6ª ed. Petrópolis: Vozes , 1984. -------------------------------------------------------------------------------- [1] Tanto o juazeiro quanto o salgueiro são árvores as família das Ramnáceas, isto é, possuem dois cotilédones , que são folhas embrionárias, carregadas de reservas nutritivas. COPYRIGHT AUTOR DO TEXTO

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Contador de visitas