sexta-feira, 8 de junho de 2012

DIREITO MEDIEVAL

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X-XIII)Examinaremos sucessivamente sete de seusaspectos mais importantes: “aruralizaçãodasociedade, o enrijecimento dahierarquiasocial, afragmentaçãodo poder central, o desenvolvimento dasrelações dedependência pessoal , a privatização dadefesa, aclericalizaçãoda sociedade, astransformações na mentalidade.O primeiro desses aspectos tinha raízes muitoantigas. No auge da civilização romana, as imensasconquistas territoriais e o conseqüente afluxo deriquezas provocaram [...] um grande crescimento donúmero de escravos, o enfraquecimento da camada depequenos e médios proprietários rurais e aconcentração de terras nas mãos de poucos indivíduos.Ora, aquela situação apresentava clarascontradições, pois o estoque de mão-de-obra escrava,base da economia, precisava ser constantementerenovado por novas conquistas. O Estado, dominadopelos cidadãos mais ricos, via seus rendimentosdecrescerem, porque os poderosos escapavam aosimpostos e os pobres não tinham condições de pagá-los. Ademais, era preciso fornecer pão e diversão àplebe urbana sem propriedades devidoàconcentraçãofundiária e sem emprego devidoàconcorrência dotrabalho escravo - para se camuflar o problema social.Assim, não havia condições econômicas e sociais deprosseguirem as conquistas. Em outros termos, osistema escravista e imperialista não podia maiscontinuar a se auto-reproduzir. Era a crise. [...]Os mais ricos se retiravam para suas grandespropriedades rurais(villae),onde estariam mais segurose onde poderiam obter praticamente todo o necessário.É muito significativo que o Estado tenha precisado,através de legislação específica, impedir que os próprioselementos encarregados da administração municipal(curiales)abandonassem as cidades. Ilustração 1: A villa, coração do latifúndio romano. Colocava-se, então, a questão da mão-de-obra rural,que foi solucionada por um regime de tripla origem, queatendia ao interesse dos proprietários em ter maistrabalhadores, ao interesse do Estado em garantir suasrendas fiscais e ao interesse dos mais humildes porsegurança e estabilidade. Desse encontro nasceu aimportante instituição do colonato.De fato, as crescentes dificuldades em se obtertanto mão-de-obra escrava (devido aos problemas deabastecimento) quanto livre (devido ao retrocessopopulacional) punham em xeque as possibilidades de ogrande proprietário explorar suas terrasproveitosamente. Buscou-se então um novo sistema.Por este, a terra ficava dividida em duas partes: areserva senhorial e os lotes camponeses. Estes loteseram entregues a indivíduos em troca de uma parcelado que eles aí produzissem e da obrigação detrabalharem na reserva senhorial sem qualquer tipo deremuneração. Tudo que era produzido na reserva cabiaao proprietário.Para o Estado, vincular cada trabalhador a um lotede terra representava melhor controle do fisco imperialsobre os camponeses e uma forma de incentivar aprodução. Para os marginalizados sem bens ouocupação e para os camponeses livres, trabalhar nasterras de um grande proprietário significava casa,comida e proteção naquela época de dificuldades eincertezas. Para os escravos, receber um lote de terraera uma considerável melhoria de condição. Para o seuproprietário, era uma forma de aumentar aprodutividade daquela mão-de-obra e ao mesmo tempobaixar seu custo de manutenção, pois os escravosestabelecidos num lote de terra(servi casati)deixavamde ser alimentados e vestidos por seu amo,sustentando-se a si próprios.Assim, por um aviltamento da condição dotrabalhador livre e por uma melhoria da doescravo, surgia o colono. Sua situação jurídica, jádefinida no século IV, expressava nitidamente aruralização da sociedade romana.Ele estavavinculado ao lote que ocupava, não podendo jamais abandoná-lo, mas também não podendo ser privado dele pelo proprietário. A terra nãopoderia ser vendida sem ele, nem ele sem a terra. Asobrigações que ele devia não eram leves, mas estavamclaramente fixadas e não poderiam ser modificadasarbitrariamente pelo latifundiário. Em suma, ocolonusera juridicamente um homem livre, masverdadeiro escravo da terra.Naturalmente o colonato não era um fenômenoisolado, mas fazia parte de um processo mais amplo -segundo aspecto a considerar -de enrijecimento dahierarquia social . Enquanto na Roma clássica ocritério fundamental de diferenciação social era aliberdade, a partir do século III a condição econômica ea participação nos quadros diretivos do Estado eramdecisivas. Mais ainda, desde o século IV estabeleceu-sea vitaliciedade e hereditariedade das funções,quebrando a relativa mobilidade anterior e levandomesmo alguns historiadores (como Ferdinand Lot) afalarem em "regime de castas". Da mesma forma quese vinculara os camponeses à terra, também sevinculou os artesãos de cada especialidade a umacorporação(collegia)submetida ao controle estatal.Ora, como as camadas médias urbanas e ruraistendiam a desaparecer, crescia a distância social entre aaristocracia latifundiária e/ou burocrática e a massadependente em diversos graus. [...] A penetração dos bárbaros germânicos não alterouesse quadro, pelo contrário. De fato, a quebra daunidade política romana acentuava as tendênciasregionalistas daquela aristocracia e reforçava seusprivilégios. A vida e a população urbanas, emdecadência desde o século III, continuaram a evoluirnesse sentido, mesmo sem ter esse processo sidoacelerado pelas invasões do século V, como seria pelasdo século IX. As camadas humildes também nãotiveram sua sorte alterada, pois os invasores demaneira geral mantiveram as estruturasanteriores.Mais ainda, a própria sociedade germânica logoapós sua instalação no Ocidente começou a passar portransformações profundas. Nem poderia ser diferente,devidoàsua inferioridade cultural e numérica frente aomundo romano dominado: por volta do ano 500, noslimites do antigo Império Romano do Ocidente,havia um milhão de bárbaros numa populaçãototal de 30 milhões.Em função disso, aquelastransformações sociais germânicas convergiam para amesma polarização que a sociedade romana vinhaconhecendo há tempos. O processo teve início quandoos conquistadores impuseram a velha instituição dahospitalitasaos proprietários romanos, expropriandoparte de suas terras (geralmente um terço).Na maioria das vezes aquelas áreas caíram em mãosde membros da aristocracia germânica, que nelasestabeleciam, além de escravos, homens livres de suatribo como rendeiros ou mesmo pequenos proprietários.Contudo, com o tempo, seguindo a lógica da evoluçãosocial da época, aqueles homens livres acabavam porentrar em algum tipo de dependência. Portanto, associedades romana e germânica, passando a terestruturas semelhantes e identidade de interesses aonível das aristocracias, puderam aos poucos ir sefundindo numa nova sociedade.O terceiro aspecto da gênese feudal, afragmentação do poder central , resultava daqueleestado de coisas. Com a ruralização, a tendênciaàauto-suficiência de cada latifúndio e as crescentesdificuldades nas comunicações, os representantes dopoder imperial foram perdendo capacidade de açãosobre vastos territórios. Mais do que isso,os próprioslatifundiários foram ganhando atribuiçõesanteriormente da alçada do Estado. Por exemplo,em princípios do século V os colonos foram desligadosda autoridade fiscal do Estado, que era delegada aoproprietário da terra.As invasões germânicas, por sua vez, quebraramdefinitivamente a frágil unidade política do Ocidente doséculo V. Estabelecia-se assim o pluralismo que desdeentão jamais deixaria de caracterizar a vida políticaeuropéia. Porém, mais importante que isso é o fato deque em cada reino germânico continuavam a semanifestar as mesmas tendências centrífugas da épocaromana. A formação de uma aristocracia fundiáriagermânica, como vimos, contribuía para tanto. Isso erareforçado ainda pela decadência da economia comerciale monetária, quelevava os reis bárbaros aremunerarem seus colaboradores com a únicaverdadeira riqueza da época, terras. Contudo, destaforma os reis iam pouco a pouco se empobrecendo e seenfraquecendo. Falando do monarca franco da dinastiados merovíngios, um cronista afirmava que "excetoesse inútil título de rei, (...) ele nada possuía de seualém de uma única terra de baixo rendimento, que lhe proporcionava uma habitação e um pequeno número de servidores".De fato, os reis merovíngios remuneravam seusservidores entregando a cada um deles uma extensãode terra a título debeneficium.Ou seja,concedia-se ousufruto (e não a plena propriedade) de um bemimóvel em troca de determinados serviços prestados.Tal concessão era feita vitaliciamente, mas comoquase sempre era renovada em favor do herdeiro doconcessionário falecido, com o tempo tendia a se tornarhereditária. Desta forma, o concessor perdia aos poucos ocontrole sobre os benefícios cedidos e portanto sobre ospróprios servidores assim remunerados. [...]Muitas vezes,o detentor de um benefício recebiaum importante privilégio, que esvaziava ainda maiso poder real, a imunidade(immunitas).Por ela,determinados territórios ficavam isentos da presença defuncionários reais, que ali não poderiam exercer nenhumade suas funções. Assim, o imunista tornava-se detentor depoderes regalianos, isto é, inerentes ao rei, podendo nosseus domínios exercer as correspondentes funçõesadministrativas, aplicar justiça, realizar recrutamentomilitar, cobrar impostos e multas. Apesar de mais antiga,essa instituição foi melhor definida e generalizou-se notempo de Carlos Magno, quando foi estendida a umasignificativa parcela dos territórios de seu império.Contudo, apesar do grande número de benefícios e deimunidades concedidos, o poder de Carlos Magno erainquestionável. Mas ele baseava-se em seu prestígiopessoal, de maneira que após sua morte os efeitosdesagregadores daquela política se fizeram sentir. Esobretudo após meados do séculoIX,quando o ImpérioCarolíngio foi dividido entre os netos do grandeimperador. Cada vez mais, então, mesmo as funçõespúblicas passaram a ser vistas como benefícios. Assim,os reis perdiam sua faculdade de nomear e destituir seus representantes provinciais (condes, duques,marqueses), cujos cargos tornavam-se bens pessoais e hereditários. Em suma, ocorria um recuo dasinstituições públicas, ou melhor, sua apropriação por partede indivíduos que detinham grandes extensões de terra enelas exerciam em proveito próprio atribuiçõesanteriormente da alçada do Estado.O quarto aspecto -o desenvolvimento das relaçõesde dependência pessoal - era o resultado lógico daquelequadro de isolamento dos grupos humanos (devido àruralização), de crescimento da distância social e dafraqueza do Estado. Aliás,é próprio dos momentos deinsuficiência das relações sociais dentro do Estado,da tribo ou da linhagem, que alguns busquem segurança e sustento junto a indivíduos mais poderosos, e outros busquem prestígio e poder junto a um grupo de dependentes. Mesmo na Romaclássica, apesar da existência de um Estado forte - ouexatamente para fugir a ele - indivíduos de origemhumilde colocavam-se sob o patronato de um poderoso,tornando-se seusclientes. Em troca de ajuda econômicae proteção judiciária, os clientes apoiavam seus protetoresnas assembléias políticas e prestavam diversos pequenosserviços.Apesar de derivado da instituição da clientela, o patrocinium potentiorumdos últimos tempos do ImpérioRomano criava laços de dependência muito mais fortes.[...] Para fugir ao Estado opressor e ao fisco insaciável,muitos camponeses livres entregavam sua terra a umindivíduo poderoso, colocando-se sob o seu patronato.Assim, ao retirar aqueles homens da órbita do Estado, oslatifundiários tendiam a transformá-los em colonos e a diminuir a soberania do Estado. [...] O ato jurídico peloqual uma pessoa se colocava assim sob a proteção e aautoridade de outra era a recomendação (commendatio).Todavia, a instituição que mais sucesso teria nessedesenvolvimento das relações de dependência pessoal foiavassalagem. Sua larga difusão deu-se desde CarlosMagno, pois como na verdade a autoridade do imperadordependia mais da fidelidade de seus servidores pessoaisdo que de sua soberania teórica, ele procurou estabelecere reforçar esses laços pessoais. Do termo célticogwas(rapaz, servidor) veio a forma latinizadavassus, e dodesdobramentogwassawl (aquele que serve),vassalus.Institucionalmente, foi então que à recomendação seacrescentou o juramento de fidelidade, ou seja, dacombinação dos dois atos nasciam as relações vassálicas.Concretamente, foi então que vassalidade e benefício seuniram, com o primeiro destes elementos tornando-secondição indispensável para a concessão do segundo. Emoutros termos,o benefício era a remuneração dovassalo (servidor fiel) e só um vassalo receberia umbenefício (termo mais tarde substituído por “feudo”). [...] Os monarcas carolíngios, ao incentivarema difusão dos laços vassálicos, pensavam reforçar seupoder: como eles tinham muitos vassalos, que por sua vezestabeleciam seus próprios vassalos, esta parecia ao reiuma forma de estender seu controle a todos os escalõesda sociedade.Contudo,o resultado foi oposto, pois muitasvezes os vínculos de um vassalo para com seu senhor levavam-no a defender os interesses deste enão os do rei . Como observou Ganshof, "a difusão dasrelações vassálicas acabou por subtrair, em larga medida,um grande número de homens livresàautoridade imediatado Estado". Mas, por outro lado, lembra o mesmo autor,aquelas relações mantinham um vínculo entre os grandessenhores territoriais e o rei, fornecendo "um elemento, eaté elemento capital, de resistênciaàcompleta dissoluçãodo Estado".Quinto aspecto das origens do Feudalismo:a privatização da defesa. Naturalmente, ele decorria detodos os aspectos anteriores, e tanto entre os romanosquanto entre os germanos havia antecedentes Ilustração 2: As invasões do século IX – vikings, sarracenos ehúngaros. institucionais: milícias particulares com laços dedevotamento pessoal ligando os guerreiros a seu chefe. Defato, desde o século IV,diante da fraqueza do Estado, oslatifundiários romanos montavam com grupos armados, osbucellarii,para preservar a ordem dentro de seus domíniose protegê-los do banditismo e de incursões bárbaras. Entreos germanos, coerentemente com sua civilização tribal ebélica, havia o companheirismo oucomitatus.Tratava-seaqui de um bando de guerreiros ligados por um juramentoao chefe, ao lado de quem deviam lutar até a morte, emtroca de seu comando e de uma parte do saque. Derivadosdesta instituição surgiram na época merovíngia osantrustiones,guardas pessoais do rei.No entanto, o grande fator responsável peloaceleramento do processo de privatização da defesa foramos ataques vikings, sarracenos e húngaros. Como sua faseaguda ocorreu após a divisão do Império Carolíngio e numcontexto de crescente fraqueza dos poderes públicos, aresistência aos invasores só poderia ser feita pelos condese outros efetivos detentores de poder em cada região.Além disso, os ataques de surpresa e a rapidez da retiradados invasores impediam que a lenta mobilização dosexércitos reais conseguisse sucesso.Para sobreviver, aEuropa católica cobriu-se de castelos e fortalezas. Afragmentação política completou-se, pois aregionalização da defesa era uma necessidade.Outro aspecto a considerarmos é aclericalização da sociedade, uma das mais profundas transformaçõesocorridas no Baixo Império Romano. Esse fenômenoacompanhava os progressos do cristianismo, acentuando-se a partir do séculoIV com a vitória definitiva dessareligião. É verdade que o velho paganismo greco-romanopossuíra uma camada sacerdotal, mas jamais ela chegou ase organizar institucionalmente, a constituir uma Igreja.Daí sua limitada importância social. Pode-se assim falar, apartir da cristianização do império, em clericalização dasociedade em dois sentidos: quantitativamente, porque aproporção de clérigos em relação ao conjunto dapopulação torna-se muito superioràque existira nopaganismo ou mesmo que viria a existir em outrassociedades; qualitativamente, porqueo clero torna-seum grupo social diferenciado dos demais, possuidor de privilégios especiais e de grande poderio político-econômico” (FRANCO Jr., Hilário.O Feudalismo. 6a. ed.São Paulo: Brasiliense, 1987. Grifos nossos). Ilustração 3: O poder clerical: São Pedro,escultura em bronze de Arnolfo di Cambio, c.1300. 2. O Direito e as Justiças na Europa Feudal “Como é que os homens eram julgados? Não hámelhor pedra de toque do que esta para um sistemasocial. Interroguemos, portanto, acerca deste assuntoa Europa das proximidades do ano mil. Logo aoprimeiro exame, alguns traços, que dominamsuperiormente o pormenor jurídico, ressaltam numvivo relevo.Em primeiro lugar, o prodigiosoretalhamento dos poderes judiciários, e tambémo seu entrelaçamento. Finalmente, a suamedíocre eficácia.Numerosas cortes eramchamadas a resolver, a par, as mais graves questões.Entre elas, certamente, algumas regras fixavam, nateologia, a divisão das competências. Mas não semque ficasse aberta a porta para constantes incertezas.Os processos dos senhores, tal como chegaram aténós, abundam em documentos relativos àscontestações entre justiças concorrentes. Semesperança de saber perante qual autoridade deviamapresentar os seus litígios, os queixosos, muitasvezes, arranjavam-se de modo a constituíremárbitros por sua iniciativa, ou preferiam um acordoamigável em vez da sentença: com o risco, aliás, nacontinuação, de o não respeitarem. Incerto quanto aoseu direito, incerto quanto à sua força, o tribunal nemsempre desdenhava exigir, antecipadamente ou logoem seguida, o acordo das partes com a sua sentença.Se se tinha obtido uma decisão favorável, para afazer executar, com demasiada freqüência, não haviaoutro recurso senão conciliar-se com um adversáriorecalcitrante. Numa palavra, era agora ou nunca omomento de lembrar que a desordem pode ser, à suamaneira, um grande fato histórico. Um fato, noentanto, que tem de ser explicado. Visivelmente,aqui, ele estava ligado, em larga medida,àcoexistência de princípios contraditórios, osquais, provenientes de diversas tradições, eobrigados, além disso, a adaptar-se, mais ou menosdesajeitadamente, às necessidades de uma sociedadeeminentemente móvel, se entrecruzavamcontinuamente. Mas essa desordem também tinha asua origem nas condições concretas que o meiohumano impunha ao exercício da justiça.Nesta sociedade que tinha multiplicado as relaçõesde dependência, qualquer chefe - e Deus sabe comoeles eram numerosos - desejava ser juiz. Pois só odireito de julgar permitia conservar eficazmenteno dever os subordinados e, enquanto impediaque eles se deixassem submeter às sentençasde tribunais estranhos, fornecia a maneira mais segura de os proteger e de os dominar, aomesmo tempo. Pois este direito também eraessencialmente lucrativo. Não só comportava acobrança de multas e de despesas de justiça, mastambém os proveitosos rendimentos dasconfiscações; além disso, mais do que qualqueroutro, propiciava esta transformação dos usos emobrigações, da qual os senhores retiravam tantosproveitos. Não foi de modo algum, por acaso, que apalavra justiciaviu por vezes a sua aceitação alastraraté ao ponto de dedesignar o conjunto dos poderes senhoriais. Em verdade, existia aqui, sobmuitos pontos de vista, a expressão de umanecessidade comum a quase toda a vida de grupo:até nos nossos dias, qualquer patrão, na suaempresa, qualquer comandante de tropa, não será, de certo modo, um juiz? Mas os seus poderes, a estetítulo, têm como limite uma esfera de atividade bemdeterminada. Ele julga, deve julgar o operário e osoldado, apenas nessa qualidade. O chefe dostempos feudais visava mais longe, visto que osvínculos de submissão tendiam então para atingir ohomem por inteiro.Exercer a justiça, não era, aliás, na época feudal,uma tarefa muito complicada. Evidentemente que erapreciso ter alguns conhecimentos de direito. Onde oscódigos escritos existiam, esta ciência equivalia asaber mais ou menos de cor, ou a mandar ler, asregras, por vezes numerosas e pormenorizadas, masdemasiado rígidas, para dispensarem, largamente,qualquer esforço de pensamento pessoal. Se ocostume oral, pelo contrário, tinha relegado o texto,bastava ter alguma familiaridade com esta tradiçãodifusa. Finalmente, de qualquer modo, convinhasaber os gestos prescritos e as palavras necessárias,que encerravam os trâmites num espartilho deformalismos. Trabalho de memória, em suma, tudoisto, e de prática.Os meios de prova eramrudimentares e de fácil aplicação. O emprego dotestemunho, mediocremente freqüente, limitava-seao registo dos depoimentos, mais do que à suaanálise. Tomar nota do conteúdo de um documentoautêntico - este caso, de resto, foi raro durantebastante tempo -, aceitar o juramento de uma daspartes ou o dos ajuramentados, verificar o resultadode um ordálio ou de um duelo judiciário - estedivulgava-se cada vez mais, com prejuízo das outrasformas do julgamento divino -: semelhantes funçõesnão exigiam qualquer preparação técnica. Os própriosprocessos incidiam apenas sobre matérias pouconumerosas e sem subtilezas. A anemia da vidacomercial reduzia ao extremo o capítulo doscontratos. Quando, em certos meios especiais, seassiste ao desenvolvimento, de novo, de umaeconomia mercantil mais ativa, a incapacidade deque o direito comum, tal como os tribunais habituais,dava provas, face a semelhantes debates, fez comque, cedo, os comerciantes os solucionassem entreeles, primeiro mediante arbitragens não-oficiais, maistarde por meio de jurisdições próprias. A «saisine»- isto é, a posse sancionada pelo usocontinuado -, os poderes sobre as coisas e sobre os homens: era este o objecto constantede quase todos os litígios.Juntamente, como éóbvio, comos crimese os delitos. Mas, neste caso,a ação dos tribunais era, na prática, singularmentelimitada pelavingança privada. Em resumo,nenhum obstáculo intelectual impedia que qualquerpessoa que dispusesse do poder indispensável, outivesse recebido tal incumbência, se arrogasse aqualidade de juiz.Ao lado dos tribunais ordinários, existia, porém,um sistema de tribunais especializados: os da Igreja. Entenda-se: da Igreja no exercício da suamissão peculiar. Pois os poderes judiciários que osbispos e os mosteiros possuíam sobre os seusdependentes, na sua qualidade de senhores deespada, não cabiam, naturalmente, na rubrica da jurisdição autenticamente eclesiástica. O campo deação desta era duplo, pois tinha em vista atingirtodas as pessoas marcadas pelo sinal sagrado:clérigos e monges. Além disso, a jurisdiçãoeclesiástica tinha anexado, mais ou menos, certosdelitos ou atos que, ainda que cometidos por de 32 Deixe um Comentário Comentários não devem ser em branco Você deveConectado para deixar um comentário.ApresentarCaracteres:400 Comentários não devem ser em branco Você deveConectado para deixar um comentário.ApresentarCaracteres:...Livro Direito Medieval Download ou Imprima 181 LidosInformação e Avaliação Categoria: Sem categoria Classificação: Data de envio: 10/03/2011 Direitos Autorais: Attribution Non-commercial Tags: Este documento não tem etiquetas. Sinalizar documento para conteúdo inadequado Este é um documento particular. Carregado por MilenaAggio Seguir DescarregarInserir DocCopiar LigaçãoAdicionar a ColeçãoComentáriosReadcastAÇÃO× Compartilhe em Scribd:Readcast BuscarTIPPressione Ctrl-F⌘Fpara uma busca rápida no documento BuscarHistórico de Busca: Buscando Resultado00 de0000resultado para resultado para p. 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