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Print version ISSN 0009-6725
Cienc. Cult. vol.61 no.1 São Paulo 2009
BERLIM
Preciosidades botânicas do Brasil em exposição
As sensações da visita à exposição temporária Brazilian Nature - Mystery and Destiny, ocorrida no Museu Botânico, em Berlim (Alemanha), de 5 junho a 14 de setembro de 2008, e promovida pela Fapesp, pelo governo de São Paulo, pela Freie Universität Berlin e pelo Botanischer Garten e Botanisches Museum Berlin-Dahlem, são expressões de dois percursos: se escolher atravessar o Jardim Botânico, será um viajante, que passeia por entre as coleções botânicas, caminhando por canteiros, estufas e identificações de plantas de diversas partes do mundo; se escolher seguir diretamente para o prédio do museu, ao atravessar a porta principal encontrar-se-á em um gigantesco herbário, em geral com modelos e "amostras" confeccionados em plástico — a alusão ao herbário é muito mais associada à arquitetura do prédio, com seus vários corredores que são, analogamente, gavetas e estantes da coleção que guarda a história natural. O Museu Botânico é considerado um aparato expositivo complementar ao Jardim Botânico; arquitetonicamente os dois espaços são, inclusive, contíguos. No Museu, a intenção é que, em especial com o uso de modelos, seja possível olhar os detalhes morfológicos de diferentes vegetais.
Viajantes e coleção são figuras cheias de sentidos para as representações a respeito de natureza com as quais nos educamos na escola, na literatura, no cinema e, com bastante ênfase, nos museus e outros meios de divulgação e popularização da ciência. Tem sido destacado na literatura especializada o papel das exposições como dispositivos pedagógicos que, ao mesmo tempo, comunicam e nos identificam: ou seja, a pergunta sobre a quem se destina a exposição é fundamental, e as respostas só podem ser encontradas se considerarmos os contextos culturais da sua apresentação.
As exposições permanentes do Museu Botânico de Berlim contam-nos histórias da natureza tendo como referência o trabalho dos viajantes e colecionadores nacionalistas, como Linnaeu ou Humboldt, cujos objetos pessoais e de trabalho no campo ou na descrição dos espécimes mesclam-se a desenhos, gravuras, registros escritos, diagramas e, em alguns casos mais recentes, fotografias.
O material selecionado para compor a exposição são imagens impressas em 37 painéis que foram concebidos com base nos dados provenientes de três projetos apoiados pela Fapesp: a "Flora Brasiliensis on-line e revisitada", a "Flora fanerogâmica do estado de São Paulo" e o programa Biota-Fapesp. São painéis distribuídos nas paredes laterais das escadas que dão acesso ao primeiro e ao segundo piso. As imagens da exposição podem ser vistas no site: http://www.fapesp.br/publicacoes/braziliannature/index.php. Num misto de natureza brasileira exuberante, rica e misteriosa, a composição num mesmo painel de fotografias recentemente produzidas e de gravuras da Flora Brasiliensis — produzida entre 1840 e 1906 pelos editores Carl Friedrich Philipp von Martius, August Wilhelm Eichler e Ignatz Urban — é destacável. A insistência em aproximar imagens de tempos cronologicamente diferentes confere sentidos e respaldam a idéia de preservação e conservação ambiental, assim como referenda o olhar meticuloso e original dos naturalistas alemães. Uma pergunta é inevitável: não é verdade que eles tinham mesmo razão? A exposição parece sugerir que se continue na direção que os registros dos naturalistas apontaram. De acordo com um dos primeiros painéis, "seguindo os passos do naturalista alemão [Martius], cientistas brasileiros trabalham hoje para completar esse inventário, identificando e descrevendo novas espécies da flora e, também, da fauna". É nessa dimensão de tempo como continuidade que o inventário da maior biodiversidade do planeta ganha sentidos políticos na atualidade e, com uma exposição, pretende-se tanto dar visibilidade às pesquisas nacionais, quanto estabelecer cooperação científica com a Alemanha.
A contextualização da natureza brasileira pelo viés dos naturalistas europeus participa de jogos de significação sobre ciência, tecnologias e produção de conhecimento que muito se aproxima da posição periférica, nas laterais, que se expressa tanto pelo lugar ocupado pela exposição quanto à quase unicidade de sua linguagem fotográfica. Se o visitante decidir não seguir na "escada da biodiversidade brasileira" e virar à esquerda, encontrará o mundo macroscópico da utilidade (para o bem e para o mal) de plantas de várias partes do mundo; em outro piso, encontrará quatro painéis sobre as novas tecnologias baseadas em biologia molecular que são as inovadoras pesquisas de um setor do Museu Botânico de Berlim. Se seguir pelas escadas, a riqueza de cores e formas da biodiversidade, assim como a relação entre o diverso e o único, encherão seus olhos.
Se o visitante ouvisse trechos da canção Você da autoria de Hekel Tavares e Nair Mesquita, poderia associar melodicamente as imagens à sensação da brejeirice do amor com que os sons da natureza brasileira se interiorizam em nós, pelos sentimentos do sertanejo. Um revés colonialista? Talvez.
Antonio Carlos Amorim
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