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A Venezuela e o plebiscito
Por Claudio Recco*
O plebiscito realizado em 15 de agosto de 2004 na Venezuela, visava manter ou tirar Hugo Chávez da presidência do país.
Plebiscito é um instrumento de decisão, no qual o povo vota, por sim ou por não, sobre uma propositura que lhe seja apresentada. Na Europa e nos EUA a população sempre é chamada a decidir sobre diversos temas.
A Venezuela
Praticamente nada se fala nos livros didáticos sobre a Venezuela, terra de Simon Bolívar. Bolívar foi importante para a independência de todo o norte da América do Sul, e se preocupou em garantir uma unidade mínima aos países recém independentes, conhecida como pan-americanismo que, em pouco tempo, se tornou símbolo de soberania e de contestação aos interesses estrangeiros na América, numa época em que a Inglaterra desenvolvia uma política expansionista.
O termo "bolivarismo" e a idéia de "revolução" estão presentes no discurso do presidente Hugo Chaves e relacionados á polarização da sociedade. Não podemos afirmar que seja uma polarização ideológica ou política. Existe um movimento a favor ou contra o presidente, sem qualquer consistência ideológica, mesmo porque não há, um projeto revolucionário, de mudanças estruturais e sim uma quebra de privilégios de setores tradicionais, mas que não garantem nenhuma forma de inclusão social.
Na oposição - diversos partidos e organizações não-governamentais, de trabalhadores e de empresários, e grupos de militares - há uma aliança política para a derrubada de Chaves e de sua política neopopulista. De outro lado há um grande movimento político a favor da permanência do presidente, porém é difícil detectar o grau de politização ou de manipulação da população pobre pela política assistencialista desenvolvida pelo governo. Os dois grupos procuram atrair a opinião pública a seu favor, e a adesão dos grupos privados de comunicação foi decisiva para a oposição a ampliar sua base de apoio por meio de uma campanha sistemática nos jornais e redes de rádio e televisão.
O movimento de oposição se organizado no final de 2001, contrário a um conjunto de leis aprovadas pelo governo, que teriam um "caráter socialista", atingiu grande envergadura em 2002, quando o presidente chegou a ser deposto, em um movimento efêmero, desestruturado, que não conseguiu formar um novo governo e permitindo a volta triunfal do presidente 48 horas depois.
Em janeiro de 2003 a popularidade de Chaves era de 25%, um índice baixíssimo, ou seja, a maioria da camada pobre não apoiava o governo, mas quer a continuidade do presidente no poder, fato explicado pelo discurso populista e pelo fosso que separa a nação entre ricos e pobres.
Desde 2001 se formaram grupos políticos conhecidos como "Círculos Bolivarianos", em tese grupos de discussão e de propaganda política governamental, que busca o apoio da camada pobre dos bairros periféricos, mas acusados de constituirem um grupo paramilitar.
Neopopulismo?
O populismo no Brasil ou Argentina existiu numa época de crise das oligarquias agrárias e do capitalismo internacional, devido á crise de 29 e pelos efeitos do final da Primeira Guerra Mundial.
Em uma comparação com o governo Chavés podemos encontrar algumas semelhanças, como o discurso nacionalista e anti-imperialista e a política assistencialista dirigida as camadas mais pobres; tanto no Brasil de Vargas, como na Venezuela atual, as relações com as grandes potências se mantiveram, em especial com os Estados Unidos. No entanto o populismo se caracterizou também pela política de conciliação de classes e com uma estrutura política autoritária.
Nesse sentido, a situação de Chavés é semelhante com a fase de crise do populismo no Brasil, quando as possibilidades de conciliação desapareceram, o governo busca atrair as massas populares e é acusado de "esquerdista".
No Brasil
No Brasil houve plebiscito em 1963 e 1993 para escolher forma e sistema de governo. Em 1963 acabou com o parlamentarismo que havia sido implantado após a renúncia de Jânio Quadros, restaurando o presidencialismo e os poderes de Jango. Em 1993 o plebiscito no Brasil se ateve a duas votações simultâneas, cumprindo uma determinação da Constituição de 1988, que havia estabelecido o prazo de cinco anos para a definição de forma e sistema de governo. Esse prazo fora definido como forma de possibilitar um amplo debate acerca dos temas propostos e garantir ao cidadão melhor condição de voto.
Não foi o que aconteceu. Deixado em segundo plano, o plebiscito mereceu atenção apenas no ano de sua realização, com a tradicional campanha no rádio e TV, nos horários eleitorais obrigatórios, perdendo o país uma grande chance de exercício da cidadania, com um resultado previsível, que manteve a república e o presidencialismo.
A Origem do plebiscito
O Plebiscito teve origem na Roma antiga, em 287a.C. através da Lei Hortênsia, que dava força de lei às resoluções da Assembléia da Plebe (plebis concilium). Leis anteriores já haviam ampliado os direitos da plebe, como o fim da escravidão por dívida, que garantiu a liberdade aos plebeus romanos, elemento determinante para a cidadania plena.
A maioria dos autores considera que a ampliação da cidadania somente foi possível por que, na mesma época, Roma iniciou a expansão sobre outras regiões e povos, dando origem a escravidão. Apesar da ampliação dos direitos dos plebeus, paralelamente foi ampliada a prática do clientelismo, que incorporou parte das comunidades conquistadas na Península Itálica, para as quais foi dado o direito de cidadania, como forma de cooptação.
* Texto do prof. Claudio Recco para o jornal HISTÓRIA EM MANCHETE
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