domingo, 17 de abril de 2011

10388 - MANICÔMIO JUDICIÁRIO

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Por Régis Moreira
15 de março de 2003
Nesta edição o Grupo do Jornal resolveu fazer uma matéria especial sobre justiça - até que ponto um portador de sofrimento mental pode ser punido pela lei. A partir daí, começamos a pautar várias formas de abordar o assunto, e nossa primeira visita foi ao Manicômio Judiciário Presídio etc e tal.....

Dia 30 de outubro de 2001 partimos de Campinas, três profissionais e três usuários para a realização de nossa reportagem em Franco da Rocha/SP. Lá chegamos e optamos por visitar a "Colônia Normativa Masculina" seguida da "Colônia Normativa Feminina". A Colônia de Desinternação Progressiva ficaria para uma próxima vez, pelo adiantado da hora. Logo seria servido o jantar e as grades do Manicômio fecham às 16:45h. Depois das visitas entrevistaríamos Odete Maria Vieira Lanzotti, Psicóloga há 23 anos naquela instituição e Diretora há 9 anos e pouco, como ela mesma define.

Fomos até a "Colônia Masculina", levados pela Psicóloga Telma, que nos deixou na companhia de Osvaldo, Chefe de Vigilância e Diretor Substituto de Núcleo de Segurança.

Antes de entrar nos pavilhões deixa-se tudo, telefones celulares, bolsas, aparelhos eletrônicos e sonhos. Parte-se para uma viagem desoladora. O prédio cinza/sujo/descascado por dentro, sai para um pequeno pátio, onde se recebem as visitas. Pudemos entrar nos pavilhões. Ao lado do portão de grades da entrada, o grito pichado "LIBERDADE JÁ", contrasta com a parede amarela.

Aqui vivem 393 homens. Vivem?!?!?!?! Duas pequenas árvores é o único verde do pátio todo cimentado. Ali pombos e presos e bitucas de cigarro disputam o espaço. Os pombos procuram os restos de alimentos famintos... mas eles podem voar. Os homens procuram por eles mesmos, identidades dilaceradas pelo desprezo e abandono. Eles não podem voar. Esperar, esperar, é o que fazem... O tratamento? - "Toma remédio de copinho", diz um deles. E este é o tratamento.

Quando entrei no primeiro pavilhão, um mal cheiro invadiu e a ânsia parecia ser inevitável. Com o passar do tempo, não é mais o mal cheiro que incomodava, mas os sonhos destruídos, os homens desrespeitados de seus direitos fundamentais, o abandono fedia mais...

Cada pavilhão possui uma média de 50 camas amontoadas, uma ao lado das outras. Vários varais servem de armário para as roupas. Roupas? Todas de uma mesma cor - cor de sujeira. A roupa de cama tem cor de sujeira, o chão, as paredes, o ar tem essa mesma cor... Os pertences (pertences?) são guardados debaixo da cama, os banheiros não têm vasos, não têm portas; cãezinhos de estimação são criados dentro dos quartos. Quartos? Não sei se posso dar esse nome praquele lugar. Um depósito, depósito de gente. Ali tudo parece tristeza. E no meio desse flagelo, um artista nos mostra sua obra - quadros de rostos coloridos em formas geométricas - lindos! Um oasis, o colorido que faltava.

Foi só a gente se identificar como jornalistas do Candura, e logo ficamos todos rodeados, queriam falar, tinham para quem falar. "- Pelo menos a gente desafa", conclui um entrevistado. O medo é sempre presente. O discurso dos entrevistados é um quando Osvaldo está por perto e muda completamente, quando ele se afasta.

É hora do jantar. Homens vão chegando sucessivamente com suas vasilhas improvisadas. Latas, potes de sorvete, qualquer pote... o suco é bebido em garrafas de refrigerante descartáveis cortadas ao meio. E é pros quartos que os homens trazem a refeição. Preferem o quarto ao refeitório. E comem em suas camas...

Este é manicômio é do Estado. Nós pagamos nossos impostos para o Estado administrar desta forma?!?!?!?!? Não é esse mesmo Estado que não aceita mais internações em hospitais psiquiátricos fechados?!?!?!?!? Cadê o Movimento da Luta Antimanicomial?!?!?!?!? Cadê a mídia que não denuncia essa máxima da violência?!?!?!?!?

A "Colônia Normativa Feminina" é bem melhor. Setenta mulheres dividem quartos de 4 ou 5 camas, paredes pintadas, pátio limpo, sem árvores, mas limpo... As mulheres tem até Psicóloga no quadro funcional! Como se isso fosse algum privilégio...

De volta a sala de Odete, num outro prédio, lá está ela, e nos pergunta como foi a visita. Como pode uma diretora conviver e suportar tanto abandono?!?!?!?!?!? Como pode domir a noite sem pensar na desgraça dos homens?!?!?!? Quanta resistência interior deve ter criado para suportar isso! Vítima?!?!?!? Será?!?!?!?!? Cláudia, uma das repórteres do Candura e participante da Oficina de Vitrais, em certo momento da entrevista se levanta e vai até a Sra. Odete mostrar a agenda nova que as oficinas de trabalho profissionalizante do cândido produziram para 2002. Fala sobre as oficinas, mostra fotos... Odete fica surpresa e quer conhecer o trabalho. É preciso com urgência transformar!

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