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Radiação e Radioatividade
Tipos de radiação
Na natureza, existem 92 elementos. Cada elemento pode ter quantidades diferentes de nêutrons. Os núcleos com mesmo número de prótons, mas que diferem no número de nêutrons, são denominados isótopos de um mesmo elemento. Para determinadas combinações de nêutrons e prótons, o núcleo é estável – nesse caso, são denominados isótopos estáveis. Para outras combinações, o núcleo é instável (isótopos radioativos ou radioisótopos) e emitirá energia na forma de ondas eletromagnéticas ou de partículas, até atingir a estabilidade.
Dá-se o nome genérico de radiação nuclear à energia emitida pelo núcleo. As principais formas de radiação são:
i) emissão de nêutrons;
ii) radiações gama, ou seja, radiação eletromagnética, da mesma natureza que a luz visível, as microondas ou os raios X, porém mais energética;
iii) radiação alfa (núcleos de hélio, formados por dois prótons e dois nêutrons);
iv) radiação beta (elétrons ou suas antipartículas, os pósitrons, cuja carga elétrica é positiva).
Nas ciências nucleares, a unidade de energia geralmente utilizada é o elétron-volt (eV). As energias emitidas pelo núcleo são acima de 10 mil eV, valor que é cerca de bilhões de vezes menor que o das energias com que lidamos no dia-a-dia. Uma bomba como a de Hiroshima contém apenas 20 kg de matéria-prima, aproximadamente.
A liberação de energia do núcleo se dá através de dois processos principais: decaimento radioativo (também chamado desintegração) e fissão.
Radioatividade Natural
Os danos que a radioatividade pode causar à saúde humana justificam as rigorosas normas de segurança adotadas nas atividades que usam a energia nuclear. Mas muitas pessoas podem estar sendo expostas, sem saber, a níveis elevados de radiação, por causa do acúmulo de elementos radioativos em resíduos de processos industriais.
Inúmeros países, inclusive o Brasil, realizam estudos sobre esse problema, visando reduzir ou eliminar os aumentos da radioatividade natural causados pelas tecnologias criadas pelo homem.
Tecnologia humana aumenta o risco de exposição
Toda a matéria existente no universo é constituída por átomos, que resultam de diferentes arranjos entre prótons, nêutrons e elétrons. Em função desses arranjos, os átomos adquirem propriedades físico-químicas bem definidas, que permitem identificar cada um deles como um elemento químico. No entanto, o mesmo elemento pode ocorrer em diferentes formas, denominadas isótopos, com comportamento químico idêntico. Isótopos de um mesmo elemento têm igual número de prótons, mas diferem no número de nêutrons, o que resulta em átomos mais ou menos instáveis.
A instabilidade dos átomos está associada a um excesso de energia acumulada, que tende a ser liberada sob a forma de radiações. Nesse processo denominado decaimento, o átomo livra-se do excesso de energia e torna-se mais estável. A radiação emitida pode ser pura energia eletromagnética ou conter ainda partículas saídas do núcleo do átomo. Quando há liberação de partículas, as propriedades químicas do átomo são alteradas e o elemento transforma-se em outro (figuras 1 e 2).
Os átomos que decaem, emitindo radiação, são conhecidos como radioativos.. Essa radiação (com ou sem partículas) é chamada de “nuclear” por se originar do núcleo do átomo, e os dois tipos têm em comum a capacidade de interagir com a matéria à sua volta, alterando sua estrutura. Células vivas expostas a essa radiação, por exemplo, podem ser destruídas ou alteradas, em geral levando a doenças.
A radioatividade é, assim, um processo natural, através do qual átomos instáveis evoluem em busca de configurações mais estáveis. O processo leva à transmutação de elementos químicos e à liberação de energia nuclear. Descoberto no final do século passado, o fenômeno foi desvendado e dominado pelos cientistas, e sua utilização disseminou-se, seja para benefício do homem (na medicina, por exemplo), seja com fins maléficos (caso das bombas nucleares). Desde sua descoberta, a radioatividade vem sendo associada ao aumento do câncer nas populações expostas tanto a fontes naturais quanto a fontes artificiais usadas de modo inadequado, ou em acidentes como a explosão do reator nuclear de Tchernobyl, na Rússia (1986), ou a abertura de uma cápsula de césio radioativo (137Cs) de uso medicinal em Goiânia (1987).
A proteção contra as radiações
A radioatividade pode ser nociva ao organismo humano, dependendo da intensidade ou da duração da exposição. Esse perigo já é bem conhecido, e os livros, a televisão e o cinema ajudaram a divulgá-lo. Mas o fenômeno também pode trazer importantes benefícios. Entre as aplicações pacíficas da energia nuclear estão, hoje, várias práticas médicas (como o tratamento do câncer e o diagnóstico de doenças) e pesquisas científicas (na bioquímica, na agricultura, na ecologia), além da produção de energia elétrica, a mais conhecida.
Em função dos riscos ligados à radioatividade, as atividades que envolvem o uso da energia nuclear são regulamentadas pela Comissão Internacional de Radioproteção (ICRP, na sigla em inglês), uma instituição científica independente. A ICRP estabeleceu em 1977 três novos princípios básicos, que devem ser obedecidos por todas as empresas ou instituições (públicas ou privadas), para garantir o desenvolvimento seguro dessas atividades, e desde então vem realizando estudos e fazendo recomendações para atividades específicas.
O primeiro desses princípios é a justificativa da prática. Nenhuma atividade que envolva exposições à radiação deve ser realizada, a menos que gere benefícios, aos indivíduos expostos ou à sociedade, que compensem os riscos associados à radiação. O segundo, a otimização, determina que, para qualquer fonte de radiação usada em uma atividade, a magnitude das doses individuais, o número de pessoas expostas e mesmo a eventualidade da ocorrência de exposições (quando não há certeza se isso acontecerá) devem ser mantidos no mais baixo nível razoavelmente aceitável, levando-se em conta os fatores sociais e econômicos. O terceiro princípio, a limitação de dose, diz que a exposição de indivíduos (em todas as práticas relevantes de uma atividade) deve obedecer a limites de dose ou a algum tipo de controle de risco, para assegurar que ninguém seja exposto a riscos considerados inaceitáveis.
Em conjunto, esses princípios significam que é aceitável desenvolver atividades que envolvem o uso da energia nuclear, desde que isso represente um benefício para o ser humano, sem que este incorra em riscos que possam ser evitados.
Os três princípios básicos acima constituem a base de atuação do Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD), vinculado à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão federal encarregado de regulamentar, normatizar e fiscalizar todas as práticas envolvendo o uso da energia nuclear no país. A finalidade do IRD, como órgão de referência na proteção contra os efeitos nocivos da radioatividade, é realizar pesquisas na área da radioproteção e dosimetria (medidas de doses radiológicas), além de apoiar técnica e cientificamente a CNEN nos processos regulatórios e de controle de práticas que impliquem o uso da radiação ionizante.
Um risco ampliado pelo homem
Os seres humanos também podem estar expostos à radioatividade em situações que não envolvem o uso da energia nuclear, e que por isso não estariam sujeitas aos princípios de controle e limitação de dose. São fontes de radiação os isótopos naturais de diversos elementos químicos, presentes no solo, no ar e mesmo em seres vivos (até no organismo humano). Em geral, a exposição a essas fontes não alcança níveis perigosos, mas certas atividades tecnológicas podem aumentar os riscos. Essa possibilidade vem sendo investigada há algum tempo.
A influência do homem sobre os níveis de exposição à radioatividade natural começou quando os ancestrais da espécie escolheram viver em cavernas e ampliou-se quando passaram a minerar e trabalhar metais e bens minerais. No primeiro caso, ao cobrir as entradas de cavernas com peles de animais, o homem primitivo reduziu a renovação do ar nesses ambientes, o que aumentou os níveis internos de radônio. Isso porque esse gás radioativo, produzido durante o decaimento do isótopo 238 de urânio (238U), é capaz de emanar das rochas onde é gerado.
Tal situação é semelhante à vivida por mineiros que trabalham em galerias subterrâneas: o urânio, sempre presente nas rochas (em níveis apreciáveis em alguns casos), constitui uma fonte permanente de radônio, que emana e se acumula dentro das galerias. Caso não exista um sistema de ventilação eficiente, os trabalhadores podem ficar sujeitos a níveis de exposição superiores aos recomendados pela ICRP. É significativa, o que reforça essa possibilidade, a associação entre os teores de radônio em minas subterrâneas e o número de casos de câncer em mineiros.
As indústrias do ciclo do combustível nuclear, incluindo lavra e beneficiamento de minério de urânio, enriquecimento desse elemento, reatores nucleares e plantas de reprocessamento são submetidas, no Brasil e no exterior, a um severo processo de licenciamento e controle. Isso as coloca, sem dúvida, entre as atividades industriais mais rigorosamente controladas. Vários avanços na área de segurança ocorridos no setor nuclear foram depois adotados pelo setor produtivo convencional (não nuclear). A percepção da opinião pública (às vezes equivocada) quanto aos riscos da energia nuclear certamente contribuiu para esse rigor no controle das instalações nucleares.
Agora, um tema que vem despertando muito interesse científico e social é a real possibilidade de ocorrência de exposições à radiação em função de atividades não-nucleares. De fato, materiais usados por diferentes tipos de indústrias não-nucleares (como matérias-primas e componentes de produtos, ou descartados nos processos produtivos) apresentam elevada radioatividade natural. Tais materiais são conhecidos internacionalmente pela sigla NORM (de naturally occurring radioactive materials, ou seja, materiais em que a radioatividade ocorre naturalmente). Os processos industriais a que tais materiais são submetidos podem aumentar a concentração de elementos radioativos (e, portanto, os níveis de radiação emitida) e a exposição de trabalhadores e indivíduos do público à radioatividade.
As pesquisas a respeito dos impactos radioativos associados às indústrias não-nucleares baseiam-se na hipótese de que, não sendo conhecidos os riscos a que os trabalhadores e a população estariam sujeitos em função dessas atividades, pode estar ocorrendo exposição inconsciente e indevida à radiação. Em resposta a essa possibilidade, órgãos governamentais e empresas públicas e privadas, em diversos países (desenvolvidos ou em desenvolvimento), vêm investindo em estudos científicos para definir a extensão do problema.
Esses estudos abrem a possibilidade real de adoção de normas sobre o uso industrial de materiais e processos com risco potencial de impacto radiológico e sobre a necessária recuperação de áreas ambientais afetadas por tais atividades. Também servem para alertar as empresas que utilizam tais materiais e processos, levando-as a buscar a tecnologia adequada para eliminar ou controlar esse impacto.
Problema potencial em vários setores
Um exemplo que abrange muitos setores industriais, em especial a siderurgia, é a queima do carvão mineral, que contém elementos radioativos como urânio e tório. Estima-se que, em todo o mundo, sejam queimadas por ano 2,8 bilhões de toneladas de carvão, liberando 9 mil toneladas de tório e 3,6 mil de urânio para o meio ambiente, nas partículas presentes na fumaça e nas cinzas descartadas. Com a queima, são multiplicadas as concentrações (nas cinzas) de elementos radioativos gerados pelo decaimento natural dos isótopos 238 de urânio (238U) e 232 de tório (232Th). Elementos voláteis como o radônio e o isótopo 210 de chumbo (210Pb) tendem a ser liberados na atmosfera.
Uma avaliação do impacto radiológico resultante da queima do carvão para gerar energia elétrica vem sendo realizada, no Reino Unido, pelo National Radiological Protection Board (NRPB), considerando várias vias de exposição: liberação de cinzas e radônio para atmosfera, descarte de cinzas, uso desse material como subproduto industrial e outras. Resultados preliminares indicam que as exposições mais elevadas resultam do emprego das cinzas na construção civil e que a liberação na atmosfera contamina a vegetação local.
A ocorrência de elementos radioativos naturais no petróleo e no gás natural também pode aumentar a exposição à radiação. Quando o óleo é extraído do subsolo, vem acompanhado de sólidos e de água. Sob certas condições, sais de bário e cálcio (sulfatos e carbonatos) sofrem precipitação, carregando com eles os isótopos 226 e 228 do rádio, ambos radioativos. Com o tempo, esses precipitados entopem os dutos, devendo ser removidos e depositados de modo seguro, para evitar exposições à radioatividade. O problema foi observado em plataformas marítimas de petróleo do Mar do Norte, na Europa, em 1981 (e estima-se que existam, em todo o mundo, cerca de 6 mil plataformas desse tipo). Até hoje, porém, as avaliações realizadas mostram que os trabalhadores sofreram baixos níveis de exposição e que o problema se concentra na emissão de efluentes para o mar.
A descarga no mar dessas e de outras águas de processos, contendo elevadas concentrações de elementos radioativos, pode fazer com que esses elementos se acumulem na cadeia alimentar marinha, até atingir altas concentrações no topo dessa cadeia (nos peixes). O consumo desses peixes (e outros animais) contaminados pode aumentar a exposição de seres humanos à radioatividade.
Entre as indústrias em que os problemas de exposição à radiação podem ser mais significativos destacam-se as do ciclo de lavra e beneficiamento de minerais. Isso porque alguns minerais, ao se formarem, incorporaram urânio e tório em proporções superiores à média da crosta terrestre. A extração e o processamento industrial alteram as condições físico-químicas que esses materiais apresentam na natureza, o que pode levar ao lançamento de parcelas significativas dos elementos radioativos no meio ambiente. Um exemplo é a drenagem ácida: a pirita (FeS2) presente nas rochas é oxidada quando exposta ao oxigênio e à água, resultando na produção de ácido sulfúrico (H2SO4). Esse ácido tem a capacidade de lixiviar (remover) da rocha grandes quantidades de metais (radioativos ou não), que podem contaminar águas superficiais (rios, lagos e estuários) e subterrâneas.
Mesmo que isso não aconteça, o próprio processamento de um minério pode concentrar ou mobilizar os elementos radioativos. O aumento da radioatividade natural em resíduos sólidos da mineração, efluentes líquidos e emissões gasosas, e também em produtos e subprodutos que venham a ser usados por outros setores industriais, pode resultar em maior exposição de trabalhadores e da população em geral.
O problema pode ocorrer em muitas indústrias de mineração, em especial as de carvão, nióbio, ouro, ferro, minerais pesados (como zircônio e terras raras). Também merece destaque a indústria de fosfato: na produção do ácido fosfórico (H3PO4) são obtidas grandes quantidades de fosfogesso, subproduto constituído basicamente por sulfato de cálcio (CaSO4). Dependendo das concentrações de urânio e tório na rocha fosfática, o fosfogesso pode apresentar grandes quantidades dos isótopos 226 e 228 de rádio. Apesar do risco, esse subproduto é geralmente armazenado em pilhas, nas proximidades das fábricas, e em alguns casos é despejado em cursos d.água. O problema é maior ainda porque o fosfogesso, como as cinzas do carvão, pode ser usado na construção civil e na agricultura (como fertilizante).
Quatro anos de estudos no Brasil
A preocupação com os riscos do aumento da exposição à radioatividade natural também está presente no Brasil. Por determinação da CNEN, o IRD vem coordenando um programa de pesquisa bastante amplo para avaliar a extensão do problema no país (em especial no setor mineral), definir linhas de investigação prioritárias e propor estratégias de atuação em função dos resultados obtidos. Em um sentido mais amplo, esses resultados, além de garantir proteção aos trabalhadores dos setores envolvidos e à população, contribuem para que o setor industrial não seja surpreendido pela adoção eventual de medidas de controle internas ou mesmo externas, como barreiras alfandegárias decorrentes da globalização da economia.
O programa de pesquisa, iniciado em 1996, inclui a avaliação de eventuais impactos da liberação de efluentes líquidos e gasosos por diferentes tipos de indústrias de mineração e dos riscos decorrentes de uma futura ocupação humana em áreas de influência de bacias de rejeitos e do uso de seus produtos e subprodutos por outras indústrias. Também é avaliada a exposição de operários nos locais de trabalho, incluindo determinação de elementos radioativos no organismo (em amostras de urina e fezes) e em aerossóis (partículas suspensas no ar), e do radônio acumulado nos locais de trabalho. Estuda-se ainda a viabilidade da alteração das rotas de processo e da recuperação econômica de resíduos, visando reduzir impactos ambientais.
Para estudar as implicações ambientais dessas atividades foi desenvolvida uma metodologia de trabalho que começa na análise detalhada do processo operacional da indústria. Todo o seu modo de operação é examinado, desde os balanços de massa até os sistemas de tratamento e disposição de rejeitos. A seguir, a presença de elementos radioativos e nãoradioativos é identificada em amostras colhidas ao longo do circuito operacional. Com esses resultados é feito o balanço de massa, que permite conhecer quanta radioatividade entra no processo industrial e em que volume e de que forma ela sai (se em produtos, rejeitos sólidos, efluentes líquidos ou gases).
Mas não basta medir as quantidades envolvidas no processo. É preciso saber que forma química têm os contaminantes potenciais: se estão facilmente disponíveis ou são mais resistentes aos processos físico-químicos atuantes no ambiente. A etapa seguinte é estimar, através de modelos matemáticos que simulam cenários possíveis, a concentração de poluentes nos compartimentos ambientais: águas de superfície, águas subterrâneas, sedimentos, peixes, vegetais potencialmente consumidos pelo homem, carne e leite. Tais dados, associados às taxas de consumo dos diferentes itens, permitem estimar a exposição humana à radioatividade.
Em função das exposições estimadas calculam se os riscos radiológicos à saúde humana. Os valores obtidos indicam a necessidade ou não de medidas de correção ou controle da disposição de rejeitos, emissão de efluentes e gases ou reaproveitamento de materiais. Essa metodologia também pode ser aplicada em situações onde outros poluentes (não radioativos) estão envolvidos no diagnóstico de impacto ambiental.
O processo operacional de uma indústria de lavra e beneficiamento de nióbio no Brasil (figura 3) permite exemplificar esse trabalho. As análises das amostras coletadas em cada etapa do processo evidenciaram o aumento da concentração de elementos radioativos nos resíduos da lixiviação (figura 4) e na escória (figura 5). Do ponto de vista gerencial, tais rejeitos devem ser separados dos demais e os locais onde serão depositados devem ser isolados de forma a evitar que qualquer pessoa (trabalhadores ou não) seja exposta à radioatividade. Um dado interessante é a concentração de urânio, em torno de 1.500ppm (partes por milhão), no material de lixívia, o que pode viabilizar seu aproveitamento como insumo para a produção de concentrado de urânio, a ser usado na geração de energia nucleoelétrica.
No caso dos efluentes liberados para o ambiente, o cálculo das doses revela que os impactos para os cursos d.água são irrelevantes. No entanto, as concentrações dos isótopos 226 e 228 de rádio nas águas subterrâneas afetadas pelas bacias de rejeito onde são despejados os resíduos da lixiviação não permitem a liberação dessas águas para o meio ambiente sem algum tipo de tratamento (figura 6). Assim, as práticas adotadas pela empresa bombeamento contínuo da água dessas bacias e seu tratamento com sulfato de cálcio (CaSO4) não deve ser interrompido.
Já em uma mineração de carvão investigada, o problema principal está no alto teor de urânio medido nas drenagens ácidas. A detecção de valores de radioatividade em torno de 100 becquerels por litro (Bq/l) nas águas resultantes dessas drenagens impede seu lançamento no ambiente sem qualquer tratamento, pois poderão expor a população a doses acima dos limites recomendados pela ICRP.
Cabe destacar ainda dois trabalhos de pesquisadores do IRD sobre o emprego do fosfogesso: como material de construção e como fertilizante agrícola. O primeiro demonstrou que a inalação do isótopo 220 do radônio e de seus descendentes de vida curta emanados das paredes de um cômodo em cuja construção o fosfogesso tenha sido usado como componente da argamassa (e ainda com baixa ventilação e sem proteção - tinta - nas paredes) exporia um morador a até 80% do valor de dose total. Esse estudo concluiu que, para os cenários de uso considerados, os valores de dose não seriam significativos, mas mostrou que a presença desse isótopo no fosfogesso pode ser um fator limitante para seu emprego na construção civil. O segundo estudo indicou que os valores de dose individual resultantes da ingestão de produtos cultivados com o fosfogesso como fertilizante não representam um aumento de risco que impeça esse uso, mesmo no caso de aplicações sucessivas durante 100 anos.
O futuro da radioproteção
O aumento da radioatividade ambiental provocado por atividades humanas é um tema sujeito a intensa investigação. Atividades antes insuspeitas podem ser vistas hoje como fontes potenciais de exposição. Por isso, vários trabalhos científicos têm sido publicados sobre esse assunto e vêm sendo desenvolvidas tecnologias de medida de radiação. Também estão sendo estudadas regulamentações para restringir os riscos associados a essas exposições. Todos esses aspectos, porém, ainda são debatidos intensamente na comunidade científica internacional.
Para ampliar a discussão dessa questão no país, o IRD e a Sociedade Brasileira de Biociências Nucleares (SBBN) realizaram no Rio de Janeiro, em setembro do ano passado, o 2º Technological Enhanced Natural Radiation Symposium (Simpósio sobre Radiação Natural Tecnologicamente Intensificada). Foram abordados, no encontro, aspectos relacionados ao monitoramento desses materiais, às técnicas de medida, à avaliação das exposições de indivíduos do público e trabalhadores, à experiência dos setores industriais, à recuperação de áreas contaminadas e à legislação sobre o problema.
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