PLATÃO – O “CRIADOR” DE MATEMÁTICOS
Carla Regina Gomes
Professora UFRRJ
Doutoranda PEN/COPPE/UFRJ
carla@ufrrj.br
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo tratar a respeito de um dos mais importantes filósofos
gregos de todos os tempos: Platão, que embora não tenha dado uma contribuição específica digna
de nota a resultados matemáticos técnicos e que não tenha sido considerado um matemático, tornouse
conhecido como o “criador de matemáticos” (BOYER, 1996), pois inspirou e guiou grandes
matemáticos de sua época, seguindo daí, o seu principal papel na História da Matemática.
SOBRE A VIDA DE PLATÃO
Platão, cujo verdadeiro nome era Arístocles, nasceu em Atenas (ou nas suas proximidades)
em 427 a. C., no meio da Guerra do Peloponeso entre Atenas e Esparta, na qual Atenas foi
derrotada em 404 a. C. e entrou num período de grande turbulência. Platão foi discípulo e
admirador do grande filósofo grego Sócrates (469-399 a. C.), que ao contrário do seu discípulo,
repudiava o pitagorismo e possuía profundas dúvidas metafísicas, que o impediram de se dedicar à
matemática ou às ciências da natureza. Sócrates morreu condenado à morte por envenenamento,
diante dos seus discípulos.
Depois disso, Platão resolveu viajar pelo Mediterrâneo, deixando Atenas por um tempo.
Durante esta viagem ele conheceu Arquitas (428-347 a. C.) um matemático e um dos últimos
pitagóricos, que também era filósofo, general, estadista e um influente cidadão de Tarento, na Itália,
de quem se tornou amigo e de quem recebeu a visão matemática. Diz-se que foi Arquitas quem
estabeleceu o quadrivium: aritmética, geometria, música e astronomia como o núcleo de uma
educação liberal, cujas idéias permaneceram no pensamento pedagógico. Ao retornar à Atenas, por
volta de 387 a. C., fundou a famosa Academia, que era uma instituição de investigação científica e
filosófica, que reuniu grandes geômetras. Platão dirigiu a Academia por toda a sua vida, morrendo
em Atenas no ano de 347 a. C., por volta dos seus oitenta anos.
A ACADEMIA
Platão teria formado sua escola num terreno recentemente adquirido nos arredores de
Atenas, num horto de oliveiras, designado por jardim de Akademos (um herói mortal da Guerra de
Tróia, mítico da Ática, a quem o jardim era dedicado). A Academia não só cumpriu sua função na
época de Platão, como também perdurou até o ano de 529 d. C., quando o imperador Justiniano
mandou fechá-la.
Pode-se dizer que a Academia de Platão foi o elo entre a matemática pitagórica antiga e a
Escola de Alexandria de Euclides. Na sua entrada havia o famoso lema: “Que não entrem aqui
aqueles que ignorem a Geometria”, o que explica o destaque dado à matemática no seu currículo.
PLATÃO E A MATEMÁTICA
A importância de Platão na história da matemática, não consiste em nenhuma descoberta
feita por ele, mas deve-se, citando as palavras de EVES, 2004:
“à sua convicção entusiástica de que o estudo da matemática fornecia o mais refinado treinamento
do espírito e, portanto, era essencial que fosse cultivado pelos filósofos e pelos que deveria
governar seu Estado ideal”.
Além disso, ele soube reconhecer o valor da matemática, não apenas por ser indispensável
para a compreensão do mundo físico, mas por conduzir aqueles que dela se utilizam um raciocínio
lógico, o que fez impulsionar o seu desenvolvimento no século IV a. C.
É possível que Platão tenha tomado conhecimento sobre os sólidos regulares através de
Arquitas. Ele pôs suas idéias sobre eles num trabalho intitulado Timaeus: nome dado em
homenagem a um pitagórico, que não se sabe se realmente existiu ou se foi um personagem, por ele
inventado, para enunciar as idéias do pitagorismo. Os poliedros regulares foram chamados de
“sólidos platônicos” ou “poliedros de Platão”, pela forma com as quais estes foram tratados em
Timaeus, onde eram associados aos quatro elementos: o tetraedro ao Fogo, o hexaedro à Terra, o
octaedro ao Ar e o icosaedro à Água. O quinto e último sólido regular, o dodecaedro, para Platão,
representava o símbolo do Universo.
Também, atribui-se a Platão, a distinção clara entre a aritmética (no sentido de Teoria dos
Números), que para ele deveria ser conhecida pelos filósofos e a logística (a técnica de
computação), que deveria ser adequada aos negociantes.
Em A República, um dos seus famosos diálogos, verifica-se várias passagens nas quais a
matemática é mencionada, como, por exemplo, no Livro VII (527 b):
“...- É fácil concordar com isso – observou; - a geometria é, com efeito, o conhecimento do que
existe sempre. Em consequência, meu nobre amigo, ela atrai a alma para a verdade e desenvolve
nela este espírito filosófico que eleva para as coisas de cima os olhares que inclinamos
erradamente para as coisas daqui de baixo.”
OS AMIGOS E DISCÍPULOS DE PLATÃO
A maior parte dos trabalhos matemáticos importantes do século IV a. C. foram feitos pelos
discípulos ou amigos de Platão, dentre os quais podemos citar:
Teodoro de Cirene (470 a. C.) foi com quem Platão também estudou matemática, durante a sua
viagem, nas costas da África. Ele foi o primeiro a demonstrar a irracionalidade das raízes quadradas
dos inteiros: 3, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 17.
Eudoxo de Cnidos (Jônia) (408 a. C.-355 a. C.) estudou com Arquitas e Platão, fundando uma
escola em Cízico, no norte da Ásia menor. Foi responsável pela reformulação da Teoria das
Proporções, considerando a existência dos Irracionais, que foi usada no Livro V de Os Elementos e
o desenvolvimento do Método da Exaustão (método de inscrição e circunscrição de figuras
retilíneas dentro e por fora de figuras curvas), que fundamentou o que bem mais tarde seria
desenvolvido como a Teoria dos Limites e do Cálculo Integral e Diferencial.
Menaecmo (350 a. C.) era amigo de Platão e discípulo de Eudoxo. Ele descobriu as Seções Cônicas
(elipse, hipérbole e parábola), sobre as quais escreveu um livro, demonstrando suas propriedades e
também foi o responsável pelos ensinamentos matemáticos transmitidos a Alexandre, O Grande.
Diz uma lenda, que quando Alexandre perguntou a Menaecmo se não havia um caminho mais curto
para o aprendizado da geometria, ele que respondeu: “Há estradas reais e para cidadãos comuns,
mas na geometria só existe um caminho para todos”.
Dinostrato (350 a. C.) era irmão de Menaecmo e discípulo de Platão. Foi um geômetra importante,
que descobriu que a curva denominada Quadratiz de Hípias resolveria um dos Três Problemas
Clássicos da Antiguidade: o problema da Quadratura do Círculo, que consistia na construção de
um quadrado de área equivalente a de um círculo dado, usando apenas a régua sem escala e o
compasso.
Teeteto (415-369 a. C.), a quem provavelmente deve-se grande parte do material do décimo e do
décimo terceiro livros de Os Elementos, de Euclides, foi discípulo ateniense de Teodoro. Ele
descobriu o Octaedro e o Icosaedro, completando os cinco poliedros de Platão, sendo os outros três
(tetraedro, hexaedro e dodecaedro) já descobertos pelos pitagóricos. Um dos diálogos de Platão
levou o seu nome, em homenagem à sua memória.
Aristóteles (384-322 a. C.) foi discípulo de Platão e também mestre de Alexandre, O Grande. Era
filósofo e biólogo, mas estava sempre a par das questões matemáticas. Foi-lhe atribuído, um tratado
sobre as Retas Indivisíveis, que consistiam em segmentos de reta, para os quais não há uma unidade
de medida comum. Ele foi o fundador da Lógica e pode-se dizer que pelas suas alusões a conceitos
e teoremas matemáticos, Aristóteles também é considerado um contribuinte para o desenvolvimento
da matemática em sua época.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho apresentou, portanto, uma breve narrativa da importância desta grande
personalidade da Grécia antiga - Platão, que através da difusão das suas idéias e da sua paixão pelo
conhecimento, pode-se dizer que “patrocinou”, reuniu (na Academia) e fez tornar conhecidos
importantes matemáticos da sua época, contribuindo, de forma imprescindível, no desenvolvimento
e reconhecimento não só da Ciência Matemática, mas também daqueles que por ela dedicaram a sua
vida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOYER, C.B. História da matemática. Tradução de Elza F. Gomide. 2 ed. São Paulo: Edgard Blücher,
1996.
EVES, H. Introdução à história da matemática. Tradução de Hygino H. Domingues. Campinas: Editora da
Unicamp, 2004.
GARBI, G. G. A rainha das ciências: Um passeio histórico pelo maravilhoso mundo da matemática. 2.
ed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007.
STRUIK, D. J. A Concise History of Mathematics. New York: Dover Publications, 1987.
PLATÃO. República. Tradução por J. Guinsburg. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 2005.
MALATO, M. L. A academia de Platão e a matriz das academias modernas. Notandum, 19, p.5-16.
Universidade do Porto, 2009.
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