segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

7250 - METTERNICH E A PARTILHA DA EUROPA

InícioSobreO SISTEMA MULTIPOLAR EUROPEU DO SÉCULO XIX
Posted by Rei Maria on julho 2, 2010 · 1 Comentário

Roma dominou a Europa ocidental e o Mediterrâneo por seis
séculos, entre 146 a.C. (destruição de Cartago) e 476 d.C. (queda do
Império do Ocidente). Depois disso, o mito de Roma perdurou para
sempre, sob a forma do sonho do império universal.

O projeto da “monarquia universal católica” percorreu toda a Idade
Média européia. A coroação de Carlos Magno pelo papa Leão III, no ano
800, e a coroação de Oto I no Sacro Império, em 962, tinham conservado
acesa a chama simbólica da restauração de Roma. Na Idade Moderna,
essa chama animou o empreendimento imperial da Casa de Habsburgo.

No início do século XVII, o “anel de ferro” dos Habsburgo fechava-
se em torno da França. Erguidos sobre uma teia de laços dinásticos, os
domínios dos Habsburgo espanhóis e austríacos estendiam-se pelo
interior do Sacro Império, na Hungria, na Boêmia, na Silésia, na Baviera,
em Flandres e em Milão. Fora do Sacro Império, abrangiam ainda os
reinos de Nápoles e da Sicília. A prata da América, que jorrava
abundante, servia para financiar as guerras contra a Holanda e a
Inglaterra e, no Mediterrâneo, assegurava a resistência às ameaças do
Império Otomano.

Na França, a grande rival dos Habsburgo, a luta contra a
hegemonia espanhola aparecia como uma batalha de vida ou morte.
Essa batalha, que devia ser travada em nome da Igreja e de toda a
cristandade, tinha por finalidade assegurar o equilíbrio entre as
potências.18

A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) foi o longo ciclo de guerras
entre os Habsburgo e as outras potências européias que terminaram
por exaurir a Espanha e destruíram o sonho da “monarquia universal
católica”. No fim da Grande Guerra, configurou-se o sistema de Estados
da Idade Moderna.

Os Tratados da Westfália, em 1648, encerraram a Guerra dos
Trinta Anos. A Paz de Munster encerrou as hostilidades entre a Espanha
e a Holanda. O conflito entre a França e a Espanha prosseguiu até que
a intervenção inglesa provocasse a derrota espanhola. A Paz dos Pireneus,
firmada em 1659, assinalou o início da derrocada final dos Habsburgo
espanhóis.

Na Westfália se encontra a origem do sistema de Estados da Idade
Moderna. Dos Tratados, emergiu um sistema pluripolar de Estados
europeus que referenciavam as suas políticas externas no interesse
nacional, não em valores religiosos universalistas.

Os Tratados representaram, antes de tudo, a confirmação da
fragmentação alemã. Na Westfália, proclamou-se a igualdade entre
católicos e protestantes e estendeu-se a liberdade de consciência aos
calvinistas. Aos príncipes foi concedida autoridade suprema em matéria
de religião. As “liberdades germânicas” destruíram os últimos vestígios
de poder do imperador.

A derrota dos Habsburgo de Viena repercutiu duradouramente
na política alemã. A Áustria, que antes da guerra surgia como potência
dominante no Sacro Império, teve sua influência limitada às áreas
católicas do sul do Império. Enquanto isso, a dinastia de Hohenzollern,
baseada na Prússia e em Brandenburgo, recebeu novos territórios no
norte do Império, começando a erguer-se como rival da Áustria no espaço
fragmentado alemão.

A França, mesmo esgotada pela guerra, emergiu como a principal
potência continental. Os Tratados asseguraram-lhe o controle sobre a
Alsácia e a posse dos territórios do alto Reno. Depois da Paz dos
Pireneus, com Luís XIV, a monarquia absoluta francesa conheceria
seu período áureo.

Munster e Osnabruck, onde foram negociados durante cinco anos
os Tratados da Westfália, receberam delegados de 16 Estados europeus,
140 Estados do Sacro Império e 38 principados e cidades observadores.
Desse concerto de potências grandes e pequenas, só não participaram
representantes da Inglaterra, da Rússia e da Turquia.

A Inglaterra, atormentada pela crise da realeza e, depois, pelas
guerras civis, praticamente não teve participação na Guerra dos Trinta
Anos. Contudo, o prolongado conflito europeu e os tratados de paz
beneficiaram, diretamente, os ingleses. O estatuto de neutralidade desviou
para a Inglaterra o comércio europeu. A frota inglesa transportou a
maior parte das mercadorias destinadas aos beligerantes. As condições
da paz e, sobretudo, o prosseguimento da guerra franco-espanhola
protegeram a ilha da ameaça de uma invasão católica.

Os Tratados da Westfália ocupam, por motivos distintos e
contrastantes, um lugar fundador para as duas escolas tradicionais do
pensamento em relações internacionais. A escola idealista interpretou-
os sob o ponto de vista do nascimento da ordem jurídica internacional.
A escola realista, como a origem do sistema de equilíbrio europeu.

________________________

As guerras napoleônicas

A França napoleônica foi o primeiro Estado-nação a empreender
a tentativa de unificação européia. A coroação de Napoleão, em 1804,
renovou o simbolismo do império universal e assinalou o surgimento de
uma “Nova Roma”.

O Império Carolíngio medieval durou menos de um século, de
768 (coroação de Carlos Magno) a 843 (Tratado de Verdun), mas
representou o estabelecimento do poder compartilhado da dinastia e
do papado sobre as terras da Europa centro-ocidental. As conquistas
napoleônicas iriam recompor e ampliar o domínio territorial carolíngio.

O Império Napoleônico durou menos de duas décadas mas, no seu
zênite, colocou sob hegemonia francesa quase toda a Europa continental.
Apenas cinco anos antes de Waterloo (1815), o poder de Paris estendia-
se pelas penínsulas Ibérica e Itálica e através da Europa Central.

O expansionismo napoleônico colocou em confronto o poderio
continental francês e o marítimo britânico.19 A Grã-Bretanha foi o centro
organizador das seis coligações de potências – que envolveram
eventualmente a Prússia, a Áustria e a Rússia – formadas contra a França
imperial. Por meio das coligações, a potência marítima liderava
monarquias continentais contra a maior potência continental.

Esse prolongado conflito – uma típica disputa entre o Urso e a
Baleia, ou seja, entre poderes incontrastáveis no seu próprio elemento –
desenrolou-se sobre a base do Sistema Continental de Napoleão e da
reação britânica posta em prática pelo bloqueio marítimo. Por visar ao
estrangulamento do comércio britânico, Napoleão procurou fechar os
portos europeus para os navios ingleses. A Grã-Bretanha, por sua vez,
investiu contra os domínios franceses de além-mar, cortando as rotas
oceânicas e as bases coloniais do inimigo. A derrota definitiva das forças
espanholas na América Latina, a retirada da família real portuguesa
para o Brasil e a penetração britânica no Caribe foram conseqüências
dessa disputa européia.

O impasse permaneceu enquanto cada um dos contendores
continuou absoluto no seu elemento. As tentativas francesas de criação
de uma esquadra poderosa e de invasão das Ilhas Britânicas
fracassaram. A derrota napoleônica foi prefigurada na demorada e
desgastante campanha contra a resistência espanhola e na catastrófica
retirada da Rússia. Um ano depois do fracasso na Rússia, a Sexta
Coligação batia a França em Leipzig, na Batalha das Nações (1813).

As guerras napoleônicas iluminam o papel duradouro que a
Grã-Bretanha viria a cumprir, de sentinela vigilante do equilíbrio
continental de poder. Rainha dos mares e sede de um império mundial,
a Grã-Bretanha temia a emergência de uma potência capaz de ameaçar
seus interesses internacionais. Sua segurança repousava no equilíbrio
entre os Estados do continente: essa situação fazia que as várias ameaças
hipotéticas se anulassem mutuamente.

Napoleão representou um desafio para esse equilíbrio que
sustentava a liberdade de ação britânica nos oceanos e nas bases coloniais
de além-mar. A erradicação dessa ameaça abriu caminho para a
afirmação das hegemonias política e econômica britânica, no século da
Revolução Industrial.

_____________________________________
O Congresso de Viena e o Sistema de Metternich

O século XIX assinalou a estabilização do sistema europeu de
Estados, sob o arcabouço de um equilíbrio multipolar (ou pluripolar)
dinâmico. A derrota da França napoleônica deu origem a uma geometria
pentagonal, baseada no poderio da Grã-Bretanha, da França, da Prússia
(depois da Alemanha), da Áustria-Hungria e da Rússia.

Essa estrutura multipolar forneceu as bases do funcionamento de
um sistema basicamente circunscrito ao espaço europeu. No final do
século, a emergência de novas potências marítimas no Ocidente (Estados
Unidos) e no Extremo Oriente (Japão) gerou novos tipos de conflito e
forte tendência de globalização do sistema internacional de Estados.

O equilíbrio geopolítico europeu do século XIX foi a moldura para
a expansão e a consolidação da economia industrial e para o
delineamento de um mercado mundial. No centro desse processo,
encontrava-se a Grã-Bretanha, potência econômica maior até a última
década do século. A estabilidade dinâmica da cena européia, perturbada
por conflitos que não chegavam a ameaçar o sistema no seu conjunto,
garantiu ambiente favorável para a constituição do Império britânico e
a imposição da “Pax Britânica” nos territórios de além-mar.20

O equilíbrio pentagonal europeu sofreu flutuações durante todo
o século, mas apenas uma grande mudança – a unificação alemã de
1871. Esse evento crucial dividiu o século em dois períodos distintos:
depois dele, o crescimento da influência da Alemanha iria corroer
lentamente a estabilidade européia, até precipitar o continente na
Primeira Guerra Mundial.

O Congresso de Viena (1814-1815) redesenhou as fronteiras
políticas da Europa e reorganizou os Estados, visando suprimir
definitivamente o espectro de Napoleão. A velha Europa passava uma
borracha no passado recente, procurando recriar o fio de continuidade
que tinha sido violentamente rompido.

O princípio da legitimidade foi uma das bases do projeto
europeu articulado em Viena, gerando a política da restauração. Os
governos oriundos da hegemonia napoleônica, alguns dos quais liderados
por familiares do imperador francês, foram eliminados. Foram
restauradas as antigas casas reais de Bourbon na Espanha e Bragança
em Portugal. Na França, a restauração conduziu Luís XVIII, irmão de
Luís XVI, ao trono.

O legitimismo seria defendido por uma articulação diplomática
européia, surgida por iniciativa do chanceler austríaco, príncipe
Metternich, e do czar Alexandre I, da Rússia. Essa articulação – a Santa
Aliança – proclamou-se a guardiã da “Europa das dinastias”.
Contudo, essa tentativa de barrar o caminho às idéias francesas
de 1789 não duraria muito. Na década de 1820, eclodiram revoltas
liberais na Espanha, em Portugal, em Nápoles, em Piemonte e na Grécia.

Os congressos de Troppau (1820) e Laibach (1821), promovidos no
quadro da Santa Aliança, manifestaram o apoio das potências à
repressão austríaca na Itália. Contudo, em 1822, no Congresso de
Verona, a Grã-Bretanha recusava-se a intervir na guerra espanhola entre
liberais e realistas. A recusa britânica representou golpe mortal no sistema
de congressos das potências legitimistas.

Em 1830 uma insurreição em Paris suprimiu o absolutismo,
originando a monarquia constitucional de Luís Felipe. A Revolução de
1830 repercutiu em toda a Europa, possibilitando a independência da
Bélgica e disseminando as idéias liberais nas regiões italianas e alemãs e
também na Polônia, que se encontrava sob domínio russo. O legitimismo
de Viena fracassaria definitivamente em 1848 – o ano da “primavera
dos povos” – quando as revoluções liberais pipocaram por todo o
continente, desde a França até a Alemanha e a Áustria.

Ao lado do legitimismo, o princípio do equilíbrio europeu
norteou as decisões de Viena. Sob o pretexto da restauração das
fronteiras políticas anteriores a Napoleão, procedeu-se a uma partilha
territorial destinada a favorecer as quatro potências vitoriosas. A Grã-
Bretanha apossou-se de importantes territórios coloniais, ampliando
seus domínios de além-mar. A Rússia estabeleceu seu domínio sobre a
maior parte da Polônia, cristalizando sua posição de potência
hegemônica no mundo eslavo. A Áustria anexou os estados italianos do
Norte, de maneira que o velho império decadente ganhou prolongada
sobrevida. A Prússia incorporou a Renânia e parte da Polônia, emergindo
como grande potência européia.

O sistema de equilíbrio europeu conservou a fragmentação alemã.
Entretanto, no lugar do Sacro Império, destruído por Napoleão, surgia
a Confederação Germânica. O reino da Prússia controlava a maior parte
dos territórios setentrionais da Confederação, ao passo que os territórios
meridionais faziam parte do império da Áustria. No centro e no norte,
sob o princípio da restauração, foram constituídos reinos, principados e
ducados reminiscentes do feudalismo. Mas os cerca de trezentos Estados
pré-napoleônicos consolidaram-se em aproximadamente trinta unidades
políticas.

No centro da arquitetura do equilíbrio europeu, estava a
limitação do poderio francês. A Suíça recobrava sua independência
e, por disposição do Congresso de Viena, tinha garantida sua
“neutralidade perpétua”. No flanco sudeste da França, constituía-se o
Reino do Piemonte-Sardenha, que viria a ser o vértice da unidade italiana.

No flanco nordeste, constituía-se o Reino dos Países Baixos, que mais
tarde originaria a Holanda e a Bélgica atuais.
Do ponto de vista geopolítico, os acordos do Congresso de Viena
resultaram, antes de tudo, das propostas britânicas que haviam sido
organizadas no chamado Plano Pitt. Londres direcionou os estadistas
de Viena para um acordo geral baseado no princípio do equilíbrio de
poder. Assim, aquilo que estava subjacente ao pensamento estratégico
de Richelieu tornava-se, dois séculos mais tarde, um programa de
política externa.

A Grã-Bretanha desprezava o sentido místico da Santa Aliança, a
sua referência a valores religiosos universalistas e o seu apego às velhas
dinastias. O primeiro-ministro Castlereagh estava pragmaticamente
interessado no princípio do equilíbrio europeu e, para sustentá-lo,
articulou a Quádrupla Aliança, composta por Grã-Bretanha, Áustria,
Prússia e Rússia. A França, que foi representada em Viena por Talleyrand,
acabou sendo reintegrada ao concerto de potências européias em 1818,
vindo a participar da Quíntupla Aliança. Dessa forma, o equilíbrio
pentagonal do continente ganhava expressão diplomática adequada.

O austríaco Metternich desempenhou o papel de elo entre a
estratégia britânica e a cruzada legitimista russa. O príncipe sabia que
a Santa Aliança lhe proporcionava a oportunidade de exercer influência
sobre a política do czar, moderando seus excessos e vinculando-a ao
Concerto Europeu. Ao mesmo tempo, tinha plena consciência do papel
indispensável da Grã-Bretanha na estabilização da Europa de Viena.

O Sistema de Metternich, como ficou conhecido o Concerto da
Europa de Viena, cristalizava a estabilização de um equilíbrio de
potências soberanas que zelavam em conjunto pela manutenção da
ordem continental. A ordem européia passava a se estruturar sobre um
arcabouço de geometria irregular: uma potência marítima que sediava
um império mundial (Grã-Bretanha), uma potência do Ocidente
Europeu restringida pela derrota militar (França), duas potências centro-
européias rivais (Prússia e Áustria), uma potência conservadora do
Oriente Europeu (Rússia).

O Concerto de Viena representou a moldura para o máximo
florescimento da realpolitik. O sentido e o conteúdo da política externa
dessa época se desvincularam notavelmente das referências a valores
morais ou princípios universais. O equilíbrio de poder deixou de
constituir, apenas, resultado eventual da correlação de forças entre os
Estados para se tornar a meta explícita da diplomacia européia.

________________________________
A unificação alemã e a Ordem de Bismarck

O foco de instabilidade principal do sistema foi, desde o início, a
rivalidade entre a Prússia e a Áustria. Ao distribuir regiões da
Confederação Germânica para os dois competidores, mantendo reinos
neutros entre eles, o Congresso de Viena tinha acendido um pavio que
continuaria a queimar através do século. A disputa pela hegemonia sobre
a Alemanha desaguaria na guerra direta entre os contendores. A unidade
da Alemanha, realizada sob liderança prussiana, modificaria
profundamente o equilíbrio de poder em todo o continente.

A marcha para a unificação começou em 1834, com a criação do
Zollverein, a união alfandegária dos Estados alemães, que tinha por eixo
a Prússia e excluía a Áustria. Em 1862, a nomeação de Otto von Bismarck
para chanceler da Prússia inaugurou a fase militar da unificação. Em
aliança com a Áustria, a Prússia derrotou a Dinamarca na Guerra dos
Ducados (1864). Em seguida, a Prússia empreendeu a guerra contra a
Áustria (Guerra Austro-Prussiana de 1866) e constituiu a Confederação
Germânica do Norte. Em 1870, eclodia a Guerra Franco-Prussiana, pela
qual Bismarck obrigou os Estados germânicos do sul a se colocarem sob
sua proteção.

A guerra franco-prussiana foi o coroamento da unidade alemã. O
novo Estado, organizado sob o poder da Prússia, nasceu à sombra da
derrota e da humilhação francesas. O coroamento do imperador
Guilherme I e a proclamação do Segundo Reich alemão, em 1871, no
Salão dos Espelhos do Palácio de Versalhes, dilacerou por muito tempo
o orgulho nacional francês. As indenizações e as reparações de guerra e,
principalmente, a anexação da Alsácia e da Lorena fertilizaram o
revanchismo e pavimentaram o terreno para as guerras futuras.

A guerra franco-prussiana foi desejada e preparada pelos dois
lados. A Prússia desenvolvia a escalada militar da unificação, que
fertilizava o nacionalismo alemão. A França tentava evitar a unidade
alemã para conservar o equilíbrio de poder que ruía lentamente.
O surgimento da Alemanha como potência unificada representou
a desestabilização definitiva do velho Sistema de Metternich. A trajetória
iniciada em 1871 desembocaria, décadas depois, na Primeira Guerra
Mundial e no colapso da convivência multipolar européia. Essas décadas
de transição, tensas e decisivas, transcorreram sob o signo de outra
organização dos poderes no continente: a ordem européia de Bismarck.
No centro da nova ordem se encontrava a Alemanha, que atravessava
um surto industrial sem precedentes. Em poucas décadas, ela sobrepujaria
a Grã-Bretanha, tornando-se a maior economia européia. A potência
emergente, situada no coração da Europa, funcionava como elo entre o
oeste e o leste do continente. Nos dois lados, seu poderio crescente gerava
temor e insegurança.

A ordem de Bismarck excluiu a Áustria de qualquer participação
na nação alemã. O Império austro-húngaro, envenenado pelos
nacionalismos internos, ingressava na sua crise terminal. A unificação
italiana (1861-1871) o tinha privado dos estados do nordeste da Itália e
crescia a instabilidade no norte da Península Balcânica. Por outro lado,
essa ordem se assentava na humilhação da França, onde germinava o
revanchismo escorado na idéia de retomada da Alsácia e da Lorena.

A política externa de Bismarck estava consciente dos riscos
embutidos na humilhação da França. Por isso, sua meta principal era o
isolamento da França, evitando a constituição de alianças antigermânicas.
Manobrando nessa direção, o chanceler prussiano costurou o Acordo
dos Três Imperadores, firmado em 1873, envolvendo a Alemanha, a
Áustria-Hungria e a Rússia.

O Acordo dos Três Imperadores não podia durar muito, já que se
aprofundavam os atritos entre russos e austríacos. Em 1879, foi firmada
uma aliança secreta austro-alemã, explicitamente orientada para a
defesa comum contra eventuais ameaças militares russas. Quase ao
mesmo tempo, Bismarck firmava o Pacto Russo-Alemão, que durou
até 1890. Assim, a Alemanha realizava arriscado mas indispensável jogo
duplo, associando-se às duas potências rivais do Leste Europeu.
Até 1870, a França tinha se aproveitado das diferenças entre os
estados alemães para atuar contra a unidade da Alemanha. Feita a
unidade, a França derrotada teria que buscar segurança fora da
Alemanha e, obviamente, contra a Alemanha. Na última década do
século, a França conseguiu romper o isolamento imposto por Bismarck
e firmar a aliança com a Rússia.

A aliança franco-russa de 1894 foi conseqüência lógica do temor,
sentido nos dois lados do continente, do poderio alemão.21 A aliança
tinha base em ambições territoriais antigermânicas: a França visava
recuperar a Alsácia e a Lorena; a Rússia pretendia conservar a Polônia,
que era alvo do interesse alemão. Entretanto, o pacto antigermânico foi
retardado pela hábil diplomacia de Bismarck. Ele só se concretizou
quando as disputas entre a Rússia e a Áustria demoliram o jogo duplo
dos alemães.
A rivalidade entre russos e austríacos foi ativada pela confusa
situação dos Bálcãs. Lá, a Sérvia recebia o apoio russo nas suas pretensões
de unificação nacional dos eslavos do Sul. O projeto da Grande Sérvia
ameaçava o flanco sul do Império Austro-Húngaro, onde se localizavam
as províncias da Eslovênia e da Croácia e partes da Bósnia-Herzegovina.

O apoio diplomático da Rússia aos sérvios era fruto não só da
comunhão cultural eslava e ortodoxa entre os dois povos como também
do antigo interesse russo por uma ponte na direção do Mediterrâneo.
Os atritos periódicos com a Turquia – que dominava as saídas do
Mediterrâneo oriental e os estreitos de Bósforo e Dardanelos –
aprofundavam o fosso que separava a Rússia da Áustria e aproximavam
ainda mais os russos dos sérvios.

Quando a aliança austro-alemã se tornou pública, em 1890, a
Rússia afastou-se da Alemanha. Em 1894 foi concluída a aliança franco-
russa, que cercava de hostilidade os alemães e os seus aliados austríacos.
Delineava-se a geometria de alianças da Primeira Guerra Mundial.

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Comments
One Response to “O SISTEMA MULTIPOLAR EUROPEU DO SÉCULO XIX”
Ruan disse:
novembro 22, 2010 às 10:18 pm
Muito bom, serviu como resumo pra uma prova q eu vou ter amanhã.

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