domingo, 25 de julho de 2010

2097 - A IDADE MÉDIA

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No concerto Música Vocal na Idade Média ouvimos este fascinante universo da música sacra e secular raramente apresentado. Muitas obras foram executadas em primeira audição em São Paulo, editadas pelo Audi Coelum em um trabalho de pesquisa e produção artística. Dez solistas e um coro a cappella mostraram quase mil anos de realização musical.

O programa é apresentado a seguir, evidenciando a história da arte na Idade Média. Para ver a tradução basta clicar no título da obra.





Com a decadência de Roma, uma nova capital para o império é fundada no ano 300 (Constantinopla, depois Bizâncio e atual Istambul, na Turquia), tornando-se o centro político e religioso da cristandade. No final do século IV ocorre a separação do Império Romano; a Idade Média se inicia e termina na queda destes dois centros:

ano

476 - Queda do Império Romano do Ocidente (Roma)

1.453 - Queda do Império Romano do Oriente (Constantinopla)

Esta época, dita 'média' por compreender-se entre a antigüidade greco-romana e o renascimento, é vista por muitos como sombria, e marcada por guerras, pestes, misticismo e ignorância. Muitos esperavam o final dos tempos... Mas em momentos especiais, a arte desse período revela sua incrível riqueza, seus elementos inovadores e um grande desenvolvimento.





Música Vocal na Idade Média - Audi Coelum



Pater noster

gregoriano


O concerto tem início com um Pater noster (Pai nosso, em latim), incluindo as partes cantadas pelo sacerdote - feitas por um chantre - como se fosse em uma liturgia solene para o Dia de Páscoa no século IX. Este estilo de música é conhecido como canto gregoriano, ainda hoje a música oficial na Igreja Católica. O canto gregoriano é um cantochão.



O cantochão é o canto litúrgico do início da cristandade, com ritmo caracteristicamente prosódico e texto em latim. Conforme a região, alguns elementos definiram vários tipos de cantochão:

Romano

Ambrosiano (Santo Ambrósio, Milão)

Galiciano (França)

Moçárabe (Espanha visigótica)

O cantochão romano é o canto dito gregoriano e deve seu nome ao Papa São Gregório (século VI), que fez uma reforma litúrgica e criou a Schola Cantorum e o coro papal, atualmente na Capela Sistina. Mas foi Carlos Magno, 300 anos depois, quem difundiu e impôs o estilo romano a todos os locais do então recente Império Sacro Romano. É deste tempo a iluminura mostrando São Gregório recebendo estas melodias do Espírito Santo, que vemos acima.



Para os grandes teólogos como São Basílio, São Jerônimo, Santo Agostinho e Santo Ambrósio, a música devia servir somente à religião, e a sua prática foi condenada fora da igreja, concentrando-se nos conventos e mosteiros no início da idade média. Ao lado vemos um coro, em uma iluminura do Saltério do rei Henrique VI.



São Bento (século VI), fundador da ordem beneditina, tornou a música uma constante na vida dos religiosos, seja na Missa ou no Ofício Divino (Ofício das Horas). Muitos centros monásticos tiveram grande importância cultural, como Monte Cassino, Sankt-Gallen, Cluny, Montserrat e Saint Denis. O monges ficavam à frente de uma grande estante, lendo grandes livros com textos e notações musicais. A Abadia de Solesmes, na França, foi responsável pela reconstrução destes manuscritos antigos, e hoje podemos reinterpretar o canto gregoriano de maneira fiel, com seu fraseado característico e sua elevação espiritual.








Nunc gaudeant materna

Hildegard von Bingen (1098-1179)



A compositora e escritora Hildegard von Bingen entrou para o convento aos oito anos, onde tornou-se abadessa, sendo beatificada pela Igreja. Foi uma mística, e escreveu tratados médicos e científicos, além de vidas de santos e várias cartas contando sobre suas visões. Também escreveu conselhos e repreensões a papas e imperadores, e reformou a vida monástica tão corrompida pelos aspectos não espirituais. Hildegard revelou: "uma voz do Céu mandou-me dizer e escrever tudo, assim como eu ouvia e aprendia." Ao lado, uma iluminura de Hildegard escrevendo sob a inspiração divina.



Conhecida como a ‘Sibila de Rhine’ (local do convento na Alemanha), escreveu a antífona Nunc gaudeant materna na coletânea Symphoniae harmoniae celestium revelationum, obra que o Audi Coelum trouxe da Alemanha e apresenta em primeira audição em São Paulo. O texto é uma exaltação à figura feminina Ecclesia (Igreja), como uma mãe que acolhe todos os seus filhos.







Cunctipotens genitor

anônimo (vários)



Uma síntese didática: utilizando uma mesma melodia gregoriana, o Cunctipotens genitor, reunimos as primeiras experiências polifônicas na idade média. Será como uma viagem ao tempo, de um mosteiro do século X até duzentos anos depois, em Santiago de Compostella, local de peregrinação e cantos ornamentados. Poderemos ouvir e sentir, lado a lado, o nascimento da música ocidental. Ao lado vemos a representação do Rei Davi tocando uma viola, na Catedral de Santiago de Compostella, Espanha.



Após ouvirmos o Kyrie (numa melodia que posteriormente recebeu o texto Cunctipotens genitor), intervalos de quarta, quinta e oitava são adicionados paralelamente a este canto - é o organum paralelo. Em seguida apresentamos um organum melismático, um canto mais independente e floreado, composto sobre este cantochão.



O uso da polifonia obrigou o desenvolvimento da escrita musical, e Guido d’Arezzo, um monge beneditino do século XI, agrupa as escalas e os modos, usando uma pauta de quatro linhas com uma clave como referência. É ele quem retira do Hino a São João Batista os nomes das alturas musicais: ut, re, mi, fa, sol, la.







Beata viscera

falsobordão (Worcester)



Este fauxbourdon era cantado na Catedral de Worcester, de onde vemos o vitral ao lado. São três linhas de vozes masculinas em movimento direto e preferencialmente paralelo, com a presença da terça - uma prática inglesa. Isto torna a música menos 'dura' e mais próxima da nossa harmonia moderna. O texto exalta a importância de Maria:

Benditas as entranhas
Da Virgem Maria
Que, grávida do fruto
Do princípio eterno
No vaso da vida
Dá de beber ao mundo
Para o bem do homem digno
Um doce presente





Omnes curat homo

anônimo de St. Martial



A Abadia de St. Martial de Limoges foi referência na Aquitânia (sul da França) durante o século XII. Sua denominação vem do primeiro abade e bispo, Martial, enterrado na abadia. A biblioteca da atual Faculdade de Medicina de St. Martial guarda vários livros com polifonias medievais. Omnes curat homo inicia: "Todo homem procura merecer cânticos" com duas vozes masculinas em contraponto.






Viderunt (conductus, quadruple) / Aleluia nativitas (organum)

Perotin (séculos XII / XIII)



A Escola de Notre-Dame começou a ser conhecida no século XII pelo trabalho de Leonin, que escreveu o Magnus Liber Organi, com vários organa (plural de organum). O organum é uma composição onde uma ou mais vozes se sobrepõem a um cantochão alargado (cantado demoradamente).







Outro expoente da Escola de Notre-Dame é Perotin, cuja música era executada na Catedral de Notre-Dame ainda em construção. Este Aleluia nativitas é um organum, e o grupo - de vozes masculinas - leva 2 minutos apenas para cantar uma única palavra: Aleluia. Com este procedimento, o texto é alargado até o ponto da incompreensão, dando à música litúrgica um caráter totalmente abstrato. Acima um manuscrito desta composição.



Leonin e Perotin são derivações francesas de seus nomes latinos: Leoninus e Perotinus, que por sua vez são diminutivos de Leon e Pierre.














Imperayritz de la ciutat joyosa

Mariam matrem virginem

Llibre Vermell de Montserrat


Montserrat é uma região da Catalunha, Espanha, até hoje local de peregrinação dos devotos de La moreneta (ao lado), uma imagem da Virgem com o menino Jesus, ambos negros.



Um manuscrito medieval foi salvo de um incêndio, restaurado e encadernado no século XIX com veludo vermelho, e por isso é chamado de Llibre Vermell de Monterrat. Nele estão inúmeros textos e algumas canções de peregrinos.



Temos a imagem das obras apresentadas neste concerto: Imperayritz de la ciutat joyosa, um canto processional, em catalão (acima) e Mariam matrem virginem, em latim (abaixo).












In Rama sonat gemitus

anônimo / Wolfenbüttel Collection 677



Muitas obras extra-litúrgicas foram compostas em latim, como In Rama sonat gemitus. A coleção Wolfenbüttel contém a música escrita no século XII para a Abadia de Santo André, na Escócia, com muitos exemplos de música celta, assim como outras obras do continente.



Este texto se refere à morte brutal de São Thomas Becket, assassinado na Catedral de Cantuária (figura ao lado), e mistura a passagem do infanticídio ordenado por Herodes com o pranto de uma Rachel inglesa. Este crime ocorreu no dia 29 de dezembro de 1170, um dia após a comemoração litúrgica dos Santos Inocentes. Neste paralelo, Henrique II, responsável pelo assassinato, é 'Herodes'.













A melodia, no nosso conceito moderno, nasceu na prática secular (não litúrgica) de canções religiosas que o povo cantava em procissões, como as laudas. As primeiras monodias não religiosas são atribuídas aos Goliardos, clérigos errantes que usavam as línguas vernáculas, e que escreveram, por exemplo, o Carmina Burana. Em seguida vieram os menestréis e os jograis, músicos itinerantes que caminhavam de vila em vila, cantando e apresentando estórias, acrobacias, malabarismos e animais amestrados. Eis que surgem os trovadores, destinados a cantando o amor.









Ja nus hons pris

Richard Coeur-de-Lion (1157-1199)



Ricardo Coração de Leão, foi um trouvèr. Esta designação diferencia os trovadores no norte da França, que escreviam na langue d’oil, dos trovaders do sul da França, que escreviam na langue d’oc. Estes poetas, diferentemente dos menestréis, eram da nobreza e não exerciam a música por profissão, mas por arte. Em contraponto à guerra cultivavam a cortesia, as boas maneiras, em dança, poesia e música. Ricardo foi capturado por Saladino em uma Cruzada, e na prisão escreveu Já nus hons pris, narrando sua angústia e o conforto que a música lhe traz. O texto está em langue d’oil, um francês arcaico, já que o compositor, mesmo sendo Rei da Inglaterra, era Duque da Normandia. Ao lado o brasão deste nobre.



O termo trovar significa descobrir, inventar poemas e canções. A mulheres também podiam compor, e eram chamadas de trobairitz, como a Condessa de Dia.







Ir me quería yo

anônimo sefardita


Ir me quería yo é uma obra anônima com elementos orientais, trazidos pelos judeus sefarditas até a Espanha.



Durante um longo período, árabes, judeus e cristãos conviveram na Espanha ocupada pelos mouros, pois estes não tinham possibilidades de manter esta conquista sozinhos. Os cultos eram permitidos, desde que pagos os impostos adicionais. Vemos ao lado o exterior da Sinagoga del Transito, em Toledo, Espanha.



Assim como as cruzadas e as peregrinações, a presença moura na península Ibérica ajudou o intercâmbio entre estas culturas. Dos árabes vieram instrumentos como o alaúde os címbalos. Por isso colocamos nesta peça o acompanhamento de castanholas e tambor.







Palästinalied

Walther von der Vogelweide (c.1.170-c.1230)



Os primeiros trovadores alemães eram conhecidos como Minnesingers, ou seja: cantadores de amor. Walther von der Vogelweide foi o maior deles e escreveu Palästinalied (Canção da Palestina) quando seu protetor, Frederico II, partiu para a cruzada. Poderemos ouvir sobre Jerusalém:



"O que eu sempre quis aconteceu, porque eu cheguei ao lugar onde Deus andou. Quantos milagres aconteceram aqui!".



Ao lado, vemos este trovador, coroado e cercado por símbolos como a espada, o elmo e pássaros.



Na Alemanha a arte trovadoresca se desenvolveu também na classe média, criando os Meistersingers (mestres cantores), que formaram as primeiras associações profissionais de músicos. A ópera Os Mestres Cantores de Nuremberg, de compositor romântico Wagner, retrata esta história.






Ondas do mar de Vigo

Martin Codax (século XIII)



Os trovadores criaram vários tipos de canções, como canções de amor, de amigo, de gesta (épicos de cavalaria), de alba (alvorada) e até canções para a Virgem - uma espiritualização do amor cortês.



Uma canção de amigo tinha o texto na primeira pessoa feminina, mesmo sendo cantada por homens. Apenas seis canções de amigo chegaram aos nossos dias com notação musical. Fazem parte de um manuscrito (figura ao lado) que está na Torre do Tombo, em Lisboa, num total de sete canções de autoria de Martin Codax, compositor e poeta galego do século XIII.



Codax deve ter vivido em Vigo, pois esta cidade portuária é mencionada na maioria de seus poemas. O mar faz parte da simbologia amorosa, e também reflete a melancolia e a saudade, sentimentos tão caracteristicamente ibéricos:



"Ondas do mar de Vigo, vistes o meu amigo?

Aquele por quem suspiro?"







Chanterai por mon corage

Guiot de Dijon


Esta canção se refere à III Cruzada (1189):

Eu cantarei para manter minha coragem
Porque tenho que confortar meu coração
Pois em minha grande angústia
Eu não desejo morrer ou ficar louco
Quando da terra selvagem
Eu não vir ninguém retornar

Deus, quando eles gritam "Avante"
Ó Senhor, ajude o peregrino
Por quem eu tremo
Pois traiçoeiros são os Sarracenos










Robin m'aime
Robin m'aime / Mout me fu grief / Portare

Adam de la Halle (c.1237-1288)




A história avança e mais documentos passam a relatar os fatos. Por isso sabemos que Adam de la Halle, da família conhecida como 'corcunda', apresentou Le Jeu de Robin et de Marion para a corte francesa em Nápoles. Robin m’aime é cantado pela personagem Marion nesta peça pastoral de entretenimento, repleta de jogos, e essa mesma melodia é utilizada para Robin m’aime / Mout me fu grief / Portare, onde três vozes femininas cantam textos diferentes simultaneamente, fato comum naquela época e presente em outras obras deste concerto. Acima vemos uma representação do compositor, e ao lado uma iluminura de Marion (ou Marote) no manuscrito preservado em Aix-en Provence, França.







Prenés i gardes

Guillaume d'Amiens (século XII)







S’on me regarde / Prenés i gardes / Hé! mi enfant

anônimo, Montpellier Codex, século XIII



A obra de Guillaume d'Amiens serve de base para a polifonia seguinte, encontrada no Codex de Montpellier. Nesta coletânea, muitas obras apresentam linhas sem texto, indicando a possibilidade de serem vocalizadas ou executadas por um instrumento, como no caso da obra seguinte. O manuscrito ao lado mostra o início da segunda voz de uma composição de Pierre de La Croix, e atualmente se encontra na Biblioteca da Faculdade de Medicina de Montpellier, França.







Amor potest conqueri / Ad amorem sequitur

anônimo, Montpellier Codex, século XIII











Mesmo sendo essencialmente vocal, a música medieval foi absorvendo os instrumentos musicais, como vemos em várias iluminuras. Estes instrumentos também podiam acompanhar as vozes, executando basicamente a mesma melodia.



Instrumentos medievais mais conhecidos:

sopro: flautas, charamela (de palheta dupla), gaita de fole, órgão portátil

cordas pinçadas: saltério ( forma trapezoidal), harpa (triangular), lira (quadrada), alaúde

cordas friccionadas: viola, rabeca

metais: trombetas e sacabuxas

percussão: tambores, pandeiros, sinos, címbalos

Trombetas eram privilégio da realeza e do clero, enquanto outros instrumentos, como a matraca, eram usados para identificar a aproximação de leprosos. Muitos peregrinos se distinguiam usando guizos, chocalhos e sinos, tidos até como amuletos. Nessa época, os instrumentos se dividiam em dois grupos: altos (com sons fortes - não obrigatoriamente agudos) e baixos (sons fracos).











Messe de Notre Dame / Kyrie

Guillaume de Machaut (c.1300-1377)



Guillaume de Machaut foi poeta, compositor e cônego em Rheims, França, e fez a primeira polifonia completa de uma missa: a Messe de Nostre Dame, possivelmente executada durante a coroação de Carlos V. O Audi Coelum cantou esta missa em 2004, à luz de velas, após 20 anos em que ela não era ouvida em São Paulo. Neste concerto apresentamos o início da missa, o Kyrie, palavra grega que significa 'piedade'. Nesta obra Machaut se utiliza do hoquetus, técnica que pode ser facilmente identificada pois esta palavra significa 'soluço'.



Para possibilitar esta complexa polifonia, a escrita musical já possuía uma pauta, alturas e durações relativas, mas ainda precisa ser copiada à mão. Uma cópia era utilizada por vários cantores e um dos dispositivos inventivos foi a partitura em rolo, como vemos acima, numa figura que mostra cantores lendo uma obra de Machaut.

Antes de Machaut, apenas a Messe de Tournay apresentava uma antologia polifônica para o ordinário. O ordinário da missa são as partes fixas, cantadas durante todo o ano:

Kyrie

Gloria (não era cantado em determinados tempos litúrgicos)

Credo

Sanctus

Agnus Dei

O ordinário é completado pelo próprio da missa, ou seja, partes específicas daquela comemoração ou momento no calendário litúrgico, como o Requiem (missa de mortos), celebração de santos etc.




Rose, liz, printemps, verdure

Guillaume de Machaut (c.1300-1377)



Rose, liz, printemps, verdure é um Rondeau, uma forma de canção estrófica que sempre retorna à melodia do refrão, como dando voltas em um círculo (ronda). Machaut compôs este rondeau provavelmente para exaltar a beleza de Péronne, uma jovem por quem nutria um amor platônico.



A ilustração acima mostra como Machaut foi um mestre admirado ainda em vida, recebendo a visita da Natureza, que lhe apresenta seus três filhos: o Sentido, a Retórica e a Música.












Ther is no rose

anônimo inglês


Ther is no rose é uma peça para o natal, onde ouvimos o inglês arcaico:

Ther is no rose of swych vertu
As is the rose that bare Jhesu
For in this rose conteynyd was
Heven and erthe in lytyl space Alleluya

The aungelys sungyn the sheperds to
Gloria in excelsis Deo, Gaudeamus

Na ilustração, o teto da Abadia de Westminster, Londres.








A Ars Nova surge em um tratado de Philippe de Vitry, diplomata, bispo e músico, nomeando o novo estilo de composição em oposição à Ars Antiqua. Vitry compõe músicas para o Roman de Fauvel (figura abaixo), um poema satírico onde Fauvel é um burro em forma humana, apresentando todos os seus vícios. Seu nome é formado pelas iniciais destes pecados:



Flattelerie (bajulação)

Avarice (Avareza)

Vanité (Vaidade)

Vilénie (Baixeza)

Envie (Inveja)

Lâcheté (Covardia)









O centro da Ars Nova é a França, com Guillaume de Machaut, mas na Itália surge um grande expoente desta escola: Francesco Landini.








Si dolce non sono

Francesco Landini (c.1325-1397)



A varíola cegou Landini na infância, mas não foi obstáculo para que ele desenvolvesse o virtuosismo em vários instrumentos, principalmente o órgão. Também foi poeta, compositor e astrônomo.



Em sua lápide mortuária (ao lado), em Florença, ele aparece tocando o portativ, um órgão portátil que era preso por uma alça ao corpo, e tocado com a mão direita, enquanto a mão esquerda acionava o fole atrás do instrumento. Seus contemporâneos narram que os pássaros se colocavam ao seu redor enquanto tocava.



Os compositores da idade média são os primeiros responsáveis pela fixação do vernáculo na arte. Junto a eles, poetas como Petrarca, Dante, Chaucer e Cervantes definiram todas as línguas modernas na Europa.









Quam pulcra es

John Dunstable séculos XIV / XV


O texto é tirado do 'Cântico dos Cânticos', atribuído à Salomão, e nele vemos o diálogo do amado e sua amada, chamada Sulamita.



Este compositor inglês uniu a expressividade musical à sua elaboração matemática. Atualmente conhecemos apenas um manuscrito autógrafo de John Dunstable, e nele encontramos desenhos inusitados representando constelações (figura ao lado), pois Dunstable também era astrônomo. Seu epitáfio o descreve como 'Príncipe da Música'.



A união da matemática e música vem da Grécia antiga, com Pitágoras, e desde então habitam juntas o pensamento abstrato humano. Boécio, um teórico do século VI, apresentou as relações harmônicas dos gregos antigos, e descreveu os tipos de música em sua obra De institutione musica:

música mundada - define as relações matemáticas que mantêm o cosmos

música humana - justifica a união do corpo (organum)

música instrumental - é a música audível, incluindo a vocal





Virgen Santa Maria / Cantigas de Santa Maria (no 47)

Pero cantigas de loor / Cantigas de Santa Maria (no 400)

Afonso X, el sabio



Para encerrar o concerto, apresentamos duas Cantigas de Santa Maria, uma coletânea musical realizada pelo rei espanhol Afonso X, el sabio. Afonso, poeta e músico, fundou a cadeira de música na Universidade de Salamanca em 1254, e foi um grande devoto da Virgem Maria, de quem estas cantigas narram milagres fantásticos e vários louvores.




Na primeira cantiga, a Virgem ajuda um monge que, tentado pelo demônio, se embriaga na adega. E diz ao demônio que aparece em forma de touro, homem e leão para atacar o monge:

“Vai ta via, muit’ es de mal solaz

Fuge, mao, mui peor que rapaz

Tolt, astroso, e logo te desfaz”

O idioma é o galaico-português, precursor do português, do castelhano, do galego e do mirandês. O manuscrito das Cantigas de Santa Maria se encontra no Monastério Real de Escorial, e dele vemos o início da cantiga 47: Virgen Santa Maria (acima) e a iluminura que decora a cantiga 400: Pero cantigas de loor (abaixo), mostrando um músico tocando um carrilhão.













Esta é uma trilha sonora da Idade Média que o Audi Coelum apresenta, desde o cantochão até a polifonia, do sacro ao profano. São obras de reis, santos, e também de tantos homens e mulheres anônimos. Estas experiências artísticas e científicas são elementos que impulsionaram o Renascimento, ajudando a definir o conceito da arte e do pensamento ocidental.















O Audi Coelum seguiu os princípios da pronúncia original (de época) para as obras deste repertório.





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