sábado, 5 de junho de 2010

385 - OS ROMANOS

Home | Novidades | Revistas | Nossos Livros | Links Amigos

Exempla Romanos:
Homens de Gloria e Mulheres de Honor



Alessandra Carbonero Lima
Mestranda FEUSP



Introdução

Aproximarmos-nos de uma sociedade diversa da nossa, especialmente se estiver ela cronologicamente distante de nós, é tarefa que exige extrema cautela. Entrar em um novo mundo, de valores e costumes próprios, onde os homens encontram-se organizados socialmente de modo diferente daquele no qual estamos inseridos, impõe que nos distanciemos de nós mesmos, que nos esvaziemos de nossos próprios ideais, valores, hábitos, conceitos e pré-idéias, enfim, impõem que deixemos de lado a nossa própria maneira de conceber, apreender e compreender o mundo, os homens, a vida em sociedade e a história.

Sem essa tentativa de nos distanciarmos de nós mesmos, que nunca poderá ser completa [1] , não conseguiremos compreender minimamente o outro, o alheio, ainda que este mesmo alheio, de alguma maneira, seja responsável em alguma medida pelo que nos tornamos hoje.

É nesse sentido a advertência de Paul Veyne, na sua introdução às considerações que teceu sobre a sociedade romana no primeiro volume da História da Vida Privada.

Assim, se de um lado, sabidamente, devemos aos romanos alguns dos valores e práticas que nos dias de hoje ainda cultivamos, de outra sorte aproximarmos-nos de qual tenha sido seu modo de vida é o mesmo que nos aproximarmos da organização social de um povo que nos é totalmente estranho, totalmente alheio.

Mesmo as semelhanças, por vezes, são apenas aparências, capazes de ocultarem diferenças significativas, cuja percepção pode ser determinante para a adequada compreensão do povo romano.

No entanto, ainda que estranhos, porque são os romanos um alheio através do qual podemos também nos compreender, a curiosidade e interesse por quem tenham sido e como viveram se intensifica. Aqui, escolhemos nos aproximar da sociedade romana por meio de algumas de suas "histórias exemplares" (exempla): pela sua leitura tentaremos perceber alguns dos valores que informavam esse povo. O objetivo, contudo, não é precisar no tempo e espaço a prática de certos valores na sociedade romana, mas sim buscar ilustrações de quais tenham sido os valores pelos quais deveria se pautar o homem romano.

E embora os valores cultivados pela sociedade romana tenham sofrido transformações durante sua longa existência - ou porque certos valores e ideais de comportamento perderam o significado original e ganharam novos conteúdos orientados por mudanças políticas e sociais, ou porque determinados valores e práticas apenas caíram em desuso, em favor ou não de novas práticas e valores, também face às modificações políticas e sociais -, historiadores e latinistas concordam com a idéia de que haveria valores que permaneceram presentes num certo ideal de homem romano.

Na busca dos valores que informavam o modelo romano de homem ideal, os exempla fornecem, naturalmente, um bom material de investigação. Não é o caso aqui, todavia, de uma análise exaustiva; o que se pretende é a tentativa de uma breve ilustração, apresentando uma leitura de um par de exempla, em busca dos principais valores cultivados por esta sociedade.

Sobre como expressar adequadamente o amor à pátria

Os mitos e exempla referentes aos grandes feitos de cidadãos romanos, registrados por historiadores, estadistas, filósofos e poetas romanos e contados, geração após geração, durante todo o período de existência de Roma, de sua fundação a sua decadência, ora com maior, ora com menor influência sobre os homens, possuíam uma função didática, justamente a de transmitir aos cidadãos romanos os valores pelos quais eles deveriam pautar suas ações para com a família, os deuses e, sobretudo, para com o Estado, gravar em seus corações a imagem, as representações de comportamentos e valores que se queria ver repetidos, imitados e emulados.

Deste modo, a formação do jovem romano envolvia uma infância e juventude rodeada pelas histórias dos grandes feitos dos seus antepassados, para que com seus iguais eles pudessem aprender quais eram as ações nobres e as desonrosas, quais aquelas que eles deveriam repetir e emular e quais aquelas a serem evitadas.

Porém, além do peso dos seus próprios antepassados, o jovem romano convivia também com as histórias dos grandiosos feitos de exemplos adequados de cidadãos romanos, exemplos de homens cujas ações ilustravam os mais nobres e altos valores romanos, cujas ações ilustravam a excelência de um povo, ou a excelência de um ideal de povo que se queria para Roma.

Para tentar apreender as características de qual tenha sido o ideal romano a ser seguido, escolhemos a apreciação de um conhecido e difundido mito romano: trata-se do exemplo de excelência de Régulo, na versão apresentada por Cícero, no Dos Deveres [2] .

Régulo, segundo nos conta Cícero, foi um cônsul romano, que feito prisioneiro na África, em batalha com Xantipo da Lacedemônia - que lutava ao lado dos cartagineses durante a Primeira Guerra Púnica -, foi mandado ao Senado romano para negociar a sua libertação em troca da liberdade de alguns nobres líderes cartagineses, cativos de Roma. Sob juramento de que voltaria para o cativeiro caso a troca não fosse aceita pelo Senado romano, Régulo dirigiu-se a Roma. No entanto, diante do Senado sugeriu que a permuta não fosse feita, alegando que não haveria vantagem alguma para Roma na troca de um dos seus líderes já velho e debilitado, por vários habilidosos e jovens líderes do inimigo.

Aceita a sua argumentação pelo Senado romano, Régulo deixou sua liberdade e família e voltou ao cativeiro, entregando-se ao inimigo por conta da manutenção do seu juramento e, sobretudo, por devoção à pátria, para ela reservando o mais adequado, ainda que em detrimento de si mesmo.

Pois bem, a história da qual nos fala Cícero é simples e por ele nos foi contada em poucas sentenças, contudo, essas mesmas sentenças estão repletas de conceitos e valores enaltecidos pelos romanos e, portanto, cada uma destas sentenças deve ser lida e apreciada com cuidado, para que possamos identificar a densidade valorativa desse relato.

Para dar credibilidade e força ao que seria dito, Cícero começou sua história, dizendo-nos que não contava uma fábula, mas sim um fato real e nacional:

“Mas deixemos ficar histórias que são fabulosas e estranhas; passemos a um facto real e nacional (...)”. [3]

Ou seja, o que Cícero afirmava é que a história que iria narrar tratava-se do feito de um homem real, de um ser humano como o próprio Cícero e como seus leitores. Mais ainda, tratava-se do feito de um romano, do feito de um igual, de um par.

Logo, tratava-se de um feito que poderia ser emulado, tratava-se de um feito cuja realização estava ao alcance de qualquer romano, desde que cultivasse em seu espírito os valores espelhados pelas ações e feitos do homem romano da história que se contava.

Cícero iniciou então contando quem era o nobre romano que protagonizava a sua história: não era ele um romano qualquer, mas um cônsul, que o era já pela segunda vez e, portanto, tratava-se de um homem experiente, uma vez que um romano não ocuparia um consulado sem antes ter passado por outras magistraturas.

Nosso herói era ainda um militar, já que a história começou quando em batalha foi Régulo feito prisioneiro por Xantipo da Lacedemônia. Logo, além de líder político, nosso herói era também um guerreiro.

Não só, Régulo não foi feito prisioneiro em quaisquer circunstâncias, mas em uma cilada, ou seja, não seria qualquer situação que justificaria sua prisão, porém somente uma situação limite, de difícil ou impossível vitória: uma cilada.

Esses dados compõem então o perfil de um homem já reconhecido pelos seus pares como honrado e virtuoso. Vejamos a apresentação do herói:

“Marco Atílio Régulo, quando, sendo cônsul pela segunda vez, foi aprisionado em África, numa cilada, chefiada por Xantipo da Lacedemônia, sendo general Amílcar, pai de Aníbal...” [4]

Neste momento, finda a apresentação do herói. Régulo será enviado ao Senado romano, sob juramento de retorno em caso de fracasso das negociações para troca de cativos.

“... foi mandado [Régulo] ao Senado sob juramento de que, se não fossem devolvidos aos Cartagineses uns certos cativos nobres, tornaria ele mesmo a Cartago.” [5]

Por que, no entanto, os inimigos poderiam confiar que Régulo cumpriria o juramento feito? Porque Régulo era um homem movido pela fides.

Os romanos eram conhecidos por serem um povo de fides, cujo significado era específico em sua sociedade. Fides [6] remete ao campo político, social e jurídico e, grosso modo, referia-se ao juramento que obrigava ao cumprimento de um dever em função do próprio juramento. Ou, se se quiser, pode-se dizer que a fides se referia a um pacto firme que obrigava ao cumprimento de um dever para com o outro, com a família, com os deuses ou com a pátria.

Havia ainda uma divindade Fides cultuada pelos romanos, o que nos faz considerar que os juramentos movidos pela fides romana não o eram apenas por um conceito de ordem ou por um valor, mas sim por um valor que espelhava uma divindade: os juramentos eram como que sancionados pela divindade.

Todavia, agir no horizonte da fides não era uma questão para o arbítrio humano, a ação conforme a fides era própria do romano excelente, virtuoso, fosse no trato com a família, com os deuses, com a pátria ou mesmo com o inimigo.

O juramento sob o qual Régulo deixou o cativeiro era regido pela fides, aliás somente por Régulo orientar-se pela fides, certo estava o inimigo de que o pacto seria cumprido. Então, sob juramento, Régulo chegou a Roma e, finalmente encontrou-se junto dos seus, junto da sua mulher e filhos, junto dos que o amavam, junto da proteção e do conforto de sua pátria, das honras advindas do cargo público que ocupava, longe da guerra e de suas mazelas, longe do inimigo, longe do cativeiro, da dor, da morte, dos suplícios, das privações, das humilhações. Nas palavras de Cícero:

“Chegado a Roma, ele bem via os atractivos do que lhe era útil, mas julgou-os falsos, conforme os factos o demonstram. Eram os seguintes: permanecer na pátria, ficar em casa com a mulher e com os filhos, considerando a calamidade que na guerra lhe sobreviera um sucesso comum da sorte na guerra, ter a dignidade consular. Quem negará que isto é que era útil? Quem julgas que o faria? Opõem-se-lhe a grandeza de alma e fortaleza.” [7]

Além do convívio com os seus, em Roma Régulo poderia ainda desfrutar do respeito e das honras advindas da sua dignitas, ou seja, do prestígio por ter exercido de maneira honesta sua autoridade enquanto cônsul.

A dignitas também foi um valor cultivado pelos romanos, próprio da esfera política, referia-se ao exercício probo da autoridade advinda de um alto cargo público. A atividade pública movida pela dignitas era peculiar ao homem excelente [8] .

Régulo era um homem de dignitas, ou, um homem de prestígio político: para ele, estar em Roma não era apenas estar entre os seus concidadãos e familiares; era também estar entre aqueles que o respeitavam e honravam publicamente. Entretanto, ainda que diante do que lhe parecia útil, Régulo julgou falsa essa utilidade e assim o fez, segundo Cícero, porque ele possuía grandeza de alma e fortaleza.

Permanecer em Roma entre os seus concidadãos e familiares, desfrutando do prestígio por sua dignitas não era o útil para Régulo, porque era ele forte e de alma grande, porque era ele um virtuoso [9] , sendo-lhe próprio então o “nada temer, desprezar tudo o que é humano, não julgar insuportável tudo o que possa acontecer ao homem” [10] , percebeu que outra lhe era a verdadeira atitude útil.

Foi quando então nosso herói se dirigiu ao Senado romano, apresentou a proposta do inimigo, recusou-se a votar, porque considerava que enquanto comprometido pelo juramento ao inimigo não era de fato um senador romano e argumentou contra a utilidade de entregar os prisioneiros cartagineses.

“Veio ao Senado, expôs a proposta de que estava incumbido, recusou-se a dar o seu voto, pois, enquanto estivesse ligado pelo juramento ao inimigo, não era senador. Mais ainda (ó que insensato, dirá alguém, que luta contra o que lhe é útil!) negou a utilidade de entregar os cativos. Que eram jovens e bons chefes, ao passo que ele já estava alquebrado pela velhice. Como prevalecesse a sua autoridade, os prisioneiros ficaram detidos; ele mesmo voltou a Cartago, sem que o retivesse o amor da pátria ou dos seus.” [11]

Mais uma vez, Régulo elevou a sua dignitas ao recusar participar da votação no Senado, demonstrando o cuidado e honestidade com que exerce a sua magistratura. Renovou-a ainda outra vez ao, na seqüência, demonstrar que a proposta do inimigo não era útil para a pátria, mesmo que a recusa do Senado romano em ceder à chantagem inimiga implicasse em um seu sacrifício pessoal.

Não só, ao agir assim, Régulo expressou sua fidelidade para com a pátria, pois, embora o pacto que tivesse firmado com o inimigo fosse regido pela fides, Régulo firmara antes um pacto mais relevante, também ele regido pela fides, o de zelar pelo bem de sua pátria.

Logo, ainda que Régulo amasse sua pátria, a ela também era ele fiel e, porque era ele um bom cidadão, sabedor de seus deveres para com a pátria, sabia que seu amor deveria ser sacrificado pelo seu zelo, ou, sabia que o modo adequado de expressar seu amor à pátria exigia devoção, exigia sacrifícios individuais.

A principal idéia a ser emulada na história de Régulo seria a do cidadão que se devotou à pátria, que se sacrificou pela pátria. Contudo, um homem que se devotou à pátria como Régulo, apenas o faria se portador de uma série de virtudes, em conseqüência a riqueza de valores, refletidos nas ações do nosso herói, contidos na história narrada por Cícero.

Régulo era ainda pio, movia-se também pela pietas, o vínculo afetivo entre os familiares, que se alargava também aos deuses e, sobretudo, à pátria, o qual implicava na obrigação de cumprimento dos deveres para com a família, os deuses e a pátria.

Fides e pietas para com a pátria eram os valores que moviam o exemplo de Régulo, ou, eram os valores que explicavam e obrigavam a devoção para com a pátria.

A história contada por Cícero apontará ainda para um outro conceito importante na sociedade romana, a saber, auctoritas.

Auctoritas é mais um conceito forjado no mundo romano [12] e possuía o sentido de acréscimo, aumento, nas palavras de M.H.R. Pereira, a auctoritas é “algo que vem adicionar-se a uma situação já existente, e lhe confere maior peso” [13] .

Essa "situação já existente" poderia ser uma pessoa, ou, a excelência de uma pessoa. No campo político, jurídico e moral, a decisão daquele que era portador de auctoritas vinculava, por conta da própria auctoritas. Ou seja, a decisão proveniente de quem detinha auctoritas não precisava persuadir ou convencer, não precisava nem mesmo justificar-se ou fundamentar-se, a auctoritas era sua própria justificativa.

Régulo era portador de tal auctoritas, por isso Cícero pôde nos dizer que a autoridade do nosso herói prevaleceu quando esteve ele junto ao Senado. Melhor explicando: embora Régulo tivesse apresentado um argumento ao Senado, para justificar o motivo pelo qual ele desaconselhava a troca proposta pelo inimigo, não se tratava de um simples argumento sendo apresentado ao Senado, mas sim da opinião daquele que era portador de auctoritas, em decorrência, a auctoritas de Régulo prevaleceu e a troca não foi realizada.

Régulo então se entregou ao inimigo:

“Não ignorava então que partia para junto de um inimigo crudelíssimo e para suplícios refinados, mas entendia que era seu dever manter-se fiel ao juramento. E assim, direi eu, enquanto o matavam pela privação do sono, a sua condição era melhor do que se permanecesse em casa, sendo um ancião activo e um consular perjuro.” [14]

Se Régulo tivesse permanecido em Roma seria um ancião activo e um consular perjuro, justamente o que não lhe era útil. Deixar-se ficar junto dos seus concidadão e familiares e desfrutar dos prestígios da sua dignitas eram falsos atrativos, eram falsas utilidades, pois se Régulo tivesse sucumbido aos mesmos se transformaria em um velho que conservara a sua vida, mas para tanto teria deixado de cumprir seu dever para com a pátria e as obrigações advindas de seu cargo público, ao invés de dignitas, o consulado teria então lhe rendido perjúrio.

Era-lhe útil, por outro lado, entregar-se ao inimigo e aos suplícios que lhe fossem reservados, nada temendo para que os interesses de Roma, de sua pátria fossem preservados.

Não só, era útil a Régulo entregar-se ao inimigo porque assim além de cumprir seus deveres para com Roma, além de demonstrar ser um homem de fides e pietas, enalteceria a si mesmo, tornando pública a sua honra e a sua virtuosidade, podendo ser reconhecidos pelos homens de bem como virtuoso, alcançando a gloria.

Também a gloria era um valor cultivado pela sociedade romana, porém reservado a poucos. Somente era digno de gloria aquele que tivesse suas virtudes reconhecidas por homens igualmente virtuosos, o que se conseguia com a publicação de suas virtudes, ou seja, com a realização de grandes feitos que espelhassem virtudes como a fides, a pietas, a dignitas, a auctoritas - justamente as cultivadas por Régulo -, dentre várias outras das quais ainda não fizemos menção.

Era útil a Régulo ser lembrado como um homem de gloria por seus pares e não como um perjuro, portanto a única atitude útil que lhe restava era sacrificar-se ao inimigo. Régulo foi então exemplo daquele que expressa corretamente seu amor à pátria, exemplo de ideal de cidadão romano.

Sobre a honra: um dever e um bem

Do ideal de cidadão romano esperava-se então uma absoluta devoção à pátria, se necessário, em detrimento dos interesses imediatos do indivíduo [15] , no entanto, podemos nos perguntar o que se esperava da mulher romana.

Ainda que legítimo em si mesmo questionar-se pelos valores que envolviam a formação da mulher romana, o interesse pela questão ganha maior intensidade ao sabermos que, entre os romanos, a responsabilidade pela formação da criança, nos primeiros anos de vida, era não de um escravo, mas sim da mãe.

Mesmo após a helenização de Roma e as modificações na educação decorrentes deste fenômeno, muitas vezes afastando a mãe romana dos primeiros cuidados com seus filhos, sua figura e presença continuaram significativas e de grande influência na formação dos pequenos romanos.

Em conseqüência, a mulher romana, que é também portadora da cidadania romana, ainda que em um status jurídico inferior ao dos homens, é formadora de cidadãos romanos.

Logo, embora as funções militares e políticas não fossem reservadas às mulheres romanas, acabaram por desempenhar um relevante papel na sociedade romana, porque eram elas as responsáveis pela administração das tarefas domésticas da casa e pelos primeiros cuidados reservados as crianças.

Assim, para ilustrar o ideal de mulher romana, analisaremos um dos mitos romanos fundadores, qual seja, o mito de Lucrécia, cuja versão utilizada será a encontramos em Tito Lívio, no final do Livro I, da sua História de Roma.

Tito Lívio contou-nos as travessuras de jovens príncipes e de alguns líderes militares, ainda na época em que Roma era governada por reis etruscos, que presos em um acampamento de guerra, esperando a oportunidade da batalha, dedicavam-se ao ócio e ao vinho.

Certa noite, então já embriagados e após uma conversa onde cada um enalteceu as qualidades de suas respectivas esposas, os jovens guerreiros, movidos pelo vinho resolveram visitar as esposas em questão, para que pessoalmente pudessem constatar as virtudes das companheiras.

Em Roma, as esposas dos príncipes foram encontradas em banquetes repletos de bebida, comida e falatórios com outras suas companheiras.

Entretanto, na Colácia, a esposa de Tarquínio Colatino - um dos líderes militares – foi surpreendida, não em longos banquetes, porém sim junto às criadas, trabalhando lãs, ganhando assim a competição como a mais virtuosa das esposas.

Encantado com a beleza e castidade da esposa de Colatino, Lucrécia, um dos jovens príncipes, Sexto Tarquínio, retornara dias depois a Colácia com apenas um companheiro, os quais lá foram bem recebidos por Lucrécia, que lhes ofereceu uma ceia e acomodações para hóspedes.

Contudo, quando todos dormiam, Sexto Tarquínio, armado de sua espada, dirigiu-se ao quarto de Lucrécia, surpreendendo-a, confessando seu desejo e implorando seus favores. Acompanhemos as palavras de Tito Lívio:

“Ardente de paixão, assim que lhe pareceu que tudo estava seguro em volta e que todos se encontravam a dormir, de espada desembainhada, foi ter com Lucrécia adormecida, carrega-lhe no peito com a mão esquerda e diz: “Silêncio, Lucrécia! Sou Sexto Tarquínio. Tenho a arma na mão. Se disseres uma palavra, morrerás!” A mulher desperta do sono apavorada, e vê que não tem quem lhe acuda, e que a morte está iminente. Então Tarquínio confessa-lhe o seu amor, implora, mistura preces com ameaças, ataca esse coração feminil de todos os lados.” [16]

Tarquínio, todavia, não foi ao encontro de qualquer mulher romana. Tito Lívio também nos apresentou sua heroína e já nos indicara antes as suas qualidades.

Lucrécia era uma mulher bela, porém, muito mais, era ela também casta, fiel ao marido, sabedora de seus deveres para com o lar. A propósito, foram justamente estas as qualidades que despertaram a paixão por Lucrécia em Tarquínio:

“Foi então que se apoderou de Sexto Tarquínio um desejo funesto de fazer violência a Lucrécia; incitam-no o espetáculo da sua beleza, tanto como o da sua castidade.” [17]

Lucrécia era ainda afeita ao labor, ao trabalho árduo. Entre os romanos, especialmente entre os romanos arcaicos, tais como as personagens apresentadas por Tito Lívio, o labor era um valor fundamental. O trabalho árduo e o esforço contínuo eram um móvel para as atividades dos romanos de então [18] .

Nossa heroína espelhava o labor em suas atividades no lar, sendo encontrada pelo esposo e companheiros justamente fiando com as criadas e o fazia não em qualquer horário, mas já tarde, ou seja, quando poderia estar repousando ou dedicando-se a afazeres mais agradáveis, encontrava-se ainda laborando.

“... encontraram Lucrécia, não como as noras do rei, que haviam visto a matar o tempo em luxuoso banquete com as companheiras da sua idade, mas sentada no meio da casa, já tarde, entregue ao seu trabalho de lã, entre as criadas, que faziam serão.” [19]

Ainda, era Lucrécia uma boa anfitriã, afinal recebera atenciosamente o príncipe e seu companheiro, porém, sobretudo Lucrécia era tão virtuosa na presença do marido, quanto na ausência.

Em sendo assim, nossa heroína se recusou a se entregar a Tarquínio, contudo estando ele dominado pelas paixões e diante da rejeição de Lucrécia, que não cedeu aos seus desígnios, nem mesmo diante da ameaça de morte, Tarquínio resolverá por ameaçá-la com um mal maior: com a desonra. Vejamos:

“Como via que ela mantinha a sua recusa e nem ao medo da morte se dobrava, ao temor acrescentou a desonra, dizendo que colocaria ao lado do seu cadáver um escravo nu estrangulado, para que se dissesse que morrera em sórdido adultério.” [20]

Somente diante da possível desonra será que Lucrécia sucumbe aos desejos de Tarquínio. Ou seja, também das mulheres era exigido honra, honor.

A honor, na sociedade romana, referia-se ao reconhecimento público das virtudes, do mérito de um indivíduo, da honestidade de um indivíduo, tratava-se então da publicidade da virtuosidade de um indivíduo. Logo, não bastava para um romano a conduta proba, desejava ele também que a sua probidade fosse reconhecida publicamente.

Vale ressaltar, honor e gloria embora se aproximassem, não se confundiam, um homem de glória necessariamente era um homem de honor, no entanto, um homem honrado nem sempre era glorioso.

Honor e gloria estavam vinculadas ao reconhecimento público das virtudes de um homem, todavia a honor era própria do homem honesto, enquanto a gloria era própria do homem grandioso, logo, esta era qualitativamente superior àquela [21] .

A nossa heroína possuía honor, era publicamente reconhecida como uma mulher de virtudes, não só, entre as esposas dos jovens líderes com quem convivia seu marido era reconhecida como a mais virtuosa de todas elas.

Assim, não apenas a virtuosidade, a castidade, a fides e a pietas de Lucrécia para com seu marido estavam sendo ameaçadas pelo agressor, mas também o reconhecimento público de que era ela possuidora de tais qualidades, ou seja, a honor de Lucrécia era ameaçada por Tarquínio.

E porque não poderia conceber uma morte na desonra, será que Lucrécia cederá a Tarquínio.

“Com este pavor [com a ameaça de desonra], a sua concupiscência venceu [a concupiscência de Tarquínio], como que , o baluarte do pudor.” [22]

No entanto, mais uma vez para preservar a sua honor, nossa heroína castigará a si própria pelo infortúnio do qual não foi culpada. Determinada a salvaguardar o reconhecimento público de suas virtudes, Lucrécia chamará a sua presença o pai e o marido.

“Á chegada dos seus, irrompem-lhe as lágrimas e, à pergunta do marido “Está bem?” replica: “Não. Como é que uma mulher há-de estar bem, se perdeu o pudor? No teu leito, Colatino, há vestígios de um homem alheio. De resto, só o corpo foi violado, a alma está inocente; disso dará testemunho a morte. Mas dêem-me as vossas mãos e a vossa fé, em como o adúltero não ficará impune. Foi Sexto Tarquínio, hóspede hostil, que na noite passada veio armado desembainhar o maléfico gládio contra mim – contra si mesmo também, se fordes homens”. [23]

Lucrécia narrou-lhes a violência sofrida e, antes de quaisquer atitudes, fez com que os seus jurassem pela fides que seu agressor seria punido. Lucrécia queria a certeza da punição que não poderia presenciar, por isso a importância de fazer com que o seus jurassem pela fides, de impor-lhe um juramento que sabia teria de ser comprido, pela própria força da fides.

Certa então da futura punição de seu agressor, pôde Lucrécia impor-lhe o castigo que asseguraria a preservação de sua honor.

““Vós vereis o que se lhe deve fazer; eu, por mim, conquanto me absolva de pecado, não me isento de castigo. De futuro, nenhuma mulher viverá desonrada à sombra do exemplo de Lucrécia”. Pega num cutelo que trazia oculto na veste e enterra-o no coração; sucumbindo ao ferimento, cai expirante. O marido e o pai soltam um grito.” [24]

Ainda que Lucrécia tenha resistido ao agressor e somente tenha se entregado para preservar sua honor, ou, ainda que não fosse ela uma transgressora, seu consentimento, mesmo que justificável, precisava ser punido.

O dilema de Lucrécia era semelhante ao de Régulo, enquanto este teve de escolher entre a vida no perjúrio e a morte na gloria, Lucrécia foi obrigada a escolher entre a vida fora da castidade e a morte na honra. Após perder o pudor com a violação de Tarquínio, apenas um caminho poderia restituir a honestidade e a castidade perdidas a Lucrécia, a saber, um castigo equivalente às virtudes perdidas: a morte. Lucrécia então desferirá um golpe suicida, enterrando um cutelo em seu coração, mas não sem antes de se afirmar claramente como exemplo de castidade e honor.

Portanto, Lucrécia não apenas cumpriu o seu papel de esposa devotada ao lar e ao marido, mas cumpriu também o seu papel de mãe, seu papel de formadora de cidadãos e cidadãs romanos, ensinando com o seu exemplo às meninas e jovens romanas como deverá se conduzir uma mulher romana.

A preservação da honor da mulher justificava um sacrifício pessoal, a honor era então um dever do ideal de mulher romana, ou seja, era dever da mulher romana agir honestamente, cuidar adequadamente dos afazeres domésticos e manter-se fiel e casta para o marido. Contudo a honor era também um bem, que uma vez conquistado deveria ser preservado, mesmo que assim o fossem às custas de grandes sacrifícios individuais, como a perda da vida de nossa heroína.

Lucrécia espelhava, assim, alguns dos principais valores a serem cultivados pelo ideal de mulher romana [25] .

Considerações Finais

Homens de glória e mulheres de honra ou, homens de feitos grandiosos e mulheres castas e honestas ou, homens devotados à pátria e mulheres devotadas às virtudes, estes eram os modelos que os romanos queriam ver seguidos.

Régulo e Lucrécia expressam, portanto, o essencial do romano ideal. Régulo porque alcança a glória ao morrer pela pátria, Lucrécia porque preserva sua própria honra com o suicídio.

Assim, ainda que uma investigação mais consistente sobre quais seriam os valores que informavam o povo romano (e construíram os modelos desse povo) exigisse uma análise não só de toda a mitologia romana, mas também das obras dos autores latinos, os exempla de Régulo e Lucrécia parecem ilustrar adequadamente alguns dos valores que compunham o ideal romano de prática cidadã.

Referências Bibliográficas
ABBAGNANO, Nicola. Historia da Filosofia. Trad. Antonio Ramos Rosa, Conceição Jardim e Eduardo Lúcio Nogueira. 3.ed. Lisboa: Editorial Presença, 1985.

ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 10.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

AYMARD, André e AUBOYER, Jeannine. Roma e seu Império. In: História Geral das Civilizações. dir. Maurice Crouzet. Trad. Pedro Moacyr Campos. 4.ed. São Paulo-Rio de Janeiro: Difel, 1976. tomo II.

BLOCH, Raymond e COUSIN, Jean. Roma e seu destino. In: Rumos do Mundo. Lisboa: Cosmos, 1964. v. 4.

BORNECQUE, Henri e MORNET, Daniel. Roma e os romanos: literatura, história, antiguidades. Trad. Alceu Dias Lima. São Paulo: EPU, 1976.

BRÉHIER, Émile. Historia de la filosofía. Trad. Demetrio Náñez. 5.ed. Buenos Aires: Editorial Sudamericana. tomo primeiro.

CARDOSO, Ciro Flamarion S. A cidade-estado antiga. 2.ed. São Paulo: Ática, 1987.

CARDOSO, Zélia de Almeida. A literatura latina. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1989.

CÍCERO, M. T. Oeuvres Completes. Trad. Jos Vect Le Clerc. Paris: Lefevre, 1825.

_________. Dos deveres. Trad. Angélica Chiapeta. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

CORASSIN, Maria Luiza. Sociedade e Política na Roma Antiga. São Paulo: Atual, 2001. (Discutindo a História).

FRASCHETTI, Augusto. O mundo romano. In: História dos Jovens: da antiguidade à era moderna. Org. Giovanni Levi e Jean-Claude Schmitt. Trad. Claudio Marcondes, Nilson Moulin e Paulo Neves. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

FUNARI, Pedro Paulo A. A vida cotidiana na Roma antiga. São Paulo: Annablume, 2003.

_________. Cultura Popular na antiguidade clássica. 2.ed. São Paulo: Contexto, 1996. Coleção Repensando a História.

_________. A cidadania entre os romanos. In: História da Cidadania. Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky (org.). São Paulo: Contexto, 2003.

FUSTEL de COULANGES, Numa Denis. A cidade antiga: estudos sobre o culto, o direito e as instituições da Grécia e de Roma. Trad. Jonas C. Leite e Eduardo Fonseca. São Paulo: Hemus, 1975.

GALINO, M. Ángeles. Historia de la Educación: Edades Antigua y Media. 2.ed. Madrid: Gredos, 1973.

GIARDINA, Andrea. (dir.) O homem romano. Trad. Maria Jorge Vilar de Figueiredo. 1. ed. Lisbora: Editorial Presença, 1992.

GUARINELLO, Norberto Luiz. Cidades-estado na antiguidade clássica. In: História da Cidadania. Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky (org.). São Paulo: Contexto, 2003.

MAESTRI FILHO, Mário José. O escravismo antigo. 3.ed. São Paulo: Atual, 1986.

MARKY, Thomas. Curso elementar de direito romano. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

MARROU, Henri-Irénée. História da Educação na Antiguidade. Trad. Mário Leônidas Casanova. 4. reimp. São Paulo: EPU, 1975.

MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo. 2.ed. São Paulo: Mestre Jou, 1967. v. 1 e 2.

PEREIRA, Maria Helena da Rocha. Estudos de História da Cultura Clássica. 3.ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2002. v. 1 e 2.

_________. Res Romanae – Antologia da Cultura Romana. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1976.

PLEBE, Armando. Breve História da Retórica Antiga. Trad. Gilda Naécia Maciel de Barros. São Paulo: E.P.U., 1978.

ROSA, Maria da Glória. A história da educação através dos textos. 2.ed. São Paulo: Cultrix.

TITO LIVIO. Historia de Roma. Trad. Paulo Matos Peixoto. São Paulo: Paumape, 1989.

VEYNE, Paul. O inventário das diferenças. Trad. José Vasco Marques. 1.ed. Lisboa: Gradiva, 1989.

_________. A sociedade romana. Trad. Maria Gabriela de Bragança e Clara Pimentel. Lisboa: Edições 70, 1990.

_________. (org.) História da vida privada. Philippe Áries e George Duby (dir.). São Paulo: Companhia das Letras, 1990. v. 1.



--------------------------------------------------------------------------------

[1] A hermenêutica nos ensina que uma apreensão neutra do outro é impossível. Por exemplo, quando um texto é lido, há sempre alguém que o lê e esse alguém não pode ser desconsiderado no processo de apreensão do texto. Isto não implica dizer que o significado de um texto fica adstrito ao arbítrio absoluto de quem o apreende ou que não pode ser ele transformado em objeto de pesquisa, mas indica que há sempre uma subjetividade apreendendo o texto e uma subjetividade que possui a sua rede própria de significações, valores e ideais, logo, em alguma medida toda leitura ou todo contato com o mundo e as coisas do mundo acaba por ser já uma interpretação. Em conseqüência, as idéias de imparcialidade e neutralidade absolutas ficam comprometidas. Se é possível a apropriação objetiva de um texto, esta apropriação objetiva será sempre feita por uma subjetividade.

[2] Sobre o mesmo mito há uma Ode de Horácio, a Ode III e, contamos ainda, com a notícia de uma versão apresentada por Tito Lívio, sobre o feito de Régulo, a qual não alcançou nossos dias.

[3] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[4] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[5] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[6] Conhecemos o uso e o sentido de palavras como fides, na sociedade romana, as quais se referiam a determinados conceitos ou valores próprios daquele povo, por meio dos textos dos próprios autores romanos, sendo a obra de Cícero uma das principais fontes de consulta das quais dispõem historiadores e latinistas. Assim, se de um lado para que seja possível se identificar entre os mitos romanos certos termos da língua latina em um determinado uso, referindo-se a um determinado conteúdo necessário é recorrer a estudos que apontam para a recorrência de mesmo termo, com o mesmo conteúdo em outros textos latinos [cf. Pereira, M.H.R., Estudos de história da cultura clássica – cultura romana], ao mesmo tempo a identificação destes termos e seu correspondente uso nos mitos romanos faz não só corroborar ou não o significado deles na cultura romana, como revela o caráter de um povo, justamente porque revela o que era por eles enaltecido e cultivado, como o que era por eles rejeitado e excluído.

[7] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[8] Como se mencionou, estamos buscando valores que compunham um ideal de homem romano. Porque compunham um modelo, ainda que estivessem eles presentes nos homens reais que integravam a sociedade romana, certamente estariam em graus variados, o que não se objetiva no presente trabalho questionar. Logo, não se quer fazer crer que a prática política romana fosse toda ela orientada pela dignitas. É também Paul Veyne, na História da Vida Privada e na Sociedade Romana quem nos mostra que a corrupção na vida política era uma prática corriqueira e problemática em Roma.

[9] A virtus era mais um conceito-valor informador do ideal romano, no entanto tratava-se a virtus de uma idéia bastante complexa. Historiadores e latinistas costumam discordar quanto ao conteúdo de virtus, porém sem nos atrelarmos a quaisquer tradições de interpretação, parece correto afirmar que o homem de virtus era aquele que trazia consigo inúmeras qualidades, que se mostrava possuidor de várias virtudes. Régulo, por exemplo, seria um homem de virtus, já que o texto de Cícero se esmera em demonstrar as várias virtudes da qual era Régulo possuidor.

[10] Cícero, M.T. Dos Deveres, III. Com este comentário, Cícero está atribuindo a Régulo uma atitude estóica. Brevemente e em linhas muito gerais e simplificadas, defendem os estóicos o cultivo de uma tranqüilidade de ânimo diante dos acontecimentos da vida, mesmo quando são eles adversos ao homem. Ao invés de padecer com as mazelas impostas pela fortuna, essa tranqüilidade de ânimo, que implica em um controle das emoções, das paixões pela razão, permitiria ao homem aceitar o infortúnio, porém imune às conseqüências dolorosas por ele proporcionadas, já que o homem estará dominando suas paixões. Régulo então, como seria próprio de um bom estóico, nada teme e despreza tudo o que pode acontecer ao homem, ou, sendo ele um homem de alma forte, capaz de dominar suas paixões não precisa temer o infortúnio, pois as dores próprias do infortúnio não o alcançam.

[11] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[12] Não há para auctoritas um conceito ou palavra exatamente equivalente em grego.

[13] Pereira. M.H.R. Estudos de história da cultura clássica – cultura romana. p. 362.

[14] Cícero, M.T. Dos Deveres, III.

[15] No mundo antigo os interesses e direitos individuais eram concebidos de modo diverso do que se dá contemporaneamente. A liberdade, por exemplo, muito grosso modo, era concebida como um exercício coletivo, político, somente no exercício da cidadania, no exercício público da cidadania é que se exercia a liberdade. Nesta perspectiva, não faria sentido formular a idéia de liberdades individuais [cf. Benjamin, W., A diferença entre a liberdade dos antigos e dos modernos]. Assim, numa situação como a de Régulo não faria sentido para um romano pensar haver uma oposição entre um interesse individual, ou seja, a vida de um indivíduo e um interesse coletivo, a manutenção do Estado, pois, aqui o interesse individual na verdade é o próprio interesse coletivo, o interesse individual de Régulo, que é coletivo, não é a preservação da sua vida, mas sim a preservação do bem do Estado.

[16] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 58.2-4.

[17] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 57.10-11.

[18] Embora presente com maior força entre os romanos do período arcaico, o labor será sempre um valor relevante para a sociedade romana. De tal modo que mesmo o ócio (otium), cujo costume se difunde entre os romanos após a helenização de Roma e que excluía o negotium, ou seja, que excluía os negócios ligados a res publica, não excluía, por outro lado, algum tipo de esforço, já que o ócio era concebido como um tempo dedicado aos estudos, à literatura, à filosofia e não à falta de afazeres.

[19] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 57.9-10.

[20] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 58.4-5.

[21] Quem nos explica a diferença é um romano, Cícero, na Defesa de Plâncio. Vide Pereira, M.H.R., Estudos de história da cultura clássica – cultura romana.

[22] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 58.4-5.

[23] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 58.7-8.

[24] Lívio, T. História de Roma. Livro I. 58.10-12.

[25] Também o ideal de comportamento feminino sofreu transformações, mais uma vez sob a influência do contato com a cultura grega. Em linhas gerais, sobretudo com a helenização de Roma, pouco a pouco a educação romana deixou de ser familiar e a responsabilidade de formação dos jovens deixou de ser atributo exclusivo das mães e pais romanos. Do mesmo modo, o contato com a cultura helênica estimulou o gosto pelas letras entre os romanos, em conseqüência passará a se exigir da mulher também um conhecimento literário, a virtude da mulher também incluirá um certo domínio das letras gregas e romanas. No entanto, sempre se exigirá do ideal de mulher romana retidão e honestidade na sua conduta, ou seja, em quaisquer períodos de Roma se esperava da mulher romana ações conforme a honra.



COPYRIGHT DEVIDO AO AUTOR DO TEXTRO.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Contador de visitas